quinta-feira, 21 de março de 2024

Surpresas acontecem por acaso, esta competitividade não: Benfica perde com o Lyon na Liga dos Campeões


"O Benfica conseguiu estar a vencer o Lyon graças a um golo de Andreia Faria, mas as francesas deram a volta (2-1) na segunda parte. Num Estádio da Luz com 19.736 adeptos para assistirem à 1.ª mão dos quartos de final da Liga dos Campeões, as encarnadas tornaram-se na primeira equipa portuguesa a disputar um jogo numa fase tão adiantada da competição. Resta a segunda mão para tentar uma surpresa contra as oito vezes vencedoras da prova

Andreia Faria tinha 60 metros pela frente. Não estava obrigada a bater o recorde nacional da distância. Neste caso, a meta era outra. A bola não lhe saiu do pé até entrar na área. Pudera, estava desprovida de apoio. Perseguiam a jogadora do Benfica as desesperadas defesas do Lyon que davam aos pedais contra uma autêntica mota. Quando a centrocampista deu uma guinada à direita foi para ir na direção da bandeirola de canto festejar o golo que fez acreditar num resultado com contornos épicos.
As francesas, ainda decorriam os festejos, reuniram-se no meio-campo para acertarem contas em relação aos erros que estavam a cometer. E tudo se resolveu com uma conversa. Com essa, no meio-campo, e com a que tiveram no balneário antes de uma segunda parte ao nível do currículo que têm.
Opunha-se a força de um clube com oito Ligas dos Campeões conquistadas contra outro que participou em quatro edições da prova. O Benfica já tinha a história escrita, visto que nunca nenhuma equipa portuguesa tinha estado nos quartos de final. Era então de esperar que a hesitação, o medo e a ansiedade estivessem do lado de quem, pela primeira vez, ocupa um lugar que não conhece, mas as encarnadas até às escuras se orientavam.
À luz da técnica de Kika Nazareth, uma de várias perdas de bola do Lyon no seu meio-campo acabou nos pés de Nycole. Desencorajada a rematar, a brasileira entregou em Andrea Falcón, que veio embalada do lado esquerdo. O remate com a parte interior do pé acabou no poste como reflexo da intervenção da guarda-redes chilena Christiane Endler.
Era a sinédoque dos 15 minutos inaugurais do Benfica que, a partir da pressão alta, incomodou constantemente as centrais do Lyon, Vanessa Gilles e Mbock Bathy. Com a experiência de Wendie Renard sentada no banco, e sem Ada Hegerberg nem Daniëlle van de Donk, as líderes da liga francesa demoraram a render ofensivamente. Mérito da postura camaleónica que o Benfica, do ponto de vista tático, apresentou.
Em organização, as jogadoras de Filipa Patão desmontavam o 4x4x2 losango com que tentavam sair a jogar a partir dos pontapés de baliza e vestiam um 3x5x2, com Andrea Falcón e Lúcia Alves projetadas, Anna Gasper a suster o meio-campo e Kika Nazareth a fazer dupla com Andreia Faria uns metros mais à frente. Era uma maleabilidade conhecida por parte das encarnadas que fecharam o grupo A no segundo lugar, apenas atrás do Barcelona.
O empate (4-4) arrancado pelas encarnadas frente às detentoras da Liga dos Campeões, no Seixal, acrescentava a convicção de que, de novo contra uma equipa de referência na Europa, podiam fincar o pé ao Lyon. No entanto, o ímpeto foi travado quando a alemã Sara Däbritz tornou trending o seu discernimento. Não seria de esperar outra coisa. A equipa treinada pela luso-francesa Sonia Bompastor visitava a Luz ainda sem ter perdido qualquer encontro ao longo da época, ainda que, durante a fase de grupos, a invejável solidez das francesas tenha encontrado exceção em dois empates contra as norueguesas do Brann e as checas do Slavia Praga.
A maca levou para fora do campo a lesionada Nycole, mas não a expectativa que o Benfica tinha que os lapsos do Lyon viessem também até à Luz. Depois de Ucheibe conseguir voltar a controlar Cascarino, flanqueadora que gerou uma situação para Eugénie Le Sommer finalizar dentro de área, as campeãs nacionais voltaram aos níveis de conforto que apresentaram inicialmente. Foi aí que, perante o contexto, Andreia Faria intercetou a circulação das adversárias e correu campo fora até marcar. Antes do final da primeira parte, Chandra Davidson voltou a levar as águias até perto da baliza, mas o remate saiu fraco e até podia muito bem ter sido transformado num passe para a zona central, onde estava Kika Nazareth.
Lindsey Horan, internacional pelos Estados Unidos que quase se viu eliminada por Portugal no último Mundial, é algo ineficaz na arte de esconder sentimentos e barafustava para o ar. Parecendo que não, era um elogio ao Benfica que entrou bem na segunda parte com um cabeceamento de Chandra Davidson ligeiramente ao lado.
Sonia Bompastor trocou as extremos de lado e conseguiu com isso voltar a expor Ucheibe, nigeriana muitas vezes prejudicada pelo adiantamento de Andrea Falcón. Kadidiatou Diani fugiu duas vezes à central do Benfica. Numa delas, rematou ao lado e, na outra, foi negada por Lena Pauels num duelo que se voltaria a repetir mais duas vezes, sempre com a alemã a sair por cima. Mais eficaz foi Cascarino, que empatou o encontro.
Filipa Patão, limitada pela ausência de Jéssica Silva (ex-Lyon), foi mexendo no meio-campo e na defesa para conter o que se tornou numa supremacia clara das francesas. Com outros argumentos no banco, Sonia Bompastor fez entrar Vicki Becho que, de imediato, marcou um golo que acabaria anulado. À entrada para os últimos dez minutos, o Lyon colocava tanta gente quanto podia no ataque. Sara Däbritz, que começou o jogo como centrocampista mais recuada, acabou a completar a cambalhota no resultado dentro da pequena área.
A evolução não podia ter dado mais provas de ter chegado ao futebol feminino nacional. Da última vez que o Benfica e o Lyon se tinham encontrado, na fase de grupos da Liga dos Campeões 2021/22, a equipa portuguesa tinha perdido ambos os encontros por 5-0, no Seixal. Desta vez, perdeu por apenas 2-1, na Luz, perante 19.736 adeptos, e conseguiu estar por cima. Isto, realmente, já não é como antigamente."

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