sábado, 25 de maio de 2024

Benfica: o futebol primeiro


"No passado dia 7, no rescaldo da confirmação da derrota do Benfica no campeonato que agora findou, escrevi um artigo em que argumentei que a causa de raiz do insucesso do futebol profissional nos últimos cinco anos, residiu na politica de mercantilismo financeiro prosseguida pelo clube, que se sobrepôs aos objetivos desportivos. Infelizmente, as explicações dadas pelo Presidente Rui Costa, revelam ausência de pensamento crítico. Continuará a lutar com seriedade e boa fé, por um paradigma que está errado. Irá terminar cansado e com os benfiquistas frustrados. Começo pelos factos-chave dos últimos anos. Entre 2013 e 2019, o Benfica venceu cinco de seis campeonatos nacionais, com uma taxa de sucesso de 83%. De 2019 a 2024, o Benfica ganhou apenas uma de cinco ligas nacionais, uma taxa de êxito de 20%, ou seja, uma taxa de insucesso de 80%. Se somarmos os pontos dos últimos cinco campeonatos, construindo um campeonato dos campeonatos, o FCP seria o vencedor, alcançando 410 pontos e Benfica e SCP seriam segundos com 394 pontos, menos 16 pontos. O Benfica é, assim, suplantado no numero de ligas conquistadas e no numero total de pontos somados. Porque é que o Benfica deixou de ser a melhor equipa? Porquê, um domínio de seis anos, se transforma, nos cinco anos subsequentes, num expressivo insucesso.
A meu ver, nos últimos anos, foram cometidos dois erros estratégicos:
1º) Cair na armadilha financeira: ao igualar em importância as prioridades financeiras e as desportivas, o clube debilitou ambas. Nos anos de sucesso desportivo (2013-2019), os pilares do êxito foram excelentes jogadores, de grande qualidade futebolística, mas que pelo seu perfil, dificilmente gerariam mais-valias financeiras a posteriori (exemplos: Luisão,Jonas, Cardozo, Lima, Fejsa, Salvio, Gaitan, Pizzi).
Após o " jackpot" obtido no verão de 2019, com a venda do talentoso João Félix, os anos seguintes evidenciaram que o clube procurava outros perfis, capazes de juntar à qualidade desportiva, ganhos financeiros potenciais futuros (exemplos: Raul de Tomás, Weigl, Everton Cebolinha, Pedrinho, Waldschmidt). Infelizmente, a paridade das duas prioridades não resultou, tendo-se revelado uma armadilha fatal. Com a excepção do goleador Darwin Nuñez, o rendimento desportivo dos jogadores contratados não esteve à altura das necessidades.
O Benfica caiu na sua própria armadilha financeira, destruindo valor desportivo e, subsequentemente, debilitando a vertente financeira.
2º) Cair na armadilha comercial: o circuito que habilitou o Benfica a vender bem, não funcionou no sentido de comprar bem, anulando-se o valor criado com as vendas de sucesso. Será que uma situação condiciona a outra? Nos últimos cinco anos, o Benfica vendeu por valores muito significativos João Félix, Raul Jimenez, Rúben Dias, Darwin Nuñez, Enzo Fernandez e Gonçalo Ramos. Supostamente, teria obtido a capacidade financeira para sustentar a liderança no futebol profissional. Infelizmente, o Benfica comprou ( mal) uma massa de jogadores do novo perfil, a preços bastante elevados ( Weigl, RdT, Carlos Vinicius, Everton Cebolinha, Pedrinho, Waldschmidt, Yaremchuk, Kokçu, Artur Cabral, Jurásek ) e que não se revelaram capazes de render desportivamente. Nem ao nível dos talentos recém-vendidos, nem à altura dos melhores jogadores do período vitorioso de 2013-2019. Adicionalmente, o Benfica comprou diversos jogadores jovens, por valores próximos de 10M cada, cuja performance está ainda por comprovar (excepto na infeliz contratação de João Victor, entretanto já revendido). Outros clubes, encontraram no mercado nacional alternativas menos onerosas e que parece estarem a dar uma resposta favorável. O Benfica caiu na sua própria armadilha comercial: ao comprar mal, cancelou os benefícios de vender bem.
Como estes últimos cinco anos demonstraram de forma frustrante, o Benfica não poderá evitar a perda da liderança em Portugal, sem recolocar o sucesso do futebol em primeiro lugar. Para isso, precisará de voltar a encontrar os Jonas, Cardozo, Salvio e Pizzi do futebol atual, concentrando-se num perfil imediatamente ganhador, em detrimento do perfil orientado à valorização financeira posterior. Com isso, assegurará também a dimensão europeia, os correlativos ganhos financeiros, bem como a ambição e a coesão do clube. O Presidente Rui Costa e a Direção do clube, terão de decidir se querem um clube ganhador em Portugal e com dimensão europeia, com uma Direção capaz de mudar o rumo, ou se aceitam um clube que perde regularmente em Portugal, diminuído na Europa, com uma Direção presa a um modelo de gestão que foi paulatinamente asfixiando os objetivos desportivos, encerrando-os numa malha de constrangimentos financeiros. Num clube com a tradição e os valores do Sport Lisboa e Benfica, esta segunda opção só augura uma vivência diretiva pobre, desagradável e, provavelmente, curta."

Nuno Paiva Brandão, in Record

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