sexta-feira, 4 de junho de 2021

Manifesto pela união dos benfiquistas


"A uma direção do Benfica, exige-se que ganhe, pelo menos, dois campeonatos em cada quatro e leve sempre o clube à Liga dos Campeões. É a bitola mínima.

Uma parte fundamental da nossa história como adeptos é dor. Em qualquer equipa, em qualquer desporto. Claro que todos recordamos melhor as vitórias, os golos, os títulos, a festa – mas a seriedade, a tristeza com que vivemos as derrotas, as finais perdidas, a lesão do grande jogador, a goleada humilhante, dizem, pelo menos, tanto ou mais de como verdadeiramente somos do clube que somos.
Os gauleses de Astérix fingiam que não sabiam de nenhuma Alésia – e eu, às vezes, também juro a pés juntos que nunca ouvi falar de Vigo – mas é impossível negar uma época inteira de fracassos. Simplesmente fingir que ela não existiu, ou que é aceitável acabar em terceiro, ser eliminado sem apelo nem agravo da Champions, eliminado sem apelo nem agravo da Liga Europa, eliminado sem apelo nem agravo da Taça da Liga, derrotado sem espinhas na Supertaça e na final da Taça, derrotado sem espinhas pelo Gil Vicente, goleado pelo Boavista, sofrer para ganhar ao Paredes – e tudo depois de fazer o maior investimento de sempre. Isto não é aceitável para um adepto; muito menos para um treinador. Muito menos para um Presidente. Não é aceitável – e não é esquecível.
Se o Benfica pretende ganhar alguma coisa em 2021/2022, convém que comece a reconhecer o mais depressa possível o desastre que foi 2020/2021. Porque, ou aceita o que esteve mal e procura corrigi-lo, ou vai acontecer tudo outra vez. Pior: não terá dois jogos de tolerância, duas conferências de imprensa estapafúrdias de paciência.
O primeiro a assumir as suas responsabilidades tem de ser quem mais responsabilidades tem: o Presidente. Um Presidente do Benfica tem de estar no Benfica – e só no Benfica. O Benfica não é um part-time, nem um passatempo, nem uma medalha que se põe ao peito, nem muito menos um escudo e ainda menos um fardo. Luís Filipe Vieira foi eleito há menos de um ano. Como é público, fui um dos muitos milhares que contribuíram para a vitória. Mas apoiar não significa falta de autocrítica ou exigência; pelo contrário.
Em segundo lugar, o número dois Rui Costa é uma figura maior do universo benfiquista, um ídolo, uma referência. O seu primeiro ano como vice-presidente soube a muito pouco. Rui quer mesmo ser vice-presidente ou continua apenas diretor desportivo? Quer suceder a Vieira ou apenas seguir Vieira? Pelo seu passado, pelo seu carisma, pelo seu exemplo, Rui Costa habituou-nos a esperar e a exigir muito mais dele e se pretende unir os benfiquistas, como talvez só uma figura como ele possa fazer nos próximos anos, tem de liderar.
Em terceiro lugar, Jorge Jesus – e o terceiro lugar foi mesmo tudo o que Jesus conseguiu. Um 11 do Benfica tem que ter sempre três tipos de jogador: o jogador português consagrado, que gostamos de ver enquanto orgulho e símbolo do país; o jogador formado na casa, que carrega o ADN e a mística do clube, a reputação da formação do Seixal e que serve de modelo às gerações posteriores; e o jogador maduro, que acrescenta classe, experiência e nos faz sonhar.
Num ano, Jorge Jesus destruiu tudo. Interrompeu anos de aposta bem-sucedida no Seixal, devolveu-nos aos piores tempos de um onze sem portugueses, sem identidade, sem referências, desprestigiou a braçadeira de capitão e andou de desculpa em desculpa e desastre em desastre, como se não tivesse qualquer responsabilidade. Mas Jesus só não tem todas as responsabilidades pelo que se passou nesta época porque tem de dividir pelo menos algumas com a direção que o deixou sempre à vontade para ser a pior versão dele mesmo. Pela primeira vez em 10 anos, não fomos à Champions e estamos longe de a ter garantido para o ano, mas não vimos Jesus assumir uma só pequena parte de responsabilidade por isto. A sua arrogância é insuportável, as suas desculpas ridículas. Nunca será a pessoa certa. O Benfica precisa, agora mais do que nunca, de um treinador de futuro, de um líder que queira ganhar e não de um que se compraz em já ter ganho.
Só as vitórias unem. O Benfica está dividido e qualquer temporada que não passe por conquistas só o vai fraturar ainda mais. Os descontentes têm de ser pacientes e não abrir ainda mais feridas que só prejudicarão mais o clube, mas a maior responsabilidade cabe a quem está do lado de dentro. Presidente, vice-presidente, treinador – quem quer que ele seja – têm de fazer mais, muito mais, pelo Benfica. A Covid não explica todos os problemas do Benfica 2020/21.
A uma direção do Benfica, exige-se que ganhe, pelo menos, dois campeonatos em cada quatro e leve sempre o clube à Liga dos Campeões. É a bitola mínima! Estamos a entrar num círculo vicioso: a falhar o acesso à Champions, a perder as suas receitas e a oportunidade de ali mostrar os jogadores. E menos receita significa menos capacidade de investimento, menos capacidade de construir uma equipa capaz de sucessos desportivos.
Por outro lado, urge democratizar a vida interna do clube. O contínuo adiamento da revisão dos estatutos só vai conseguir uma coisa: cada vez mais crispação, cada vez mais fraturas, cada vez mais um ambiente de guerra que não aproveita a ninguém, muito menos a quem mais importa: o Benfica.
Enquanto adepto, e um que tem voz pública e apoiou e apoia assumidamente esta direção, não perdi o meu grau de exigência por isso. O mínimo que a direção tem de fazer é assumir o que de errado aconteceu nesta época e apresentar um plano claro do que será diferente para a próxima.
O Sport Lisboa e Benfica é a maior instituição portuguesa. Adeptos ou dirigentes, ou estamos cá para a unir ou dividimo-la. Ou estamos cá para a servir ou não servimos.
* Sócio nº. 25768"

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