quarta-feira, 3 de julho de 2024

Diogo Costa atirou água benta para cima de todos os pecados de Portugal


"O guarda-redes da seleção nacional parou três penáltis consecutivos no desempate contra a Eslovénia, depois de um nulo ao final dos 120 minutos, e Portugal está nos quartos de final do Euro, onde vai jogar com a França. Diogo limpou uma série de equívocos cometidos pela seleção nacional e quando foi preciso um herói, ele apareceu a fechar a baliza. Mas há decisões que não dão para apagar. Portugal, uma das equipas com mais talento deste Europeu, vive neste momento de dúvidas, apesar da festa final

Cada defesa de Diogo Costa nos penáltis contra a Eslovénia foi como atirar um jarro de água benta a cada pecado cometido por Portugal neste jogo dos oitavos de final do Euro 2024 - e foram muitos. Uma, duas, três vezes, três vezes se lançou e três vezes impediu a bola de entrar na baliza, dando à seleção nacional mais uma oportunidade, que não fez por merecer, depois de um jogo em que aconteceu um pouco de tudo, muito por culpa própria e auto-infligida.
Houve equívocos, grandes equívocos, houve drama. E houve, no fim, um guarda-redes que se afastou de tudo isto para salvar uma equipa, depois de um nulo que durou 120 minutos. Portugal segue agora para Hamburgo, onde vai jogar com a França nos quartos de final, na próxima sexta-feira. Até lá, há muita reflexão a fazer, se houver vontade para a fazer.
Muito se teorizou sobre a capacidade organizativa da Eslovénia, a facilidade em defender e deixar os adversários desconfortáveis no ataque, mas Portugal nem se pode queixar de falta de espaço, algo que se temia - houve bem mais verde para explorar do que no jogo contra a Chéquia, por exemplo. A equipa começou bem na pressão e reação e o resto foi fazendo Vitinha, impávido mesmo rodeado de camisolas brancas, sempre na busca de linhas de passe, na forma como os seus pés baralharam os pés e os corpos alheios. Os cruzamentos pelo lado direito e as arrancadas de Leão do lado oposto iam permitindo chegar ao último terço, mas aí a seleção nacional falhou. Bruno Fernandes chegou ligeiramente atrasado a um cruzamento de Bernardo aos 13’ e Ronaldo teve várias bolas para golo, sem nunca encontrar com algo que sempre foi uma das suas armas: o timing de impulsão e de ataque à bola. E não é de hoje.
O capitão não esteve, no entanto, longe do golo num livre direto frontal. Só que depois entusiasmou-se demasiado ao tentar marcar outro, agora lateral, de um ângulo quase impossível, desperdiçando o que poderia ser mais uma bola para a área e um lance de perigo para Portugal - e bem sabemos como eles estão caros neste Europeu. Não será preciso ser estatístico para aferir o grau de probabilidade daquele remate entrar, mas Ronaldo ainda assim tentou, com resultados previsíveis.
A Eslovénia, depois de pelos 20 minutos ter intensificado alguma pressão, sem grandes resultados, apareceu já perto do intervalo num lance rápido pela direita, com Stojanovic a ganhar na velocidade à defesa portuguesa e lançar para a área. Salvou Nuno Mendes quando Sporar, que conhece bem, já se preparava para rematar. Pouco depois foi Sesko a surgir em posição frontal (e proibida), com espaço para o tiro, que saiu à figura de Diogo Costa.
A 1.ª parte terminaria com um dos melhores lances e oportunidades para a seleção nacional: Leão, na insistência, passou por dois adversários, cruzou rasteiro e atrasado, com Palhinha a rematar ao poste.
João Cancelo, pela direita, seria um dos grandes animadores da 2.ª parte para Portugal, mas os cruzamentos do jogador do Barcelona tenderam a encontrar adversários pelo caminho. Ronaldo marcou mais alguns livres diretos inconsequentes. Do outro lado, Sesko voltou a assustar, ganhando compreensivelmente em velocidade a um solitário Pepe, mas o mais veterano de sempre a jogar num Europeu ainda teve a capacidade de atrapalhar o avançado esloveno. Não houve muito mais do ataque da equipa balcânica, com as tentativas de transição a serem, quase sempre, bem resolvidas por Portugal.
Mal resolvida, bem mal resolvida, ficou a equipa portuguesa quando, aos 65’, Roberto Martínez tirou Vitinha de campo para colocar Diogo Jota. Pouco depois, lançou Francisco Conceição para o lugar de Rafael Leão, à esquerda. Sem Leão, Portugal perdeu a capacidade de desequilibrar em drible. E sem Vitinha perdeu o cérebro, a capacidade de pensar o jogo. Deixou de dominar a posse, deixou de ter capacidade de baralhar a pressão adversária. Não havendo uma questão física, é incompreensível. E uma pena.
Daí para a frente, Portugal partiu-se, destruturou-se, deixou-se enredar pela dúvida. Só criou verdadeiramente perigo já muito perto do final, num lançamento de Diogo Jota que deixou Cristiano Ronaldo na cara de Oblak. E Oblak, que continua a ser um dos melhores do mundo, defendeu seguro.
No prolongamento, ficou evidente a inexistência do meio-campo de Portugal, com posse mas sem grandes soluções. As alterações vindas do banco apenas lançaram a confusão de uma equipa que teima em não criar rotinas. Bruno Fernandes e Bernardo Silva andaram quase sempre perdidos. O penálti cometido sobre Diogo Jota, entrando sozinho pela área dentro, era, por isso, uma oportunidade de ouro. Cristiano Ronaldo, atipicamente, falhou. Jan Oblak, mais uma vez, mostrou que é um gigante guarda-redes e Ronaldo, pouco habituado a não se encontrar com os 11 metros, chorou. A equipa amparou o capitão no intervalo, quando a confusão tática já se unia à emocional.
Já na 2.ª parte do prolongamento, Palhinha obrigaria o guardião do Atlético Madrid a defesa atenta, mas o jogo agora já não tinha fio, de parte a parte, já era uma tentativa desesperada de evitar o cadafalso. E foi nesta espécie de rame-rame ao contrário que Pepe deixou Sesko fugir em direção à baliza, com a oportunidade de marcar um penálti, mas em movimento, e apareceu então Diogo Costa para o salvamento. Do lado de cá, também há um guarda-redes excecional.
E era apenas o aquecimento para Diogo Costa. Nos penáltis, foi herói, curandeiro, o que quiserem. O primeiro de sempre a defender três penáltis num desempate em Europeus. Roberto Martínez agradeceu-lhe e bem tem de agradecer, porque limpou muitos dos seus equívocos, que podiam ter custado uma eliminação embaraçosa. As lágrimas foram, então, de alegria, mas há tanto para retirar deste jogo que a alegria não pode ser assim tanta. Portugal, uma das equipas com mais talento deste Europeu, vive neste momento de dúvidas, apesar da festa final."

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