terça-feira, 28 de maio de 2024

O divórcio entre o Benfica e a Taça de Portugal


"Tal como no Campeonato Nacional, com 38 conquistas, o Benfica é o clube português de maior sucesso na Taça de Portugal. São 26 conquistas, contra 20 do FC Porto e 17 do Sporting, os três clubes que agregam a larga maioria das conquistas da competição que existe desde 1939, após suceder ao Campeonato de Portugal.
É (foi? Já lá chegaremos) uma longa História de amor entre a Prova Rainha e o maior clube português. Tudo começou em 39/40, com a primeira conquista e depois regularmente as conquistas foram-se sucedendo e cada uma mais memorável que a outra. Em 43/44 o Benfica derrotou na final o Estoril por 8-0! Entre 1948 e 1953 o Glorioso venceu a prova quatro vezes consecutivas (embora tenha havido um interregno da prova em 1950, para a disputa da Taça Latina no Jamor... que o Benfica também venceu). Nessas finais destacou-se o espetacular 5-4 ao Sporting em 1952 e o 5-0 ao FC Porto em 1953.
Depois veio a década de 60 e nova goleada ao grande rival do Norte por 6-2 em 1964. Em 1969 a histórica final com a Académica, com a maior manifestação pública de contestação ao Estado Novo. A tal final que Américo Tomás recusou-se a ir ao Jamor e a RTP não transmitiu o encontro e em que no final do encontro os jogadores do Benfica e da Académica acabaram de camisolas trocadas, num gesto de grande simbolismo.
A década de 70, apesar de grande domínio nos campeonatos, ficou marcado por poucas conquistas do Benfica na Taça, embora a final de 1972 seja icónica com o hattrick de Eusébio e a vitória por 3-2 ao Sporting, após prolongamento. E não houve fome que não desse em fartura, pois nos anos 80 a hegemonia Benfiquista voltou e em força. Vitórias sempre sobre o FC Porto nas finais de 1980, 1981, 1983 e 1985! A de 83 teve ainda o gosto especial de ter sido conquistada no Estádio das Antas. Em 1986 a vítima na final foi o Belenenses (depois de um 5-0 ao Sporting nos 1/4 de final) e em 87 novamente o Sporting, com uma vitória por 2-1, num memorável bis de Diamantino.
Chegou a década de 90 e o Benfica terá tido talvez a final mais entusiasmante de sempre, com o incrível 5-2 ao Boavista em 1993, numa exibição fulgurante de Paulo Futre e a final mais triste de sempre, com o 3-1 ao Sporting em 1996, marcada pelo falecimento de um adepto leonino, após o lançamento do criminoso very-light.
Nessa tarde, o Benfica conquistou a sua 23ª Taça de Portugal, quase metade de todas as edições, e tinha mais 11 que o Sporting e mais 15 que o FC Porto. Só que desde aí...o marasmo. Desde esse longínquo ano de 1996 até hoje, apenas mais 3 (!) vezes o Benfica conquistou a prova que dominava com braço de ferro. Tivemos a memorável conquista sobre o FC Porto por 2-1 na final de 2004 (8 anos depois!), o 1-0 ao Rio Ave em 2014 (10 anos depois!) e o 2-1 ao V. Guimarães em 2017. E agora já lá vão novamente sete anos desde essa tarde chuvosa e não mais o Benfica regressou ao Jamor.
Como benfiquista, é profundamente triste e revoltante assistir a este divórcio entre o clube e a prova. Nalgumas eliminações poderá ter havido mérito do adversário, noutras azar, noutras erros de arbitragem, mas tanto falhanço tem que ter uma razão conjetural e não ocasional. É que é mais um sinal da incompetência e do aburguesamento do Benfica nos últimos 30 anos, em que quem dirige, treina e joga no clube preocupa-se sempre muito mais no que dá dinheiro e não no que dá glória. E aquela tarde no Jamor é tudo acerca da glória e do romantismo e nada de receitas. No percurso até às finais, em todos estes anos, o Benfica usa e abusa de onzes carregados de jogadores suplentes, de equipas que não dão tudo e também os adeptos infelizmente entraram nesta secundarização da prova, pois quando as piores assistências da temporada são sempre nesta competição (e na Taça da Liga, outra prova que já tem um fenómeno semelhante: domínio esmagador do Benfica ao início e agora também já não a vence desde 2016...), dão o sinal de complacência à equipa e ao clube. Nas primeiras eliminatórias, com certeza que se entende, mas basta recordar que em 2017, na 2ª mão das 1/2 finais com o Estoril, só foram 25.000 pessoas à Luz. O mesmo nº de adeptos nas 1/2 finais com o Belenenses em 2004. E até naquele incrível 3-1 ao FC Porto em 2014, com o esfusiante golo do André Gomes, só estavam 45.000 adeptos. Mesmo na fase avançada da prova, o Benfica e o Benfiquista não revelam fome pela competição.
Claro que depois todos querem ir ao Jamor. É uma tarde icónica, uma festa popular e de enorme beleza. Uma celebração do futebol à antiga que infelizmente o Benfica tem estado muitas vezes arredado. Urge que o Glorioso reflita sobre por onde anda e por onde vai e dê mais importância a esta competição tão importante na sua História e que tenha muito, mas muito mais sede de troféus! Não é aceitável que um clube desta grandeza só vença 4 Taças de Portugal nos últimos 30 anos e que nas últimas 5 temporadas só tenha vencido 3 troféus em todas as competições, tantos como o Braga.

PS: Para piorar o sentimento de frustração, Rui Costa deu uma entrevista preocupante com pouco sumo, pouca reflexão, poucas soluções para o futuro e uma insistência em Roger Schmidt que, o futuro o dirá, mas só fez lembrar a famosa frase que se atribui a João Pinto do FC Porto nos anos 90: «o clube estava à beira do precipício e tomou a decisão certa: deu um passo em frente»."

https://www.zerozero.pt/opiniao/o-divorcio-entre-o-benfica-e-a-taca-de-portugal/2212

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