sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Kokçu, o grande líder


"Em quase 40 anos que levo a acompanhar Feyenoord e Ajax no campeonato e nos jogos internacionais como jornalista desportivo, vi muitos capitães. Mas nunca vi um capitão de 20 anos com tanta coragem e bravura em campo como Orkun Kokçu.
Este talentoso médio não tem sido o melhor orador, mas tem sido um dos mais dinâmicos e determinados jogadores no relvado, além de muitas vezes decisivos para a equipa dele.
Foi também por essa razão que o novo treinador do Feyenoord, o superofensivo Arne Slot, imediatamente decidiu entregar a braçadeira de capitão a um jogador com apenas 20 anos. Slot, porém, causou surpresa, porque media, adeptos e rivais do clube de Roterdão não viam, então, um grande líder em Kokçu.
Eu, no entanto, compreendi a decisão. Talvez porque tinha uma vantagem e já seguia Orkun Kokçu desde os 13 anos, na academia do Feyenoord. Lá, um dos scouts, disse-me bem cedo, num sábado de manhã, enquanto víamos jogos das camadas jovens, que o Feyenoord tinha conseguido contratar um talento especial. Um médio que joga qualquer bola, qualquer bola no jogo, do primeiro ao último minuto, para a frente, pensa e executa para a frente. Por outras palavras, um jogador que tem na cabeça o mais fundamental dos pensamentos ofensivos. Nunca Orkun Kokçu quis jogar a bola para trás ou pensar defensivamente. Jogador tão incrivelmente ofensivo jamais tinha sido visto na academia em muitos anos.
Como jornalista, ficamos curiosos e começamos a prestar mais atenção a um talento. E também assisti ao momento em que ele se mostrou preparado para a estreia na equipa principal do Feyenoord. Kokçu tinha 17 anos e ainda era jogador da academia quando foi chamado para um jogo do campeonato, num dia frio de dezembro, fora com o FC Emmen, em relva artificial. Não eram, seguramente, condições mais apropriadas, mas logo marcou com 17 anos e o capitão do Feyenoord nessa altura, Jordy Clasie (mais tarde do Southampton e agora do AZ), disse imediatamente. «É um grande talento e espero que fique já com a equipa. Pode tornar-se um jogador fantástico.»
Kokçu desenvolveu-se rapidamente e continuou a pensar ofensivamente, no estilo do futebol total neerlandês de Johan Cruyff e do ícone do Feyenoord Wim Jansen, que jogou na Laranja Mecânica de Johan Cruyff no Mundial de 1974 e que foi treinador na academia do Feyenoord quando Kokçu lá treinou e jogou. Ele tornou-se uma joia para o clube e, juntamente com o treinador Arne Slot, promoveu a transformação do Feyenoord, que, num instante, ascendeu ao topo do futebol. Sob a liderança de Kokçu.
O Feyenoord disparou como um cometa com Kokçu como o maestro até à final da Liga Conferência contra a Roma de José Mourinho. Um ano mais tarde, Kokçu tornou o Feyenoord campeão e foi votado o futebolista do ano da Eredivisie. Grandes prémios, grandes momentos na sua progressão.
E vou mencionar, ainda, o momento especial por que ele foi o homem com mais caráter e mentalidade nos Países Baixos nos últimos anos. Kokçu participou em 50 jogos na época passada, incluindo clube e seleção. A sua melhor exibição aconteceu a 13 de abril de 2023, contra, outra vez, a Roma de José Mourinho. Perante 50 mil espectadores em Roterdão, Kokçu jogou ao mais alto nível. Pensou dois passos à frente de qualquer adversário e de qualquer dos companheiros. Foi o grande maestro de uma orquestra que dificilmente o poderia manter. Os seus passes foram magníficos, a sua capacidade de correr gigantestca e a sua visão fenomenal.
Outros grandes futebolistas exibem-se assim, às vezes, a nível europeu. Mas Kokçu fez aquele jogo a meio do Ramadão. Estava a fazer jejum. Não tinha comido ou bebido durante todo o dia. Todos sabemos que é nessas alturas que uma pessoa perde a clareza. Poucos líquidos e pouca comida torna-nos fracos. Mas Kokçu manteve-se o grande líder, dando o tom e fixando o volume da sua orquestra. E o Feyenoord ganhou nessa noite.
Espero que continue a crescer de forma consistente num jogador mais importante e decisivo no Benfica, desde que a equipa tenha um estilo de jogo ofensivo."

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