domingo, 9 de junho de 2024

O perigo das expetativas altas


"A Seleção Nacional carregará, na Alemanha, um enorme peso sobre os ombros. Até porque o sonho de todo um povo pesa, de facto, toneladas

O Campeonato da Europa está à porta e nunca as expetativas dos portugueses estiveram tão altas. Se se fizesse uma sondagem, talvez politicamente incorreta, sobre o que pensam os portugueses sobre as hipóteses de Portugal voltar a ser campeão europeu, os resultados deveriam refletir um entusiasmo quase generalizado. Porque é verdade que Portugal tem uma Seleção com muitos jogadores de uma qualidade notável, porque tem um treinador que tem provado ser competente e fiável e porque a experiência de competições internacionais, ao mais alto nível, da esmagadora maioria dos jogadores, oferece amplas razões de confiança, também, pela maturidade.
É verdade que selecionador e jogadores têm tentado arrefecer a euforia considerando, numa só voz, que a Seleção Portuguesa é uma das candidatas, mas não, necessariamente, a favorita. Porém, os portugueses não entendem bem essa diferença. Porque a racionalidade no futebol não consegue diferenciar as apertadas margens de um rio de sonhos e emoções. E porque os portugueses, fartos de apenas sobreviverem em vidas severinas na segunda divisão desta confusa Europa, encontram, no futebol e na Seleção Nacional, fatores essenciais de compensação, de orgulho e de autoestima.
A verdade é que os portugueses desejam que Portugal ganhe o Europeu, porque precisam que a Europa e o Mundo os olhe com mais admiração e respeito. É difícil explicar racionalmente qual a razão de uma vitória de uma equipa de futebol, mesmo que seja uma Seleção Nacional, ser considerada a vitória de todo um povo e de um país. Mas a verdade é que é assim, por muito que isso irrite o clássico universo tecnocrático e o pensamento liberal vigente, que entende que nenhuma conquista é importante se não assentar na expressão da economia.
A Seleção carrega, portanto, um enorme peso sobre os ombros. Até porque o sonho de todo um povo pesa, de facto, toneladas.
Em vésperas da partida para a Alemanha, as experiências mais recentes deixam, entretanto, perceber alguns sinais de inquietação. Continua a ser uma Seleção do avesso daquela que conquistou o Euro em 2016. Essa era uma Seleção que brotava sempre, cautelosa e desconfiada, de uma raiz defensiva essencial. E esta, que interpreta a visão de Roberto Martínez para o aproveitamento total do talento dos seus jogadores, é uma equipa que não resiste a divertir-se e a divertir os espectadores. Uma equipa de ataque entusiasmante, imaginativo e plural, mas que ainda tenta encontrar as melhores soluções para evitar as más surpresas de adversários ultradefensivos, mas capazes de jogar rápido e bem, em contra-ataque.
Os últimos jogos de preparação deram, de Portugal, uma ideia de uma construção inacabada. Uma equipa sempre subida, pressionante até ao sufoco, capaz de ter soluções mil com a bola nos pés, mas uma equipa que, às vezes, não defende, porque... não se defende.
Além disso, uma equipa que, previsivelmente, não irá prescindir de Cristiano Ronaldo e que, portanto, ainda nem sequer treinou como irá jogar.
A verdade é que depois de uma campanha cem por cento vitoriosa, a Seleção continua a ganhar, mas, agora, com alguns indisfarçáveis e incómodos sobressaltos. Já não há muito tempo para resolver problemas estruturais, mas o jogo de hoje, com a Croácia, um adversário bem mais consistente e competitivo do que a Finlândia, poderá dar sinais importantes a Roberto Martínez sobre a construção de uma melhor solução defensiva da equipa, sobretudo em situação de perda de bola em zonas muito adiantadas do campo.

Dentro da área
Além da dúvida sobre o futuro imediato de Di María, não se conhece o verdadeiro sentimento dos responsáveis do Benfica no que respeita ao desejo na sua continuidade. Sabe-se do politicamente correto, que seria um privilégio ter, na Luz, o argentino por mais um ano, mas não se garante que seja verdade. O problema é que, com Di María, o Benfica precisa de construir uma equipa adaptada a um fantástico jogador, mas apenas quando tem a bola no pé. Sem Di María, os critérios serão mais livres. Seja como for, a decisão será urgente.

Fora da área
Celebrar Luís de Camões nas suas datas de nascimento e morte sempre foi motivo de desavença nacional. Em 1880, no terceiro centenário da morte do poeta dos Lusíadas, os republicanos deram passos decisivos no caminho da implantação da República, ao liderarem, com largo apoio popular, as comemorações nacionais. Duzentos anos depois, os dois maiores partidos portugueses também encontram nas comemorações dos 500 anos de Camões motivos de desavença. Ao menos houvesse algum sentido de Estado."

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