quarta-feira, 31 de março de 2021

A presidência portuguesa da União Europeia e o desporto


"Os três primeiros meses da presidência portuguesa da União Europeia, no que ao desporto respeita, são uma desilusão. Não se encontra uma ideia, um projeto, um sinal de concertação e solidariedades no contexto do espaço europeu.
A pandemia não poupou ninguém nem nenhum país, devastou a generalidade dos sistemas desportivos dos países europeus pelo que era expectável que a concertação de uma resposta conjunta à situação estivesse na primeira linha das preocupações dos responsáveis europeus. Até ao momento, o que se constata, e que seja do conhecimento público, é que são vagas as referências ao tema na agenda política europeia, deixando ao critério de cada Estado o encontrar de soluções.
Um exemplo desta falta de liderança política da situação está no modo como se tratou a oferta das vacinas por parte do Comité Olímpico Internacional, que requeria uma convergência dos Estados membros no sentido de definir uma orientação que, entre outros passos, passaria pela avaliação por parte das autoridades de saúde europeia da vacina oferecida com origem na China.
Ora, como muito bem disse o coordenador nacional da task force nacional, é desejável "a aquisição de todas as vacinas que seja possível trazer ao processo português, desde que tenham qualidade, as garantias necessárias de reguladores credíveis e possam ser administradas em território nacional".
A própria retoma desportiva tem cambiantes distintas em cada país, determinada não tanto pela situação epidemiológica, mas por critérios de natureza técnica distintos, relativos ao grau de risco de contágio. 
Num quadro de enorme instabilidade para os sistemas desportivos dos Estados membros, a União Europeia manifesta-se incapaz de refletir sobre o problema e, por consequência, de estudar medidas comuns de redução dos impactos negativos ocorridos.
Temas como a Inovação no Desporto ou a Diplomacia no Desporto surgem na agenda da presidência portuguesa exprimindo preocupações que dificilmente podem secundarizar aquilo que neste momento é prioritário no espaço europeu: recuperar económica e socialmente os países, neles incluindo os respetivos sistemas desportivos. Na prática, foi construída uma agenda sem agilidade, longe de conseguir responder às necessidades impostas pela conjuntura crítica da pandemia. E políticas sem alcance prático não são mais do que exercícios retóricos fúteis e dispendiosos.
Justiça seja feita ao Conselho da Europa, cuja assembleia parlamentar se prepara para adotar uma resolução sobre a situação que se vive no desporto na Europa após a pandemia, tendo por base a moção "Políticas Desportivas em Tempos de Crise", curiosamente redigida por um deputado português.
Este trabalho tem como propósito desenvolver um plano de ação concreto sobre as consequências de longo prazo da pandemia na sustentabilidade do movimento desportivo europeu, com medidas destinadas a desenvolver políticas intersetoriais que promovam o desporto de base num ambiente seguro e protegido das ameaças crescentes à sua integridade e viabilidade económica.
Está em causa para o Conselho da Europa a salvaguarda do modelo europeu de desporto - que é hoje o maior garante para que a resiliência e demais benefícios da prática desportiva continuem a ser prestados junto da sociedade e dos indivíduos, particularmente os mais carenciados - e que está longe dos horizontes da presidência portuguesa, nomeadamente quando o tecido desportivo do país vive há mais de um ano sem qualquer medida extraordinária que acuda ou mitigue os efeitos imediatos da pandemia num dos setores mais atingidos por esta.
Pode ser que no segundo trimestre se passe das palavras aos atos e nos traga a inspiração que o primeiro não motivou sob pena de a presidência portuguesa da União Europeia se traduzir, para o desporto, numa oportunidade política perdida, adiando as expectativas de agentes e organizações desportivas que desesperam pelo tempo que há muito se arrasta para concretizar aquilo que se proclama."

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