terça-feira, 5 de novembro de 2024

O futebol como exemplo


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O futebol tem uma inequívoca valia social e sociológica, porventura ainda insuficientemente estudada na sua dimensão de projeção no indivíduo. Induz alterações comportamentais e influi nas decisões das pessoas. Como aliás sucede com todas as atividades de grande projeção, os ídolos e os seus comportamentos fixam um role model para os seus seguidores. Este é tema que merecerá, certamente, maior reflexão, mas vem a propósito de duas atitudes opostas no que se refere ao exemplo.

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No Porto-Estoril assistimos a Pepê a parar o jogo quando se apercebe da lesão do seu adversário e isto apesar de se encontrar em condições de poder marcar o 2-0 para a sua equipa. Atitude absolutamente exemplar. Como exemplar foi a atitude do seu treinador ao elogiá-la, não sem antes soltar um «sei que poderei ser criticado por dizer isto»… Mas em que Mundo poderia Vítor Bruno ser criticado por defender a atitude ética e desportivamente exemplar do seu atleta? A resposta é simples: no mundo do futebol. Não saio do FC Porto para integrar neste elogio público Samu Omorodion, que em vez de embarcar no abuso que por vezes se faz das acusações de racismo, afirmou: «Em momento algum ouvi pessoas presentes no estádio a produzir esses sons referidos», referente a uma lunática acusação de alegados sons de teor racistas que lhe teriam sido dirigidos em Guimarães. Mais uma vez: exemplar. Não por ter defendido o meu clube, mas por ter defendido a verdade e, ainda mais do que isso, por ter recusado embarcar numa onda na qual lhe seria fácil acicatar ânimos. O racismo, no futebol e na sociedade, é dos comportamentos mais abjetos e básicos de que o ser humano é capaz. Deve ser forte e inequivocamente condenado. E por isso mesmo deve ser respeitado o recurso a essas acusações para que, quando ocorra, possa ser condenado sem apelo nem agravo.

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A atuação dos árbitros, sendo lateral ao espetáculo do futebol, é-lhe ainda assim decisivo. É essa circunstância que traz maior interesse sobre uma atividade que deveria ser meramente notarial. Já aqui disse que a praxis no mundo do futebol é completamente contrária à verdade material. Todos os clubes têm prática anti-éticas e anti-desportivas como são a perda de tempo e a simulação de faltas. Atitudes que — pior — são socialmente consideradas aceitáveis e compreensíveis. É neste caldo de cultura que as arbitragens atraem intérpretes que desejam ser isso mesmo, ao invés de saberem interpretar o seu papel no jogo como de discrição e eficiência. O Vitória foi eliminado para a Taça da Liga por erros de arbitragem não compreensíveis face aos meios técnicos ao dispor. E isto não é um desabafo de adepto por causa da eliminação — tantas vezes no passado recente perdemos de forma justa com o Braga — isto é factual, dito aliás de forma bem mais vocal por vozes insuspeitas como Rui Santos ou Jorge Coroado. O que está em causa é mesmo o péssimo exemplo que se dá aos jovens e à sociedade. A incompreensibilidade das decisões. A total ausência de transparência face aos processos de decisão. A inexistência de consequências para os erros. É o domínio da total ausência de responsabilidade, e isto é natural que frustre pessoas que estão habituadas a ganhar e a perder, mas gostam de conseguir compreender as decisões. Já aqui defendi em tempos que os processos de decisão fossem acompanhados pelos espectadores, depois começou esta amplificação, devo dizer um tanto ridícula, de mera comunicação das decisões. Não era a nada disso que me referia no meu texto de 17.11.2023 — referia-me a que fosse acompanhável o debate entre árbitro e VAR no processo de decisão, não uma mera comunicação da decisão que não acrescenta absolutamente nada.

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O futebol precisa de exemplo! Não pela importância do futebol em si, que é pouca, mas por aquilo que ele projeta e induz no comportamento dos adeptos, isto é, dos cidadãos. Penso que quando o futebol começar a ser visto e as suas alterações pensadas tendo presente esta perspetiva, muito poderá começar a mudar no sentido correto."

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