sexta-feira, 12 de julho de 2024

Inconsciência social no rescaldo do Euro 2024


"Não creio que a Seleção Nacional seja neste momento um lugar seguro para os jovens talentos

Diogo Costa, guarda-redes da Seleção, apesar da eliminação de Portugal saiu do Campeonato da Europa como um quase herói. Há pouco mais de um ano e meio, o mesmo guarda-redes era acerrimamente criticado pela sua prestação no Mundial, especialmente frente à seleção marroquina. Questionou-se o seu valor e até a sua dedicação. António Silva errou (vamos assumir que sim) durante o jogo deste Euro 2024 frente à Geórgia, tal como aconteceu com Diogo Costa no rescaldo do Mundial do Qatar, foi alvo de duras críticas, mas não construtivas. As redes sociais e até os média encheram-se de comentários e posts maliciosos, que não só questionavam o valor do atleta como o ridicularizavam. Infelizmente, a inconsciência social dos danos que podem ser causados com estes comentários não se ficaram por aqui durante este Europeu. Repetiu-se após o jogo contra a França, mas com uma mudança de alvo. Foi a vez de João Félix ser responsabilizado após ter falhado um penálti. Mais uma vez uma enxurrada de insultos, ofensas e mensagens de ódio.
Não importa aqui qual é o atleta alvo de críticas, nem o erro ou dimensão do erro cometido e da sua consequência. Também não se pede que não se analisem os erros dos atletas, nem que os mesmos não sejam avaliados por eles. Isso é inevitável e quando feito de forma adequada pode ser um input positivo para o desenvolvimento do atleta. Mas aquilo a que se tem assistido é tudo menos positivo, este tipo de comportamento que tem sido reiterado pela sociedade em geral tem efeitos nocivos para a saúde mental e bem-estar dos atletas. Na mesma sociedade onde hoje tanto se discute saúde mental, e onde a mesma é utilizada tantas e tantas vezes como bandeira, existe muito pouca consciência de que as palavras são armas e ferem profundamente.
De algum tempo a esta data que se discute o envelhecimento da Seleção Nacional, defendendo-se veementemente a integração de atletas mais jovens. Mas será de facto a Seleção Nacional um lugar seguro para os jovens talentos? Deveria ser, mas não creio que neste momento o seja. Um lugar seguro para jovens é um lugar onde se possam desenvolver e, sim, errar faz parte do processo de desenvolvimento, faz parte do ganhar experiência. Quando qualquer erro coloca o atleta no olho do furacão, então não é um lugar seguro.
É enquanto jovens que os indivíduos estão mais vulneráveis às opiniões alheias e às pressões externas. Quando um jovem atleta é alvo de críticas severas e exposição mediática tão negativa a sua autoestima pode sofrer um golpe significativo, pois a autovalorização dos jovens é altamente influenciada pela perceção de aceitação ou rejeição por parte dos outros. Apesar do impacto poder ser maior em jovens, independentemente da idade, isto pode desenvolver no atleta inseguranças, dúvidas, medos e anseios que em futuras situações de pressão podem surgir como bloqueadores à sua atuação. Esse medo pode resultar em um ciclo de autossabotagem, onde a preocupação com o julgamento externo impede o atleta de atuar ao seu melhor nível. Em termos de saúde mental situações como esta podem levar os atletas a desenvolver síndromes do espectro da ansiedade, mas também depressivos, com todas as consequências negativas que daí podem advir."

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