quinta-feira, 20 de junho de 2024

Viva os treinadores de bancada


"O futebol nada seria sem eles; mas depois há os que têm de decidir a cada momento

A popularidade sem paralelo do futebol e a sua universalidade dependem de três fatores essenciais: simplicidade, regras-base quase imutáveis e muitos milhões de pessoas que o discutem no seu dia-a-dia.
O jogo de estreia de Portugal no Europeu constituiu um excelente exercício para avaliar a terceira condição.
Alguém disse um dia, mais coisa menos coisa, que os artistas são ladrões de ideias brilhantes uns dos outros. Eu, que não sou artista nem brilhante, permito-me aqui roubar ideias partilhadas antes, durante e após a vitória frente à Chéquia, para tentar defender que o futebol nada seria sem os chamados treinadores de bancada.
«Está a jogar com três laterais», disse-se quando foram conhecidos os onzes (se bem que sobre o da Chéquia poucos de nós saberiam ou saberão, ao contrário, espera-se, do Selecionador Nacional); «Que grande risco jogar sem um trinco, sem o Palhinha» (esta disse eu).
«O Cristiano Ronaldo e o Pepe já não deviam estar aqui», tem-se ouvido desde antes do Europeu. «Ainda jogam todos para o Ronaldo», acrescentou-se.
«Este homem nunca mais mexe na equipa, parece o Roger Shmidt no Benfica!», desabafava-se à medida que o relógia andava e Portugal não vencia.
«Que golo de sorte», gritou-se com o empate, que resultou de autogolo. Nota de outro adepto: «Azar — se eles jogam com dez dentro da área sujeitam-se a um deles acertar na bola para o lado errado.» (Gostava de ter sido eu a dizer esta).
Roberto Martínez acreditou num sistema de jogo. Os treinadores de bancada não terão dado pelas primeiras substituições, visto que a ideia do Selecionador se manteve inalterável. Era bom recordar que a Chéquia, outrora República Checa, nos eliminou de chapéu do Euro-96, chegando depois à final, e tem marcado presença regular nas grandes competições. Apresentar-se contra Portugal com dois autocarros londrinos em frente à própria área é sinal de qualquer coisa. E sabemos como é difícil furar pneus a estes autocarros. 
Quando todos desesperavam na entrada para o período de compensação, entraram dois jokers que construíram a jogada do golo da vitória. «Que sorte do outro Mundo!», clamou-se. Claro que há felicidade nestas escolhas e no acerto em poucos minutos. Mas elas foram feitas por alguma razão.
«Já o meu pai dizia que Portugal é muito bom a circular a bola, mas marcar golos está quieto!» Esta frase ouvi já uns bons minutos depois do final do jogo. E interroguei-me se a Seleção tinha mesmo ganho ou se tinha sonhado com a parte final.
O futebol é esta magia e vive desta magia. A bola que entra ou a bola que vai ao poste podem determinar toda uma adoração ou uma embirração para com treinadores e jogadores. Injusto? Talvez. Mas todos os treinadores e jogadores devem lembrar-se que sem o entusiasmo dos treinadores de bancada não haveria uma indústria como esta, com os seus milhões de adeptos e de euros."

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