sexta-feira, 6 de setembro de 2024

The Sunshine Showdown – a batalha dos invencíveis!


"A brutalidade incontida de George Foreman arrancou o título ao desgraçado Frazier.

Primeiro um freeze-frame: 22 de janeiro de 1973, National Stadium, Kingston, Jamaica, um minuto e trinta e cinco segundos do segundo round – Frazier vai ao chão e fica tão espantado como o velho Rocky Racoon, lembram-se?
«Rocky burst in, and grinning a grin
He said, ‘Danny boy, this is a showdown’
But Daniel was hot, he drew first and shot
And Rocky collapsed in the corner…».
Colapsado, é esse o termo. Smokin’ Joe, o imbatível, vinte e nove vitórias e zero derrotas como boxeur profissional de pesos pesados, vinte e cinco delas por KO. À sua frente, Big George, George Foreman, outro invencível, trinta e sete a zero, trinta e quatro por KO. Escrevo por extenso: eram homens por extenso. Joe era o campeão do mundo; George o candidato. Todos davam o favoritismo ao homem de Beaufort, Carolina do Sul. 3 contra 1 nas apostas. Ganhara os últimos dez combates pelo título. O gigante que sabia desferir uppercuts assassinos. E, apesar disso, naquele momento encontrava-se no chão e, na sua frente, uma massa de carne e músculos com um metro e noventa e três de altura erguia-se assustadora como uma vaga.
Angelo Dundee, nascido Angelo Mirena, treinador de Muhammad Ali, de Sugar Ray Leonard, de Sean Mannion, de José Nápoles, de George Scott, de Jimmy Ellis, de Willie Pastrano, estava no canto de Foreman. O seu grito ouviu-se por toda a cidade de Kingston, das Palisadoes a Saint Andrew, a cidade que fizera questão de receber o que ficou para a história como The Sunshine Showdown: «Down goes Frazier! Down goes Frazier! Down goes Frazier!». Não, não era normal Frazier olhar alguém de baixo para cima. Mas até no início do combate tivera de o fazer. Afinal não ia para além do metro e oitenta. Ah! E fora massacrado durante todo o primeiro round pela brutalidade demolidora de Foreman, cinco anos mais jovem do que ele, ansioso por trepar até ao topo da hierarquia dos pesados. O tapete tornara-se familiar para Smokin’ Joe: aterrara cinco vezes à custa dos golpes do adversário e vivera um inferno indescritível. Talvez pedisse a Deus para pôr um ponto final a tamanho massacre. Ou talvez tivesse deixado de acreditar em Deus ao ver-se tão surpreendentemente desprotegido. Por mais que erguesse os braços em frente da cara, os murros de Foreman caíam sobre ele como marteladas. Não havia bigorna que os aguentasse. Howard William Cosell, o radialista da ABC, repetia aos microfones a frase de Dundee a meias com o seu sotaque inconfundível dos Estados do sul: «Down goes Frey-sha! Down goes Frey-sha! Down goes Frey-sha!». O mundo inteiro ouvia uma frase nunca gritada até então. Arthur Mercante Sr., o árbitro, já começara a contar. Yancey Durham, o treinador de Joe arrepelava os cabelos e urgia o seu homem a reerguer-se. Mas como? A sexta queda de Frazier não tinha volta a dar.
Pouco mais de quatro anos antes, os Beatles tinham cantado o fim de Rocky:
«Now, the doctor came in, stinking of gin
And proceeded to lie on the table
He said, ‘Rocky, you met your match’».
Seis-sete-oito… Dundee ergueu os braços enquanto o impassível Foreman se afastava do destroço que restava de Frazier. O pôr-do-sol ainda estava longe. Sunshine Showdown ficava bem como cenário de espetáculo e servira para vender bilhetes, se preciso era vender bilhetes para um espetáculo que todos queriam ver. Nove… dez. O segundo round não passara de uma formalidade. Uma formalidade selvagem sob o calor opressivo das Caraíbas. O golpe de George fora tão devastador que a cabeça de Frazier foi atirada para trás juntamente com os ombros, o joelho esquerdo dobrara-se e a queda fora, mais uma vez, inevitável e atroz. Uma névoa tomou conta dos olhos da fera ferida e uma espécie de lamento misturado com um rugido soltou-se-lhe dos lábios ensanguentados. O vencedor teve o seu derradeiro ato de nobreza e recusou-se a assistir à aniquilação do seu opositor. Observou-o pelo canto do olho enquanto virava as costas e voltava para o seu canto. Smokin’ Joe só desejava poder murmurar como Rocky Raccoon:
«Doc, it’s only a scratch
And I’ll be better, I’ll be better,
Doc, as soon as I am able…».
Mas não pôde."

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