segunda-feira, 23 de maio de 2022

Carta aberta a Roger Schmidt


"Caro Roger,
Bem-vindo ao Sport Lisboa e Benfica! É com todo o gosto e prazer que o recebemos no nosso clube, na esperança de que juntos vivamos momentos de glória. Acredite que o estamos a receber de braços abertos, pois a sua felicidade será a nossa felicidade. E oh se andamos a precisar da glória e da felicidade...
Sabe que a sua cara não me era estranha. Recordo-me de há uns anos nos ter vencido de forma clara quando treinava o Bayer Leverkusen e ainda o ano passado ficamos todos bem impressionados com o seu PSV. Apesar da vitória na Luz e do empate épico em Eindhoven (a jogar com 10 boa parte do encontro) vimos uma equipa forte, bem organizada e com bom futebol. É essa a sua imagem de marca, certo? Um futebol ofensivo e pressionante. Asfixiar o adversário, pressionar alto e marcar muitos golos? Opá, vamos a isso! O tribunal da Luz costuma adorar essa atitude. E tendo em conta a maioria dos adversários que vai encontrar na Liga Portuguesa, talvez seja a fórmula perfeita para o sucesso, mesmo que aqui e ali possa(mos) vir a revelar algumas dificuldades defensivas.
Mas permita-me a ousadia de lhe dar algumas informações a quem chegou a um país e clube novo. Antes de mais, dizer o óbvio. O amigo acabou de chegar a um clube gigante. O mais vitorioso em Portugal e com uma História tremenda na Europa. Um clube lendário que já foi de Eusébio e com milhões de adeptos espalhados por todo o mundo. E apesar de chegar numa fase complicada, veja isso da seguinte maneira: quão admirado e amado pela nação Benfiquista será o Roger se trouxer sucesso ao nosso Glorioso, depois de três anos miseráveis!? Acredite, este povo trata muito bem quem nos faz feliz.
Agora, também conselhos e avisos, porque quem avisa seu amigo é. Roger, prepare-se para o futebol Português. Nós chamamos isto de "Tugão". Noventa por cento das equipas vão estacionar o autocarro. Cem por cento das equipas vão perder tempo, reclamar com o árbitro, atirar-se para o chão e protestar antes, durante e depois dos jogos. Acredite, é mesmo assim. Prepare-se para ficar surpreendido com várias decisões do VAR. Prepare-se para se irritar com a burocracia de Portugal e do futebol português. Prepare-se para jogos em horários impróprios e com estádios vazios. Não tanto os do Benfica, porque esse tem um exército que o acompanha para todo o lado, mas mesmo assim vai ver muita cadeira vazia. Até na Luz. E não fique espantado de ninguém se preocupar muito com isso. Nem ninguém querer saber do tal tempo perdido, dos jogadores a atirarem-se para o chão, dos insultos ou do futebol defensivo. É o que é e sempre foi assim, dir-lhe-ão. Até porque no meio desta anarquia vão surgindo sempre novos talentos e as equipas portuguesas lá se vão safando na Europa, tendo em conta os recursos limitados.
Bom, mas também precisamos de olhar para dentro. Caro Roger, como lhe vou explicar isto. Repare...não é por acaso que o Benfica vem de três temporadas péssimas. E foram mesmo péssimas, não se deixe iludir com os 1/4 de final da Liga dos Campeões deste ano. Você tem mesmo muito trabalho pela frente! E não acredite na conversa do tempo e da paciência. Isso é um conceito que aos latinos não assiste. Nós temos o sangue quente. Achamos logo que ou dá ou não dá. Não digo que tem obrigatoriamente de ser campeão já este ano, mas não pode ficar muito longe disso.
"E como vou conseguir fazer isso tão rapidamente, numa equipa que ficou a 17 pontos do campeão?", estará agora a perguntar aos seus botões? Bom, o senhor terá confiança no seu trabalho, certo? Mas olhe que vai precisar de pulso firme! Vai precisar de abanar o clube todo. É que nós estamos anestesiados. Estamos sonolentos. E quando digo todos falo de dirigentes, jogadores e adeptos. Ainda agora tivemos o maior rival a festejar o título na nossa cara e até parece que nem doeu muito. E quando já não dói, soem os alarmes, porque o problema é profundo.
Olhe desconfiado para tudo. Para os seus dirigentes. Porque eles muitas vezes vêem a "instituição" como um negócio, como um entreposto de jogadores ou como um balancete ambulante e não como o projeto desportivo que é ou a paixão que devia ser. Não se deixe levar na onda de contratar paletes de jogadores de qualidade duvidosa. Exija bons reforços. Para posições carenciadas. E lute até ao fim para manter os melhores jogadores. Há que convencer os Darwins desta vida a ficarem mais de 6 meses no clube depois de explodirem. E meta na cabeça dos seus dirigentes que cada bom jogador vendido é mais um passo para vermos o Porto de novo campeão. E ninguém quer nada disso.
E por falar em jogadores...caro Roger, eu não estou lá no balneário e só sei os rumores que toda a gente ouve, mas entre com autoridade e exigência. Seja implacável! É que disto tenho eu a certeza: os jogadores do Benfica estão acomodados. Não correm tanto como os outros. E isso sim dói-nos especialmente. Diga-lhes que isto é um novo ciclo e ou estão envolvidos a 100% ou a porta da rua é serventia da casa. No Benfica só podem estar jogadores com a atitude certa: vencer, vencer, vencer! Não há cá encolher os ombros e "levantar a cabeça e pensar no próximo jogo". Isso é mentalidade para o outro lado da segunda circular.
Aproveitando a deixa, falemos então dos rivais. O referido Sporting tornou-se nos últimos dois anos um adversário competente, bem treinado por um benfiquista, mas muita atenção ao Porto. É esse o seu alvo. Tem o mesmo treinador há 5 anos e mérito lhes seja dado, conseguiu este ano formar a sua melhor equipa. E depois...lembra-se do Mourinho falar em "mind games"? Pois, prepare-se. É um rival que joga com tudo, que vive a luta ao máximo, que tenta atirar toda a lama ao Benfica e que faz da raiva a sua bateria. "Contra tudo e contra todos", dizem eles. É um adversário mesmo muito perigoso. Vai obrigar-nos a jogar muito à bola (teremos que ir à casa dos 90 pontos para sermos campeões) e aqui e ali vai ter que ir para um jogo de palavras que se calhar não lhe agrada muito.
Eu sei que a carta vai longa e já falei em dirigentes, jogadores e rivais, mas ainda tem mais um grupo para conquistar. Nós, os adeptos. Deixe-me explicar que há uma separação evidente dos benfiquistas com o clube. Muitos já nem vão ao estádio e os que vão, vão por obrigação. Falta identificação com o que vemos no relvado, percebe? Falta voltarmos a apaixonarmo-nos por um projeto, por uma ideia e pelas pessoas que o concretizam. Lute por essa reaproximação! Tire o seu grupo da redoma em que estão isolados. Deixe-nos receber o autocarro na rotunda com milhares de pessoas e tochas. Diga aos seus jogadores para fazerem a vénia (uma tradição lindíssima que lhe hão-de explicar) bem perto da bancada e não no meio-campo. E quando o jogo acabar, tenhamos ganho ou perdido, é importante que o seu grupo se aproxime dos adeptos e os olhe nos olhos. Não basta umas palmas forçadas no centro do campo e recolherem o mais rápido possível para dentro do balneário. Se vamos voltar a ser campeões, temos que ser uma família unida e próxima. Um por todos e todos por um. E Pluribus Unum!
Quero mesmo muito que o senhor seja feliz em Portugal. Este é um país fantástico e tenho a certeza que vai adorar o clima, a comida e as pessoas. Roger...sem medos, vá com tudo e torne-se um de nós! O nosso Rogério Chaimite. Traga lá craques para a nossa equipa, prepare bem esta pré-época e daqui a um mês vemo-nos na Luz. De cara limpa, a começar do zero e todos dispostos a honrar o velho clube campeão. Vamos a isso. Rumo ao 38!"

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