sábado, 4 de dezembro de 2021

Bancadolândia


"A noite foi de sono corrido, acossada pelo sobressalto, pelo receio de que o despertador emudecesse ou o corpo se entregasse desalmadamente, às curas paliativas do desgaste. À hora certa, no local exato, a primeira missão dominical estava cumprida. Meia dúzia de metros ao lado, naquele gélido amanhecer que o sol descoberto mitigava, um pequeno grupo de pessoas debatia 'o facto' da noite antecedente - o borrão do Jamor!
Discutia-se, lamentava-se o sucedido no jogo B Sad - Benfica, que terminou ao minuto 48 pelas razões que sabemos, e embrulhavam-se conclusões e acusações. 'O Benfica isto'; 'Os jogadores do Benfica aquilo...' Sentenças intragáveis, mas reveladoras: o falatório inspirava-se no éter, as argumentações eram vazias, desprovidas de nexo, mas aquele 0-7... Bem, aquele desfecho tão pesado, mesmo para quem não assistiu, ou pouco, ou nada, sabia acerca do que se passara, é que não podia ser. Não, meus senhores, isso é um profundo engano. Se há aspecto que se salvou naquele desgraçado serão foi mesmo o profissionalismo da equipa do Benfica!
Comportando-se como se exige num jogo se uma competição profissional, os jogadores benfiquistas não só respeitaram quem pagou bilhete - para estar no Estádio Nacional, no sofá de casa ou na cadeira do café... - como honraram e valorizaram o esforço dos adversários. Apontar às bandeirolas de canto, isso, sim, seria indigno e vexatório!
O 'protesto' esteve lá (o resultado desnivelado é ou não é assunto?), fez-se com brio e racionalidade, como golos que deveriam ser transportados para o aldo correto da análise e do debate da trapalhada que, do lado organizativo, quem tinha obrigação moral e poder regulamentar não foi capaz de evitar. Tantos não viram, não veem ou não quererem ver nem saber. Surpreendente? Zero! Nesta terra de juízos no coldre, o disparo arbitrário continua a ser fácil, sem se olhar a causas nem consequências.
Do leque de declarações assertivas e pertinentes que devem ser retidas no pós-Jamor, esta, proferida pelo presidente Rui Costa, é uma delas: 'Devemos estar todos envergonhados pelo que se passou, mas em nenhuma circunstância o Benfica é responsável por aquilo que aconteceu. Não nos agradou de maneira nenhuma ter de ir para campo nestas condições, não beneficia o futebol português, mas não passem esse ónus para o Benfica'."

João Sanches, in O Benfica

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