"Rica semana, com dois dérbis de grande nível. Treinadores disseram o que tinham de dizer
O futebol, como espelho da sociedade que é, confirma todos os dias que vivemos num mundo cheio de ses. Talvez seja o ser humano a complicar, mas na realidade podemos, facilmente, passar metade da nossa vida a pensar e se?. Quem nunca caiu nesta tentação?
A grande vantagem trazida pelos dois dérbis desta rica semana foi que esses ses baseiam-se essencialmente nas contingências do próprio jogo. Se o Sporting não tem marcado primeiro na Luz, quando não tinha feito muito por isso? Se o Sporting não tem marcado em Alvalade quase antes de o jogo começar? Se Israel não tem feito duas ou três defesas decisivas? Se o Benfica não tivesse marcado em cima do intervalo? Se Trubin, António Silva, Morita ou Inácio (entre muitos outros) não tivessem cometido erros? Se o primeiro lance de Koindredi, ontem, tivesse resultado em golo do Benfica como esteve quase a acontecer? Se Geny não tivesse tirado um coelhão da cartola, com o pé cego, no período de compensação? Se Amorim tivesse feito entrar na Luz o onze de Alvalade? Se Roger Schmidt tivesse mexido antes na equipa?
Podemos ir por aqui afora, mas há mais para dizer. O essencial era percebermos que o futebol se explica sempre, se quisermos, para lá das decisões das equipas de arbitragem, algo que os dois treinadores, aliás, fizeram ontem questão de mostrar.
É nos discursos dos dois treinadores, justamente, que encontramos sinais de enorme inteligência após mais um grande jogo de futebol.
Falou primeiro Roger Schmidt. Exaltou os méritos do Benfica, que os teve e muitos, explicou que a equipa tudo fez para ganhar e desta vez não falou sobre arbitragem (tudo o que dizemos pode bater-nos de volta em estilo boomerang). Mas foi cirúrgico numa frase: «O Sporting tem as mãos no título.»
Perante uma desvantagem pontual relevante, com o confronto direto anulado e a diferença de golos a pender para os leões em caso de empate classificativo, o treinador encarnado só pode assumir que o campeonato está mais difícil e que um eventual sucesso será algo de épico.
Rúben Amorim recusa a ideia da «mão no título» e faz muito bem. Continua a falar em quatro pontos de vantagem, sem contar com o jogo em atraso frente ao Famalicão, e lembra que um dia mau pode reduzir a diferença a um.
Ontem à noite, em Lisboa, ouviram-se carros a buzinar e não é difícil imaginar porquê. Cabe ao treinador do Sporting colocar água na fervura e isolar os jogadores de eventuais festejos antecipados.
O Sporting está a fazer uma época notável e não pode adormecer. O Benfica, desculpem os mais inflamados, também está a fazer uma boa época (atenção à Liga Europa), mas não pode sequer piscar os olhos, sob pena de ficar mal na fotografia.
Se o futebol não fosse imprevisível, não existia."
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