quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Entre tanta estrela, foi a competitividade do Benfica que brilhou


"O Benfica voltou a empatar a um contra o PSG, saindo de Paris com a passagem à fase seguinte da Champions mais perto — até porque a Juventus perdeu contra o Maccabi Haifa. Numa partida com poucas oportunidades de golo, a equipa de Roger Schmidt deixou novamente uma imagem de maturidade e serenidade, mesmo depois de ter começado a perder

Visitar o Parque dos Príncipes para disputar um jogo de futebol é, em 2022, entrar numa espécie de galáxia encantada. Olha-se para um lado e vê-se Neymar a bailar samba, desvia-se a mirada e lá está Mbappé a correr como se tivesse um motor nas pernas; eleva-se a face e na bancada está sentado Lionel Messi, o lesionado que foi o grande ausente da noite; perto do argentino está Kit Harington, ou Jon Snow, dando um ar ainda mais de ficção a toda a cena.
Liderando o cenário, na tribuna presidencial, está o omnipresente Nasser Al-Khelaifi, o responsável pela máquina de influência que o Catar montou em Paris. Só o poderio do Estado do Médio Oriente permitiu transformar o mediano PSG neste circo de estrelas — que, não esquecer, é pago com o dinheiro que vem de um país com um péssimo registo de direitos humanos.
Depois do empate a um verificado no Estádio da Luz, o Benfica foi à cidade iluminada visitar o mundo que parece distante do PSG. Mas, tal como há uma semana, o que parece longínquo — em dinheiro ou mediatismo — tornou-se, dentro de campo, mais próximo, humano, alcançável.
O jogo teve poucas oportunidades de golo, com os locais a só rematarem à baliza de Vlachodimos em três ocasiões e os visitantes a só acertarem no alvo por uma vez. Neste embate traçado entre as duas áreas, sem chegar perto das redes, imperou a personalidade e convicção coletiva do Benfica, quase sempre confortável num desafio que voltou a colocar vários dos melhores executantes do mundo do lado contrário.
O 1-1, conjugado com a derrota, por 2-0, da Juventus em Israel contra o Maccabi Haifa deixa o Benfica muito perto dos oitavos-de-final. A equipa portuguesa tem oito pontos, os mesmos do PSG e mais cinco que israelitas e italianos. Resta, para as águias, a receção à Juventus e a visita ao terreno do Maccabi.
Sem David Neres, Roger Schmidt lançou Aursnes na partida, colocando o norueguês, habitual ocupante do centro do terreno, partindo da esquerda. O ex-Feyenoord contribuiu para equilibrar o meio-campo, deu força na recuperação e ajudou a encher o Benfica de centrocampistas, mas nalgumas ocasiões notou-se a falta de argumentos para desequilibrar no último terço.
Os primeiros 30 minutos deixaram antever o que seria o encontro. Um PSG com mais bola, mas sem dominar claramente nem conseguir desequilibrar para atacar a baliza de Vlachodimos com perigo, perante um Benfica com uma tranquilidade que até parece estranha para um conjunto que, para todos os efeitos, tem escassos meses de vida sob a liderança de Schmidt.
Com efeito, o primeiro tiro da partida foi feito pelos portugueses. Após posse de bola prolongada, efetuada ao som de gritos de “Benfica! Benfica!” nas bancadas, Rafa Silva atirou por cima dentro da área.
As horas antes da partida ficaram marcadas por notícias sobre Kylian Mbappé, que parece viver numa eterna novela sobre o seu futuro. Quatro meses depois de, quando terminava contrato com o PSG, ter renovado o vínculo e rejeitado o Real Madrid, imprensa de diversos países voltou a dar conta da vontade do avançado em sair do clube.
Luís Campos desmentiu a informação, mas mais uma situação de alegado desconforto e falta de sintonia entre as estrelas do PSG não deixa de ser sintomático da realidade que se vive no clube. Uma compilação de nomes fantástico, qual álbum de greatest hits em formato de equipa de futebol, mas à qual parece sempre faltar harmonia.
Aos 40', depois de uma má abordagem de António Silva perante Bernat dentro da área, foi assinalado penálti a favor dos locais. Ainda sem qualquer oportunidade de golo para o PSG, Mbappé, com Messi na bancada e Neymar a ver, fez o 1-0. A celebração teve ares de momento de reivindicação pessoal para um craque que parece viver em eterna dúvida sobre o próximo passo que dará.
O lance que deu origem ao 1-0 foi, provavelmente, o primeiro erro crasso de António Silva na equipa principal do Benfica. Aos 18 anos e perante o nível da oposição que tinha de enfrentar, poderiam haver dúvidas sobre a forma como o jovem lidaria com o resto do desafio. Na verdade, seria legítimo alargar essas questões a todo o Benfica.
No início do segundo tempo, as águias deram muito espaço a Neymar, que serviu Mbappé para que este obrigasse Vlachodimos a fazer a primeira defesa da noite. Aos 52', Mbappé, com muito espaço pela esquerda, rematou em arco, a escassos centímetros do poste de Vlachodimos. O PSG estava em vantagem, quer no marcador quer nas sensações, e o Benfica poderia sofrer, tal como António Silva poderia tremer depois daquele deslize.
Mas nada disso sucedeu. Os visitantes acalmaram as operações, mantendo-se fiéis à imagem competitiva sem a qual nenhuma equipa arranca uma temporada com 17 partidas sem perder.
Aos 59', esse saber estar do Benfica no campo de uma potência levou a uma longa circulação. A bola foi da esquerda para a direita com critério, levando a um cruzamento de Bah. O PSG cortou, mas logo de seguida o objeto mais desejado voltou a pés dos que vestiam de vermelho.
Enzo dirigiu a ação com a sua batuta, António Silva demonstrou-se imune a traumas pelo erro e antecipou-se, tornando uma recuperação de bola num início de ataque. Rafa mexeu-se na frente da linha defensiva do PSG, forçando Verratti ao erro. Após consulta do VAR foi assinalado penálti.
Tal como em Turim, João Mário não tremeu na execução do castigo máximo. Remate forte para o centro da baliza e reestabelecida a igualdade.
O PSG tentou reagir, sempre com Marquinhos a juntar-se aos médios na construção de jogo. Mas o Benfica foi fechando os caminhos nuns 30 minutos finais à imagem dos inaugurais, com pouca baliza. Gilberto entrou para dar agressividade na zona em que mais caia Mbappé, Pinho, Draxler e Diogo Gonçalves deram alguma frescura nos instantes finais.
Com a equipa de Galtier sem argumentos para desfazer a igualdade, o apito final chegou com uma certa ideia de naturalidade, de resultado lógico perante o que se tinha visto em campo. Sair de Paris dando esta sensação, depois de travar pela segunda vez seguida o PSG, é um grande atestado ao trabalho do Benfica de Roger Schmidt."

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