quarta-feira, 10 de maio de 2023

O Benfica à disposição da Junta de Salvação Nacional


"Em 1 de Maio de 1974, logo após a queda do regime ditatorial, todos os elementos da Direção do Sport Lisboa e Benfica liderados pelo Presidente Borges Coutinho, foram recebidos pelo Coronel Galvão de Melo

Atoarda 'clube do antigo regime' lançada ao Benfica, da lavra de revisionistas com propósitos propagandísticos em total dissonância com o rigor histórico, é facilmente desmontável por testemunhos de figuras da oposição de então e por inúmeros factos, mas nem por isso deve deixar de ser combatida.
Os objetivos são claros. Ao pretender-se conotar o Sport Lisboa e Benfica ao poder político do Estado Novo, procura-se, simultaneamente, desvalorizar os feitos desportivos e a implantação social benfiquista e justificar insucessos próprios nessas décadas. Essa conotação assenta em falsidades, deturpações e escamoteações convenientes (também, com velada hipocrisia, em relação à própria história do clube dos habituais acusadores), tudo em prol de uma narrativa inescrupulosa, ofensiva e falsa para colher ganhos no presente.
Um clube do antigo regime nunca poderia ter sido aquele que, em ditadura, e ao contrário de outros, sempre realizou eleições livres e democráticas. Nem alguma vez poderia ter contado com o contributo público de figuras da oposição, fosse nos órgãos sociais, fosse noutras facetas da vida associativa (desde logo n'O Benfica, cujo primeiro diretor foi o conhecido Magalhães Godinho). Ou veria o seu estádio, o maior do país, 'interdito' à seleção nacional, que só passados 17 anos da inauguração (que não num 28 de Maio  ou num 10 de Junho) se estreou na Luz. Etc., etc., etc.
Vale que, além do empenho de muitos benfiquistas na defesa da verdade e na reposição dos factos, há quem, mesmo não tendo nenhum afeto clubista em relação ao Benfica, aborde o assunto com seriedade. Foi o caso, por exemplo, do sportinguista Alfredo Barroso, combatente antifascista e um dos fundadores do Partido Socialista, em crónica publicada no Record em 26 de Maio de 1998.
'Nos tempos da outra senhora, o Sport Lisboa e Benfica chegou a ser considerado como uma referência democrática, um oasis onde coexistiam vozes de todas as origens políticas e em que algumas figuras notórias da oposição ao Estado Novo chegaram a ser membros dos órgãos sociais do clube (...) O Sporting, pelo contrário, era conhecido pelas suas notórias ligações ao Estado Novo e foi quase sempre dirigido por figuras mais ou menos proeminentes da extrema-direita do regime salazarista'.
Alfredo Barroso não mencionou o FC Porto, mas poderia tê-lo feito. Um clube feito instituição de utilidade pública, com os benefícios daí decorrentes, mais de 32 anos antes do Benfica, e liderada por gente da estirpe de Urgel Horta e Ângelo César Machado, entre outros.
No Sport Lisboa e Benfica sempre vingou uma postura de afastamento em relação à política (já nos estatutos de 1912 constava a interdição ao Clube de 'todas e qualquer manifestações de carácter político ou religioso'. Pugnou, sobretudo, por evitar que se deixasse instrumentalizar, e lidou com os poderes políticos porque assim teria de ser em qualquer regime, mais que não seja por questões burocráticas. Mas houve uma exceção, particularmente significativa.
Em 1 de Maio de 1974, era recente ainda o aroma a liberdade no país após o derrube do regime ditatorial, e contrastando com dirigentes de outros clubes cujo paradeiro subitamente se tornou incerto, todos os elementos da direção do Sport Lisboa e Benfica foram recebidos pela Junta de Salvação Nacional, na pessoa do Coronel Galvão de Melo.
Nesse encontro, conforme relatado por O Benfica, o Presidente do Sport Lisboa e Benfica, Borges Coutinho, 'ofereceu a garantia plena de colocar ao serviço da pátria todo o nosso potencial humano e desportivo', em 'total adesão ao Movimento das Forças Armadas'. No Mundo Desportivo noticiava-se ainda que 'os dirigentes benfiquistas congratulavam-se vivamente com a vitória do Povo e puseram à disposição da JSN as instalações do clube para aquilo que se julgue possa ser útil'.
Em 28 de Abril de 1974, o Benfica ganhara ao Oriental, por 8-0, com golos de Adolfo, Toni, Humberto Coelho, Vítor Martins, Jordão, Vítor Baptista e um bis de Nené em jogo a contar para a Taça de Honra da AFL, mas a verdadeira goleada deu-se passados três dias, no Palácio da Cova da Moura, em Lisboa, com um gesto protagonizado por um grupo de dirigentes que muito enobreceu o Sport Lisboa e Benfica."

João Tomaz, in O Benfica

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