quinta-feira, 16 de novembro de 2023

O VAR tem dores de crescimento, mas é um caminho que jamais terá volta


"Por esta altura, parece-me evidente que a importância do VAR - Video Assistant Referees - deixou de ser tema mesmo para quem tinha dele visão mais conservadora, temendo que o jogo perdesse dimensão humana, fluidez e entusiasmo.
Hoje em dia são incalculáveis o número de decisões bem retificadas em sala, fruto de análise posterior capaz de detetar e corrigir falhas in loco.
O jogo da última 5ª feira em Alvalade, Sporting - Raków Czestochowa, foi apenas o exemplo mais recente: o internacional albanês Enea Jorgji, que até é bom árbitro, não detetou duas infrações claras cometidas pela equipa polaca na sua área. Estamos a falar de dois pontapés de penálti que potencialmente resultariam (como resultaram) em golo e que não teriam sido sancionados não fosse a oportuna intervenção do vídeo árbitro.
Antes deste e praticamente em todas as outras jornadas europeias e domésticas, foram aos milhares as decisões bem revertidas ou que, passando sem sanção em campo, acabaram por ser punidas com acerto. A maioria teve impacto na definição do resultado, logo na verdade do jogo.
Naturalmente que nem tudo são rosas e a ferramenta, como muitas outras, não é perfeita.
Em Portugal os meios tecnológicos utilizados ao serviço do VAR podem e devem continuar a evoluir dentro da disponibilidade financeira existente. Refiro-me, por exemplo, ao nível da tecnologia do fora de jogo (devemos tentar sempre obter a mais eficaz e credível), da aquisição de uma goal line technology que sane dúvidas que um dia podem ser determinantes ou tão simplesmente da melhoria de qualidade do sinal/definição das imagens rececionadas em sala.
O protocolo deve manter-se aberto a evolução constante (tal como está agora a ser estudado pelo IFAB) e a escolha, preparação e formação de quem exerce a função tem que ser cada vez mais exigente e seletiva: um árbitro despromovido pode até ser VAR mas apenas se provar, com avaliações constantes, que tem competência para desempenhar a função, nunca para manter um posto de trabalho ou uma ligação pós-carreira ao setor. A arbitragem não é a Santa Casa da Misericórdia.
As exigências e responsabilidades da alta competição só permitem lugar aos mais capacitados e qualificados. É assim no futebol como em qualquer outra empresa que se espere de sucesso. É a meritocracia que deve prevalecer, não a perceção (ainda que errada) de que algumas funções são atribuídas para silenciar frustrações, um pouco ao estilo de jobs for the boys.
Em suma, sou defensor convicto da vídeo arbitragem e acho que esse caminho jamais terá volta, embora perceba algumas dores de crescimento (técnicas e humanas) inerentes ao trajeto.
Não tenho a mínima dúvida que a introdução do VAR no futebol profissional trouxe maior precisão e acerto a lances importantes, maior sensação de imparcialidade e mais justiça e verdade ao jogo.
O que não trouxe ainda (e devia ter trazido) é redução do ruído e controvérsia exteriores, deduzo que por duas razões distintas: primeiro pelo facto das decisões continuarem a ser tomadas por pessoas, logo sujeitas a interpretações diferentes e a erros de análise; depois devida a questões culturais inerentes a um povo que, no caso do nosso, vive o futebol de forma demasiado intensa e tantas vezes excessiva, não tendo capacidade emocional para ver e aceitar aquilo que, não raras vezes, está mesmo à frente dos seus olhos.
A única coisa negativa que a vídeo arbitragem expôs é a incompetência pontual de alguns árbitros, que somam erros de avaliação de forma muito regular e padronizada, algo que só não tem consequências piores devido ao auxílio que recebem da ferramenta.
Em todos os jogos - ou praticamente todos - são cometidos equívocos técnicos e disciplinares relevantes, que redundariam em prejuízo direto no marcador, não fosse a intervenção de quem tem meios para os corrigir.
É certo que muitos resultam de análises difíceis de fazer em tempo real (algumas até impossíveis de detetar), mas também é verdade e devemos reconhecê-lo com humildade, que vários são fruto de maus posicionamentos, desconcentração constante, inexperiência, falta de qualidade técnica ou apenas ausência de tato e sensibilidade para ler e perceber o jogo.
É preciso continuar o caminho do mérito e isso pressupõe definição clara e muito transparente (para todos) de como devem ser preparados, acompanhados, nomeados e avaliados os agentes de arbitragem."

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