sábado, 15 de abril de 2023

Caímos no ranking, e agora? Esqueçam a centralização dos direitos televisivos


"Portugal perdeu o sexto lugar do ranking UEFA para os Países Baixos. Objetivamente, essa queda diz-nos que em 2024/2025 vamos ter apenas um clube apurado diretamente para a Liga dos Campeões e um segundo a ter de desbravar caminho pela sinuosidade das fases de apuramento; outros três passarão a jogar na Liga Europa e na Liga Conferência. O momento é negativo e, qual impulso irracional, apregoam-se "pensos rápidos" para tapar a ferida.
Uma dessas fórmulas mágicas - a mais debatida e defendida - é a da centralização dos direitos televisivos. Mais dinheiro para os clubes médios/pequenos vai gerar maior competitividade interna, logo maior qualidade futebolística e... problema resolvido. É esta, em traços gerais, a doutrina vigente junto dos grupos que defendem este caminho para o futuro do futebol nacional. Não negando a boa intenção, não acredito nesta "fórmula mágica".
Há exemplos de mercados "semelhantes" que nos devem servir de alerta; países onde a centralização dos direitos televisivos "encurtou" distâncias a nível interno, mas que atirou para o campo da irrelevância internacional os seus principais clubes. Na Turquia, Galatasaray, Besiktas e Fenerbahçe "desapareceram" da elite europeia; na Polónia, Legia de Varsóvia ou Lech Poznan não têm qualquer expressão além-fronteiras; na Bélgica, Anderlecht e Club Brugge estão longe de serem relevantes na Liga dos Campeões.
E nos Países Baixos? O campeonato que acabou de ficar com o sexto lugar que era de Portugal também negoceia coletivamente os direitos televisivos e, para lá de todas as qualidades, também tem visto os seus grandes clubes perderem força internacional. À exceção do Ajax em 2018/2019, grandes campanhas na "Champions" são utópicas para clubes como o de Amesterdão, o PSV ou o Feyenoord. Portanto, maior competitividade interna (discutível, ainda assim) mas irrelevância nos principais palcos europeus. É esse o exemplo maior.
O receio que esse efeito aconteça em Portugal é imenso, não o nego. FC Porto e Benfica, sobretudo, são amplamente mais competitivos na Liga dos Campeões do que qualquer um dos "grandes" clubes dos países acima referidos; e é por isso que o nosso campeonato tem sido, em regra, o sexto mais cotado, ora com aproximações ao quinto lugar, ora com quedas para o sétimo. Mas se retirarmos poder aos principais clubes, o caminho dificilmente será melhor.
A minha reticência não se prende exclusivamente à centralização dos direitos que, per si, não é errada. Prende-se com exemplo concretos que demonstram uma realidade diferente daquela que muitos imaginam possa vir a acontecer; e agarra-se a um medo inevitável de quem conhece o modus operandi do futebol português. Mais dinheiro para administrações mal geridas é um desastre à espera de acontecer. Querem exemplos? Vamos a isso.
Académica OAF e Belenenses estão nos campeonatos secundários; Santa Clara, Paços de Ferreira, Marítimo e Estoril-Praia lutam pela manutenção atualmente; Rio Ave e FC Arouca já estiveram na Segunda Liga nos últimos anos e o Vitória SC é um exemplo crónico de má gestão e incapacidade de gerar o potencial existente. O que é que todos estes clubes têm em comum, para além das dificuldades óbvias? Foram os representantes portugueses na Europa fora do "top-4" na última década.
Nove emblemas que chegaram aos palcos - e ao dinheiro - do futebol europeu sem que daí resultasse uma melhor gestão desportiva ou financeira. Seria profundamente ignorante não ter em consideração as idiossincrasias do mundo do futebol em Portugal, um país onde a corrupção anda de mãos dadas com a normalidade, onde o amadorismo nos gabinetes ainda é uma verdade reinante e onde mais dinheiro, por norma, representa uma tentação ainda maior para fazer o mal e não o bem."

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