"Na semana passada trouxe para aqui o orgulho que generalizadamente sentia nos portugueses, que em diversas actividades têm mostrado o melhor de nós no combate à pandemia. Infelizmente há excepções, e neste campo a estupidez parece não ter limites.
O director de ou outrora prestigiado semanário, entre duas tacadas de golfe, lembrou-se de propor que o Estado despedisse funcionárias de forma a haver 'moralidade' face ao sector privado. Por sorte não exigiu que empresas que praticamente não sentem a crise (como a sua) fechassem portas para equilibrar as coisas relativamente a outras.
De facto, não se compreende como certas pessoas ascendem a determinados cargos.
Outro exemplo brilhante é o de um conhecido colunista e comentador televisivo que, depois de ter exigido que o Presidente da República - de 71 anos e tendo sido exposto a uma situação de risco - abandonasse a quarentena para heroicamente se apresentar em Belém, também exigiu que o governo lhe desse uma data certa para o fim da pandemia e o regresso à vida normal. Ou seja, queria um palpite, completamente ao arrepio dos maiores especialistas e mais reputados cientistas de todo o mundo. Talvez esta sexta-feira calhasse em, digo eu, para podermos aproveitar a Páscoa...
Em vez de se aperceber do ridículo e humildemente pedir desculpas, o fulano ainda insistiu na tese achando-se incompreendido.
Enfim, estas são excepções. Há outras, mas felizmente o país e as suas instituições não são geridos por idiotas."
"Nesta fase terrível das nossas vidas, fomos confrontados com mais uma perda irreparável - partiu José Magalhães. Aos 91 anos, deixa uma pesadíssima herança. O nosso antigo capitão da equipa de voleibol e treinador da mais notável equipa feminina daquela modalidade deixa um enorme legado que nos convida a várias reflexões. A primeira de todas é o seu exemplo. As 31 épocas em que José Magalhães se dedicou ao Benfica, primeiro como atleta de eleição e depois como técnico, configuram um verdadeiro caso de benfiquismo. Tudo o que ajudou a conquistar fica nos anais da história do voleibol português. Os 11 títulos conquistados como técnico da célebre equipa das Marias são um verdadeiro caso de estudo. Em meados dos anos 60, o SL Benfica montou um projecto desportivo vencedor que lhe permitiu ter uma equipa imbatível durante nove épocas consecutivas. Foram nove campeonatos e duas Taças de Portugal conquistados fruto de um trabalho metódico, dedicado e inspirado nos mais puros princípios do benfiquismo. José Magalhães liderou com mestria, resiliência e inteligência uma das melhores equipas do desporto nacional. Um projecto que inspirou a actual direcção do Clube e o presidente Luís Filipe Vieira a apostar no feminino. Desde Novembro de 2003, as nossas equipas seniores, masculinas e femininas, conquistaram 430 títulos em 20 modalidades. Desses títulos, 146 foram da autoria das equipas femininas, sendo que estas ajudaram a conquistar amsi 12 em provas mistas. Quem assiste à forma de competir das nossas equipas de futsal, hóquei em patins, atletismo, judo, triatlo, râguebi, luta, basquetebol, voleibol, andebol, polo aquático, natação, bilhar, boxe, ténis de mesa, ginástica e futebol só pode concluir que todas elas são verdadeiras Marias.
Os meus sentidos pêsames à família Magalhães, em especial ao seu neto e nosso ex-voleibolista e campeão, o João Magalhães, e aos seus amigos e alunos. Saibamos inspirar-nos no seu exemplo."
"Há prémios que sabem mesmo bem. Este é um deles, conquistado na escola pelo trabalho e pela atitude do Rodrigo, que se destaca pelo compromisso e pelo percurso exemplar no projecto 'Para ti Se não faltares!'. Mais que um prémio bem merecido, é de um sonho que se trata. É que o Rodrigo sonha com uma baliza só sua, num relvado imenso e num estádio ensurdecedor, infernal, como só a Luz consegue ser. Quer ser relevante e agarrar o toiro pelos cornos, gosta e aceita desafios e não vira a cara ao risco e à responsabilidade. Sabe que para isso só há um caminho, estreito, inclinado, com obstáculos e sobressaltos. Esse caminho tem um nome próprio: Trabalho, e um apelido: Resiliência. Não é para todos, por isso o desafia tanto na flor da juventude e lhe desafia tanto na flor da juventude e lhe desperta paixões. Mas nesse caminho do sucesso e da realização do sonho não há só dificuldades, há compensações que, vencida cada etapa, reconfortam e valem memórias inesquecíveis. Recordam-lhe que valeu a pena e reafirmam que vai continuar a valer a pena, trazendo-lhe o perfume suave da vitória para lhe encher o peito e atiçar a vontade. Nesse caminho há também ídolos e heróis que inspiram e motivam pelo exemplo, inalcançáveis, inacessíveis aos demais, mas ao alcance de uma videochamada social que, paradoxalmente, ofereceram ao Rodrigo, pelo seu esforço, um contacto privado com o seu ídolo de sempre: Odysseas! Não interessa agora a conversa, mas o que Rodrigo dela retirou e fez chegar à Fundação com palavras escritas no calor do momento. Seria real, teria mesmo acontecido? O Odysseas, a quem disse que estava a trabalhar para conquistar as luvas, ofereceu-lhe as dele? Acabou dizendo que a Fundação Benfica já fez tanto por ele, que, um dia, ia retribuir tudo em dobro. Obrigado, Rodrigo, goza bem as luvas e conquista o teu sonho. Quando chegar o momento, vamos mesmo cobrar, porque precisamos de ti do teu exemplo para inspirar outros jovens!"
"Estranho combate, este, em que ao homem comum não é exigido mais do que cumprir uma completa inacção e observar o mais absoluto recato. Como se, afinal, fosse possível que indivíduos, famílias, comunidades ou países pudessem escapar, por milagre, à ameaça da inexorável pandemia... Da inconsciência inicial acerca da natureza e do poder maléfico do vírus que por toda a parte foi apanhado os países desprevenidos e impreparados, passar-se-ia a uma conjunção da incredulidade geral: a inaudita virulência progredia a uma velocidade tal, que, fosse onde fosse e fossem quais eles fossem, os recursos disponíveis cedo deixavam de parecer suficientes para conter ou retardar o pesadelo.
Agora, mais de um terço da humanidade se encontra em confinamento mais ou menos assumido; e, apesar disso, a peste continua a disseminar-se insidiosamente, afinal devastando de modo implacável todas as condições de vida, em todas as geografias.
Inseguros, frágeis e indefesos, alguns - os que continuavam entretidos com as pequenas incidências e competições do quotidiano - só demasiado tarde se dariam conta das fatais vulnerabilidade dos sistemas de defesa individuais e colectivos. Em todo o caso, em órgãos de Estado, como em entidades públicas em que o espírito comum já era forte, houve quem, aqui e ali, tendo sabido ler os sinais que chegavam do extremo oriente, pôde tomar a tempo algumas providências que um realismo prospectivo deles decorrente logo aconselhava. Os sólidos canais de relação que a pulsão universalista do Sport Lisboa e Benfica estabelecera com a grande nação chinesa durante a última década terão certamente sido contributivos para que a Direcção de Luís Filipe Vieira tivesse percepcionado a gravidade do cenário desde os primeiros dias de Março, antes de qualquer outro clube em Portugal, de modo a assumir um primeiro prudente conjunto de informações e medidas. Poucos dias depois, o Benfica anunciava uma segunda leva de resoluções mais abrangentes e firmes, cujo impacto se revelaria determinante além das fronteiras da Família Benfiquista, e terá ficado como um novo exemplo da vanguarda cívica que o Benfica sempre representou na sociedade portuguesa.
Fosse pela capacidade de mobilização dos recursos adequados, fosse pela determinação adoptada em todas as instâncias do Clube e do Grupo empresarial - e em especial na Fundação, como nas Casas do Benfica - ou, até mesmo, ao nível das próprias estruturas competitivas que naturalmente se mantêm em situação de confinamento, o conjunto de medidas adoptadas desencadeou e fortalece o mesmo solidário sentimento geral da responsabilidade social que os Benfiquistas sempre avocam nos momentos mais difíceis da nossa História contemporânea.
Carlos Moia, o responsável da Fundação Benfica, sintetizou de forma lapidar o contexto em que vivemos no Clube: 'O Benfica reagiu com força, músculo financeiro e dimensão. É admirável a grandeza deste Benfica que, perante a enormidade deste embate universal, mobiliza todas as suas energias e actua a uma só voz, directo, incisivo, grande!«
E se, nestes momentos, nos sentimos talvez verdadeiramente 'todos juntos' como nunca, porque, por enquanto, ainda é mais urgente estarmos todos no 'mesmo clube', já ninguém tem dúvidas de que, no dia de amanhã, sairemos deste pesadelo ainda mais fortalecidos, mais solidários e mais úteis. Ao Benfica. E à nossa Pátria."
""Espero que se encontrem bem, assim como as vossas famílias. Quero começar esta pequena intervenção com um agradecimento àqueles que estão hoje na linha da frente no combate à COVID-19. Temos alguns membros da estrutura profissional e também dos órgãos sociais envolvidos nesta batalha. Quero agradecer a todos aqueles que nos permitiram ter este regresso a casa em condições absolutamente excepcionais. Fomos dos primeiros a reagir, e reagimos com extraordinária eficácia, permitindo que, hoje, mais de 600 colaboradores estejam a trabalhar a partir de casa. Quero agradecer também àqueles que ao longo destas últimas semanas nos têm permitido continuar juntos, quer através das suas mensagens (de atletas, de membros dos órgãos sociais e de vários colaboradores), quer pela parte tecnológica, que tem permitido resolver vários problemas ao longo do tempo"
"Este é um momento difícil, nenhuma organização estava preparada para fazer face ao mesmo, mas é preciso dizer que o Benfica, através daquilo que tem sido uma política responsável, chegou bem preparado, conforme viram nos resultados que apresentámos no último semestre e ao longo dos últimos seis anos. Graças a essa preparação encaramos o futuro com uma confiança redobrada. O que não significa que não tenhamos de ter uma atitude responsável e de rever uma série de matérias, criando vários cenários, de curto e de médio prazo, a nível de investimentos, de retoma das competições e dos impactos económicos que vamos ter na época em curso e que poderemos eventualmente ainda vir a sofrer durante a época 2020/21"
"Preocupa-nos a situação de várias Casas do Benfica e dos nossos patrocinadores que estão a sofrer mais com esta situação. Ao longo destas semanas, e ainda nos últimos sete dias, o comité de operações do Benfica (a Comissão Executiva, o Conselho de Administração da SAD e a Direção) esteve reunido e está a pilotar a matéria,"
"A responsabilidade de cada um dos colaboradores do Benfica é garantir que, quando chegar o momento da retoma, seja apenas uma normal actividade. Mas quando chegar o 'boom' – porque este retomar de actividade pós-COVID vai ser muito forte –, é importante que o Benfica seja o clube que esteja melhor preparado para fazer face aos desafios nessa altura"
"Estou certo – tal como os órgãos sociais do Benfica e todos os Benfiquistas estão absolutamente convictos – de que a nossa estrutura profissional saberá dar uma resposta adequada ao futuro e que seremos o clube melhor preparado para aproveitar o relance das actividades. Peço-vos este empenho, estou certo de que poderei contar convosco, e os Benfiquistas também. Carrega, Benfica! Vão ficando em casa, em breve estaremos todos juntos""
Campeão Europeu de sub21 pela Espanha no Euro que decorreu em Itália e consagrou Fábian Ruiz como o melhor jogador da competição, Pedraza foi formado no Villarreal, onde rubricou uma temporada de nível elevado em 2018/2019. No presente encontra-se emprestado ao Real Betis, ele que também já actuou no Alavés e no Leeds United em tal condição.
Com condições para defender de forma mais competente que Grimaldo – Não apenas morfologicamente mas também nas abordagens em situações que requerem contenção, Pedraza não tem a destreza motora do actual lateral do Benfica (quem tem?), mas é também um jogador de forte pendor ofensivo, capaz de acelerar com espaço e incorporar-se ofensivamente explorando todo o corredor, funcionando como um extremo aquando da posse encarnada.
"Se Beckett fosse vivo, teria uma conta no Instagram e outra no Linkedin. Em vez de lives com o Markl ou o Quadros, o dramaturgo passaria grande parte do tempo a denunciar usurpações da sua mais célebre máxima, uma das que mais fez e continua a fazer pelo complexo industrial de auto-ajuda e palmadinhas nas próprias costas.
Para muitos, o encontro com esta ideia - falhar melhor - foi a epifania que permitiu justificar tudo o que correra mal até então. Faz tudo parte de um plano, nem que seja o PER. Foi assim que o mantra se celebrizou, sendo hoje uma espécie de alibi partilhado por indivíduos com menos de 30 anos e startups elegíveis para o Portugal 2020.
Uns tropeçaram em Beckett. Outros, como eu, descobriram a essência de se falhar melhor numa noite fria em Highbury Park. Diz-se que só uma pequeníssima percentagem das startups evitará o falhanço. Muitos dos seus fundadores tentarão várias vezes ao longo das suas vidas, e falharão sempre, ou quase sempre. A passagem de Isaías Marques Soares ao serviço do Benfica foi, à sua maneira, e vistas bem as coisas, uma ilustração muito mais bonita desta verdade.
Comecei a perceber isto com 10 anos de idade. Já vira o Benfica perder uma final da Taça dos Campeões Europeus e sabia que estava perante uma enormidade de clube, mas a verdade é que eu tinha quase tanta experiência em noites europeias como o Tomás Tavares. Talvez por isso não soubesse exactamente o que esperar daquela 2ª mão frente ao Arsenal, numa eliminatória da Taça dos Campeões Europeus.
Começou mal, com o Arsenal mais forte a adiantar-se, mas a partir daí foi a noite de Isaías, que os livros de história do Benfica se encarregaram de eternizar como o profeta. Nunca mais nos esquecemos dele, não apenas pela perfeição dessa noite em que bisou e arrumou a eliminatória, mas por tudo o que fez enquanto esteve no Benfica, e que me devolve sempre a essa noite. Eu não os contei, mas dizem que fez 178 jogos ao serviço do Benfica. Terei visto seguramente quase todos os jogos. Fez 71 golos e, arrisco dizer, dez vezes mais remates à baliza. Tornou-se um herói pessoal depois da eliminatória contra o Arsenal e posso dizer-vos que nunca mais hesitei em apoiar toda e qualquer tentativa sua de acertar na baliza adversária, por muito absurda que parecesse, e algumas pareceram. O verdadeiro empreendedor sabe que é assim que funciona. Um dia a bola entra e nunca mais esquecem o nosso nome.
Tudo desde sempre. Nunca outra coisa. Nunca ter tentado. Nunca ter falhado. Não importa. Tentar outra vez. Falhar outra vez. Falhar melhor.
Um remate de Isaías para as imediações do estádio era ele a aquecer. Um remate 3 metros por cima da trave era uma forma de nos dar as boas vindas, pedindo que nos sentássemos e desligássemos os telemóveis. Um remate à trave era provocação bem humorada, e o remate que acertasse em cheio na baliza era golo. Guardem lá o vosso fact-checking que eu não quero saber. Por cada máxima de auto-ajuda, há uma multidão pronta a celebrar a sua mais que provável falibilidade. Eu nunca duvidei, Profeta, desde aquela noite em Highbury. E, se por acaso leres isto, ficas a saber. Talvez tenha chegado aos 71 golos na minha incursão sofrível pelo futebol amador, mas só porque aprendi a falhar melhor. Não é romantismo. É mesmo verdade. Não houve um remate desde então que não fosse inspirado por ti. O meu filho de 3 anos só sabe rematar. Não interessa em que direcção chuta, é o que digo sempre. Chuta com força e o resto há-de vir. Para a bancada, ou em cheio na baliza."
"Em entrevista ao Canal 11, o médio português do Lille abordou a transferência para o Bayern de Munique, confessa que ainda fala com Pizzi, garante ter evoluído como jogador e revela ter aprendido uma lição
Ninguém Quer Saber
"A minha mensagem para os jovens é que sigam os vossos sonhos e estejam perto da família. Muitas pessoas é que metem coisas na cabeça dos jogadores. Tens dinheiro e aproximam-se de ti, o que é normal. Tens de te apoiar na tua família e nos verdadeiros amigos. Quando estive mal, ninguém do futebol me quis ajudar, foram os meus amigos e a minha família".
Os Números
"Os números não pesam. Fui a contratação mais cara do Bayern e Lille e nunca pensava nisso. As pessoas e Comunicação Social é que tornam isso um peso. Ver as pessoas a falar mal de ti pesa mais".
Pizzi
"Continuo a falar com ele. É um médio que faz muitos golos e penso que consigo fazer isso. Pode ser que um dia façamos uma aposta em relação a golos numa época."
O Lille
"Estou confiante porque tenho jogado e atravesso uma boa fase. Acho que quando qualquer pessoa tem oportunidades para jogar e fazer o que gosta, vai sempre corresponder da melhor maneira. Preparei-me bem para mostrar valor quando chegasse a oportunidade e quero fazer ainda melhor no clube", sublinhou o internacional português, que chegou à Ligue 1 proveniente do Bayern.
A Evolução
"Sinto que sou um jogador mais completo. Com bola estou mais calmo, falho menos passes, posiciono-me melhor e isso faz parte da maturidade. Se ficasse preso no que me aconteceu há um ou dois anos, não avançava. Temos de aprender com o que correu mal. No Bayern, achava que ia conseguir jogar como no Benfica, mas o ritmo era completamente diferente. Se tivesse ficado mais um ano no Benfica, talvez não teria feito mal, mas acho que estava preparado. Dizem que fui para o Bayern por dinheiro, mas não! Vinha de uma boa época"."
"São centenas de milhões que contribuem para um regabofe de transferências, comissões, luxos asiáticos e, afinal, não são tidos nem achados para nada. Só pagam em troco de uma louca paixão e não bufam
O futebol, tal como todos os outros sectores de actividade, não estava preparado para um vírus destruidor. Mas é penoso assistir a colossos, pujantes marcas de reconhecimento universal, emblemas que arrecadam somos astronómicas em direitos televisivos, publicidade e merchandising, a cortarem despesas nos salários dos astros que encantam as bancadas. Afinal, solidez e poupança são palavras que não constam dos manuais de gestão para aquelas bandas. Não deixa de ser sinistro confirmar que o desporto-rei vive numa falsa redoma, num mundo artificial de estrelas, milhões, destinos exóticos no Instagram quando os seus dirigentes governam na realidade da penúria, sobrevivendo com receitas extraordinárias no meio de folhas de Excel completamente calamitosas.
E depois não podemos esquecer os jogadores. Porque muitos não se recordam que o descrito no parágrafo anterior é atingido apenas por uma nata. A grande realidade é que 90 por centro dos jovens que sonham ser felizes dando uns pontapés na bola, nunca chegam a assinar um contrato de profissional e nas divisões secundárias os salários são pequenos para um carreia curta e o cumprimento dos clubes com as suas obrigações é sempre no fio da navalha. Logo, o sonho torna-se uma ilusão ou um logro. Importante, assim, a intervenção da FPF com 5 milhões da sua tesouraria para o apoio do Campeonato de Portugal e salvação dessas equipas, jogadores e técnicos que enfrentam uma situação duríssima, tal como o nosso país real.
Porém, numa altura em que alguns clubes retornam timidamente ao trabalho, se tenta calendarizar um quadro competitivo para que as Ligas internas e competições europeias terminem, se ouvem associações do sector, parceiros (e Altice e NOS deviam, pelo seu peso no negócio, ter sido ouvidos no imediato), doutores fala-barato e alguns embusteiros, é estranho como ninguém se interroga como pensará o eixo essencial desta actividade, o que dá audiências, compra bilhetes e camisolas e tem saudades de ver um jogo do seu desporto preferido, até para matar o cansaço com o confinamento. Os adeptos não contam? O que pensam eles destes cenários diversos? Acaba-se o campeonato? Não há títulos nem despromoções? Prolonga-se a temporada pelo ano civil? Que estranho, são centenas de milhões de adeptos em todos os cantos do Mundo, que contribuem para um regabofe de transferências, comissões de intermediação, luxos asiáticos e, afinal, não são tidos nem achados para nada. Só pagam em troco de uma louca paixão e não bufam.
"Os pitões das chuteiras a bater no chão. O clima de tensão à porta do túnel. O barulho da bola a rolar na relva. O grito desconcertante dos adeptos apaixonados. O abraço apertado dos companheiros de bancada. A cerveja e o panado ao intervalo. A apreensão da segunda parte. O nervosismo da compensação. As unhas no chão. A euforia da vitória. O desalento da derrota. A viagem em passo acelerado para o carro (normalmente mal estacionado). A emissora da rádio a transmitir as conferências de imprensa. Aquela francesinha pós-jogo como cereja no topo do bolo. Bem, tudo isto está suspenso. Dá para acreditar?
Ainda assim, tudo aquilo que vale realmente a pena fica guardado na nossa memória. E no nosso coração. Para sempre. Por isso, resta-nos a nostalgia da recordação para alimentar um amor verdadeiro e único pelo desporto e pelo futebol. Porque acredite, é isso que a verdadeira magia do desporto faz. Atinge-nos com tamanha emoção e intensidade que não permite que o tempo atropele toda aquela sensação de arrepio na espinha. Já faltou mais. E vai correr tudo bem.
Em forma de contraste, surge-nos a história ingrata do Liverpool. A formação orientada por Jürgen Klopp não vence a Premier League desde 1989/90. Doloroso, não? Ainda mais se pensarmos que, recentemente, esse troféu esteve muito perto, mas acabou por cair aos pés da escorregadela do eterno capitão Steven Gerrard. Ainda mais doloroso? Talvez. E, na presente temporada, os “reds” lideram a prova com 82 pontos, mais 25 (!) do que o Manchester City, segundo classificado, que tem um jogo a menos. E faltam apenas nove jornadas para o final do Campeonato. No entretanto, uma pandemia instala-se no mundo e ordena que toda a esfera do futebol fique estagnada. Surreal.
Todavia, o que é isto de um troféu há muito desejado comparado com o mais importante e valioso de todos: a vida? O avançado senegalês Sadio Mané explica da melhor maneira possível: “É um sonho que eu tenho. E espero vencer a Premier League ainda este ano. Mas se não acontecer eu tenho que aceitar. Faz parte da vida. Tentaremos vencer no próximo ano. Claro que é uma situação difícil para o Liverpool, mas também para milhões de pessoas em todo o mundo. Muitas pessoas morreram ou perderam familiares. E esse é o pior cenário de todos”.
"Há 25 anos, Paul Gascoigne voltava aos relvados após uma paragem de 12 meses, culpa de uma lesão num lance fortuito com o então adolescente Alessandro Nesta durante um treino da Lazio. Seria o princípio do fim de uma aventura cheia de peripécias do britânico em Itália, da qual ficaram muito mais histórias para contar do que exactamente títulos
Era um simples treino da Lazio, daqueles aos quais Paul Gascoigne a custo se tinha habituado. Itália, naqueles tempos, não era Inglaterra. A Premier League ainda dava os primeiros passos quando na Serie A já se faziam treinos específicos, já se escrutinava o que os jogadores comiam, bebiam, o físico trabalhava-se tanto quanto a bola. Gascoigne sentiu a mudança.
Alessandro Nesta era então apenas um garoto de 16 anos que saltitava entre a equipa de juniores e os treinos com os grandes, porque Dino Zoff já via ali aquilo em que o central se tornaria anos depois - a saber, campeão de Itália, campeão mundial, vencedor da Liga dos Campeões, um dos centrais mais elegantes do jogo. Gascoigne, talvez para colocar o miúdo em sentido, não lhe deu tréguas naquele treino. Uma, duas entradas, nada de grave, uma pequena praxe. Mas entretanto algo corre muito mal: o britânico tenta roubar a bola a Nesta, vai com demasiada força e o choque entre ambos acaba com Gascoigne em lágrimas, agarrado à perna direita, estilhaçada em dois sítios. E com Nesta a chorar inconsolável, julgando-se culpado daquele infortúnio.
Estávamos em Abril de 1994 e a vida de Paul Gascoigne em Itália já tinha peripécias para vários livros. Mas aquela perna partida era o início do fim, apesar do médio só ter deixado a Lazio quase um ano e meio depois.
Mas já lá vamos.
Paul Gascoigne, talento acima da média para aquilo que as ilhas britânicas estavam habituadas, mas um louco empedernido, era uma das figuras da First Division - a Premier League era ainda apenas uma ideia - quando Itália o chamou. Havia gente disposta a gastar muito dinheiro na península, empresários cansados dos seus negócios lucrativos mas aborrecidos. No Mundial de 1990, em Itália, precisamente, Gascoigne tinha brilhado naquela Inglaterra que chegou às meias-finais. Os italianos gostavam do talento, mas também da malandrice, do carisma e na época seguinte a Lazio acenou com um cheque de 8 milhões de libras a um Tottenham que por esses dias lutava para tirar a corda da garganta às suas contas. E Gascoigne era um dos mais excitantes jogadores daquela geração.
Já de malas feitas para Roma, Gascoigne lesionou-se gravemente num joelho na final da Taça de Inglaterra de 1991. O acordo desmoronou-se. A hipótese de Gascoigne se tornar num dos melhores jogadores do Mundo, como muitos vaticinavam, também. O britânico esteve um ano inteiro sem jogar e ainda fez o favor de atrasar a recuperação quando em finais de 1991 se envolveu numa cena de pancadaria numa discoteca no norte de Inglaterra, o seu norte de Inglaterra, onde cresceu pobre, com um pai doente uma mãe alcoólica.
Ainda assim, a Lazio acreditou. Em 1992, Gascoigne seguiu mesmo para o Olímpico de Roma. Com o prémio de assinatura comprou casas para os pais e para as irmãs - Gascoigne era e é louco, mas sempre foi generoso. Estreou-se a 27 de Setembro na Serie A, frente ao Génova.
Mas até para os latinos, Gazza, alcunha cunhada nos tempos de júnior no Newcastle, era demasiado. Na sua biografia "Gazza: My Story", o médio revela que a relação com as altas patentes da Lazio começou logo com o pé esquerdo, depois de fazer um comentário inapropriado sobre o tamanho dos seios da filha de Sergio Cragnotti, então presidente do clube. Ao próprio Cragnotti.
Já Dino Zoff, treinador, tolerava as suas maluquices, mas não a sua propensão para engordar, a forma física inconstante e as lesões que, consequentemente, apareciam. Ainda assim o britânico era um dos preferidos dos adeptos, que lhe respeitavam o carisma e a cara de pau, e até dos colegas, que elogiavam o coração mole e a capacidade de fazer os outros rir com as suas constantes partidas - chegou a colocar uma cobra morta dentro do casaco de Roberto Di Mateo. Mas o talento de Gascoigne só apareceu a espaços na Lazio.
E para história da pouco dolce vita de Gascoigne em Roma ficam mais as anedotas dos que os títulos. A 24 de janeiro de 1993, depois de Dino Zoff o deixar de fora da convocatória para o jogo frente à Juventus por não estar em condições físicas mínimas, vários jornalistas esperaram no final do jogo por uma explicação a viva voz de Gascoigne. Por essa altura, os jogadores da Lazio estavam em blackout e o britânico era alvo constante da imprensa, ora crítica ora apreciadora dos seus empreendimentos dentro e fora de campo. E quando lhe meteram um microfone à frente, Gascoigne respondeu com um sonoro arroto para o microfone da RAI. Os adeptos adoraram, Sergio Cragnotti, pouco habituado a gafes deste calibre até entre os jogadores de futebol mais mal-comportados, menos. Seguiu uma multa milionária, mas Gascoigne não perderia um pinga de rebeldia.
No início da temporada seguinte, apareceu em Roma, após um verão passado em Miami, com 89 quilos, para fúria de Dino Zoff. Para não perder o lugar na equipa, e tal como conta na sua biografia, perdeu 13 quilos e ganhou de novo a confiança do treinador, que chegou mesmo a entregar-lhe a braçadeira de capitão. Mas depois chegou abril e aquele treino, o lance com Nesta e aquela dupla fratura na perna direita.
Alessandro Nesta contaria, anos depois, que Gascoigne fez questão de o tranquilizar e assegurar que a culpa daquela terrível lesão tinha sido inteiramente sua e da sua imprudência no lance. E que para provar que não havia ressentimentos lhe ofereceu cinco pares de chuteiras e um kit de pesca. Gascoigne terá também ele próprio acalmado as claques da Lazio, que nas semanas seguintes ao incidente ameaçaram e assobiaram o jovem Nesta incessantemente. Generosidade, já lá diziam os colegas.
Foram 12 longos meses de recuperação até ao regresso aos relvados, a 9 de Abril de 1995, na vitória da Lazio frente à Reggiana por 2-0. Mas aquela Lazio já era outra Lazio: Zoff tinha saído, Zdenek Zeman era o novo treinador e o estilo físico do técnico não encaixava em Gazza.
No final da época sairia para o Rangers, onde teria uma espécie de renascimento: ajudou os protestantes de Glasgow a ganhar dois campeonatos em três épocas, antes de regressar a Inglaterra para jogar no Middlesbrough e Everton. Nessa já amarga fase final da carreira, os problemas com o álcool tornaram-se demasiado visíveis. As entradas e saídas de clínicas de desintoxicação sucediam-se, uma das quais depois de cair redondo no chão inconsciente, depois de ter bebido 32 shots de whisky.
E daí veio a decadência e as depressões. Hoje, aos 52 anos, ficamos sempre à espera da próxima notícia sobre Gascoigne e tememos ser a última. E praticamente já nos esquecemos que ele, no seu tempo, foi o mais talentoso jogador inglês da sua geração."
"O mundo estava parado para ver o "fenómeno", que tinha perdido a final do Mundial de 1998, na sua segunda época no campeonato mais duro do mundo naquela época. Ronaldo lesionou-se em Janeiro e regressou para jogar uma parte do dérbi de Milão em Março. Em Abril já estava na máxima força e tendo em conta que a época do Inter estava longe de ser brilhante (8º lugar), e que a Roma disputava o acesso à pré-eliminatória da Liga dos Campeões, no Inter, todos os ingredientes gritavam pelo "fenómeno".
Naquele momento, era o jogador mais desequilibrador da equipa e a referência para quem todos olhavam quando se pensava na possibilidade de a equipa romana ser derrotada em casa pela primeira vez. Apesar disso, eu estava vidrado no Roberto Baggio. Com 32 anos, terminava a primeira de duas épocas no Inter, as duas últimas em que o vimos jogar com a pressão e o peso de lutar pelos primeiros lugares.
Quem viu o génio italiano com a camisola da Fiorentina, da Juventus e até do AC Milan, encontra aqui um jogador diferente. Antes jogava com a maior capacidade física que tinha e mais perto da baliza, numa abrangência de espaço distinta. Aliás, as melhores jogadas que estão por aí em compilações do YouTube são lances de desequilíbrio puro em drible, em condução, em aceleração com a bola no pé. Ele aparecia, fundamentalmente, no último terço para ser ele a finalizar ou em lances de envolvimento próximos do golo. Também tinha qualidade na execução das bolas paradas. Eu adorava os dribles, a elegância como que gingava, a forma limpa como procurava finalizar e, sim, também a qualidade para definir os lances. Gostava dele pelo que fazia a correr, pelo que fazia sozinho. Brilhou nesse estilo como poucos, ganhou campeonatos, taças, provas europeias, bolas de ouro e foi o melhor do mundo para a FIFA.
Apito inicial…
As primeiras acções com bola não foram exuberantes; guardou a bola e esperou que a equipa se reorganizasse, uma tabela mal executada com Colonese, e um alívio. Mas não foi preciso esperar muito para sentir o impacto de Baggio no jogo. Aos 5 minutos, Simeone recebe de Cauet no meio campo. Nessa altura, o criativo italiano estava numa posição mais avançada, entre linhas, e pedia a bola observando o espaço nas suas costas, próximo da linha defensiva da romana. Simeone opta por abrir para Zanetti, e é este que encontra Baggio de costas para a baliza. Fazendo-se valer da leitura do espaço nas suas costas, orienta para onde vai ter mais opções e assiste Ronaldo.
Repare que o avançado brasileiro estava numa posição mais recuada, apesar da linha defensiva da Roma estar alta, e só depois de Baggio ter orientado a recepção naquela direcção é que ele começa a cavalgada em direcção ao golo. Com uma recepção para onde havia mais e melhores soluções, e apesar de pressionado por Aldair, o italiano conseguiu indicar a Ronaldo o que deveria fazer, e executar de forma brilhante o que imaginou com o pé que não era o mais forte.
Entre muitos pormenores de classe na primeira parte, fica na retina a assistência para o segundo golo, quando espera por uma solução de passe melhor, ao invés de despejar a bola de qualquer forma para a molhada. O Inter vai para o descanso a vencer por 3-1, e Roy Hodgson (o quarto treinador da época) satisfeito com o resultado.
Cinco minutos depois do recomeço, a Roma faz dois golos e a incerteza volta ao marcador. Os romanos tornam-se mais pujantes, mais agressivos, mais focados no jogo, e com isso Baggio sofre durante alguns minutos.
Ainda assim, no quarto golo do Inter, segundo do "fenómeno", num contra-ataque que surge no seguimento de um lance de bola parada defensiva, o recém-convertido médio ofensivo aproveita ausência de Aldair (que estava ainda perto da área do Inter a recuperar) e um mau corte de Quadrini para de primeira colocar em Zamorano que depois assiste Ronaldo. Com a equipa em vantagem, regressa o dono do jogo, que o gere da forma que lhe interessa; passa, mostra-se para a devolução, acelera, trava, guarda, roda, varia.
Mas é depois do empate da Roma, o 4-4, que acontece o momento alto do jogo. Ao minuto 83’, Baggio tinha acabado de perder a bola depois de uma decisão estúpida de a picar num lance em que nada o justificava, naquela que para mim foi a sua pior ação no jogo. Simeone recupera e lateraliza para Zanetti, este atrasa para Simic. A Roma sobe para pressionar quando o central croata entrega para o criativo italiano, que solta de primeira para Zanetti. Depois de entregar a bola, o criativo percebe o espaço que ficou livre e é aí que começa a desenhar a jogada na sua cabeça: ataca esse espaço, recebe a devolução do lateral argentino, e começa a marchar em direção à última linha dos romanos; olha para a desmarcação do Ronaldo mas entende que não é ainda aquele o momento de lhe colocar a bola, uma vez que não tem as condições ideais; usa Djorkaeff, que tinha entrado minutos antes e estava em apoio frontal, para eliminar o médio que o vinha pressionar, e ganha o tempo e o espaço que queria para definir o lance sem pressão nas suas costas; em dois toques deixa pronto para Ronaldo finalizar de forma fantástica. Com uma tabela ultrapassa três opositores, com outra livra-se da pressão que recebia nas suas costas. Extraordinário!
O lance foi invalidado por fora de jogo, mas é o momento mais alto da criatividade de um jogador possibilitada pela colaboração dos colegas. Foi tudo em passe, mas só o foi, e Baggio só teve a possibilidade de fazer o que fez, porque os colegas lhe deram aquelas opções de passe e não outras quaisquer. O lance só teve qualidade porque os colegas colaboraram com as suas intenções, e por melhor que ele fosse só poderia ter sucesso com este tipo de colaboração.
(Podem ver todos os toques dele na bola, no vídeo seguinte.)
Depois deste jogo, o meu conceito mudou e passei a admirar a forma como ele, a andar, fazia o que a maioria não conseguia a correr. Foi aqui que percebi que a forma mais eficaz de comunicação num jogo de futebol é o passe, foi aqui que comecei a pensar que a melhor finta era um passe.
Não deixei de perceber que o drible é uma qualidade rara, e que jogadores que consigam tirar um adversário do caminho são também eles especiais. Veja-se Marlos no Shakhtar Donetsk - a forma como desmonta a primeira barreira e a partir daí aproveita o ajuste que o adversário tem de fazer para desequilibrar o adversário. Olhe-se para Sancho no Dortmund, num estilo completamente diferente de Marlos, mais físico, mas com uma capacidade incrível para passar no um contra um, e até um contra dois. Em português há Trincão no Braga – absolutamente desconcertante para quem o defende. Há Neymar, em Paris, a gozar férias do nível de futebol que o jogo dele pede, mas que continua a ser o número um a destruir defesas no “mano a mano”. E há Messi, claro - o número um de sempre em tudo o que é ofensivo.
Porém, Baggio, neste jogo, mostrou-me o que viria a ser Iniesta no futuro. E não é coincidência que Iniesta seja o meu médio preferido de todos os que vi jogar. Elegante, com grande capacidade para desequilibrar, com uma criatividade fora do normal, e com o gesto técnico mais delicioso que vi nos últimos largos anos – não fazia uso da força como a sua principal arma, e jogava para fazer com que os outros fossem melhores.
Foi nisto que Baggio se transformou na última fase da sua carreira. Davam-lhe a bola para que ele fizesse dos colegas melhores, para que ele fizesse aparecer os miúdos cheios de energia, para permitir que fossem outros a finalizar o que ele criava. Num estilo de jogo como o do Inter, que jogava para o contra-ataque, ele ter tido a capacidade para dar mais posse de bola à equipa, para gerir os momentos de acelerar e travar, para conter muitas vezes os ímpetos dos colegas, é uma lição que ficará comigo para sempre.
Queremos hoje jogadores que joguem o que o jogo dá; mas eu continuo apaixonado por quem vai contra o contexto de jogo e tente criar condições para que ele e a equipa saiam beneficiados e estejam mais próximos do sucesso.
É verdade que este jogo aconteceu no final da época, e que estas novas funções como organizador e criador de jogo já lhe haviam sido atribuídas numa fase inicial. Já se havia visto que pisava terrenos diferentes, e que jogava um futebol mais de serviço e menos de finalização - tinha deixado de ser avançado para passar a ser médio. Este jogo, porém, foi o ponto mais alto de uma adaptação que demorou, mas que resultou num dos jogos mais proveitosos da história do meu ídolo.
O Roberto Baggio do início da sua carreira jogaria hoje de caras em qualquer equipa do mundo; o do final, o deste jogo, em muito poucas. Ele não corria por não ter o vigor físico, e ainda queria estar em ritmo de passeio em todo o campo a pisar os espaços que lhe apeteciam. Não era intenso nas capacidades físicas, nas disputas, nos duelos. Não mordia defensivamente para desarmar, nem recuperava rapidamente a posição. Por tudo isto, é muito difícil imaginar que tivesse lugar num meio-campo das equipas actuais, ainda que quando a bola lhe chegasse aos pés metesse toda os outros a jogar.
Emocionei-me como poucas vezes e chorei quando o Baggio falhou aquele penálti na final do Campeonato do Mundo em 1994, mas são as sensações deste jogo no Olímpico de Roma que marcam um ponto de viragem fundamental na minha forma de olhar para o futebol.
Roma: Michael Konsel. Antônio Carlos, Aldair, Vicent Candela, Marco Quadrini, Luigi Di Biagio, Dmitri Alenitchev, Totti, Eusébio Di Francesco, Marco Delvecchio, Paulo Sérgio.
Treinador: Zdenek Zeman
Inter de Milão: Pagliuca. Javier Zanetti, Dario Simic, Giuseppe Bergomi, Mikael Silvestre, Francesco Colonese, Diego Simeone, Benoit Cauet, Roberto Baggio, Ivan Zamorano, Ronaldo.
"O tema que vos trago não é novidade, nem tão pouco interessante para todos aqueles que na próxima semana iriam entrar na contagem decrescente dos 100 dias para os Jogos Olímpicos Tóquio 2020.
Atletas, Treinadores, Federações e Comités Olímpicos de todo o mundo, que tanto investiram nesta preparação olímpica, vêem agora adiado por um ano a sua participação nos Jogos.
A situação em que o mundo se encontra, o estado pandémico que está a forjar a nossa história, faz-me recordar uma passagem dos Lusíadas em que Luís Vaz de Camões refere que um fraco Rei faz fraca a forte gente.
A liderança do Movimento Olímpico tardou em anunciar este adiamento e com isso enfraqueceu todos aqueles que norteiam a sua vida pelos valores que o desporto e o olimpismo celebram.
Nem que por momentos, todos aqueles que fazem parte desta família olímpica temeram pela sua segurança, uma segurança diferente daquela que levou ao cancelamento de três edições dos Jogos (Tóquio esteve envolvido numa delas), mas uma segurança para a qual o mundo não tem ainda uma resposta.
Em Janeiro de 2020, aquando daquela que julgávamos ser a última visita técnica a Tóquio, tivemos a oportunidade de visitar o Museu Olímpico do Comité Olímpico Japonês. A forma atroz como a edição de 1940 é remetida para um canto não traduz a dimensão de uns Jogos, nem tão pouco a importância que os acontecimentos à escala global impactam na organização do maior evento desportivo.
Em 1938, por ocasião da Segunda Guerra Sino-Japonesa, Tóquio devolveu a atribuição dos Jogos ao Comité Olímpico Internacional. Por sua vez, entregues a Helsínquia, os Jogos viriam a ser cancelados devido à II Guerra Mundial.
Mas a decisão desta vez foi diferente. O Comité Olímpico Internacional optou não por cancelar, mas sim por adiar os Jogos, abrindo dessa forma um novo capítulo na história olímpica.
Vários números contribuíram para esta decisão:
- Aproximadamente 70% dos Atletas só participa numa edição dos Jogos;
- 57% dos cerca de 11.000 Atletas que irão participar nestes Jogos já tinham garantido a qualificação;
- A organização do calendário desportivo internacional, nomeadamente das 33 Federações Internacionais, tem como referência a celebração dos Jogos Olímpicos;
- Desde a candidatura até à organização de uns Jogos decorrem 10 anos de investimento e de trabalho na cidade que os acolhe;
- Mais de 200.000 pessoas iriam ser acreditadas para que a realização dos Jogos fosse uma realidade;
· Em Tóquio foi construída uma Aldeia com 18.000 camas;
- Foram construídas/contratadas 43 instalações desportivas, para além de todos os espaços de apoio à organização dos Jogos;
- Foram contratados todos os serviços de apoio a Atletas e Treinadores para o período dos Jogos que vão desde o catering (3.000.000 de refeições só na Aldeia Olímpica), aos transportes (2.000 autocarros), ao alojamento (46.000 quartos de hotel bloqueados)…
- O evento seria divulgado por mais de 25.000 jornalistas, repórteres de imagens e outros representantes de meios de comunicação social;
- O cumprimento dos contratos com os 14 Worldwide Partners do Comité Olímpico Internacional e dos 67 parceiros locais que tornam possível a organização dos Jogos;
- Os milhões de espectadores que adquiriram bilhetes para as 750 sessões desportivas destes Jogos.
Por tudo isto, Tóquio 2020 irá manter-se, agora em 2021, e esta era a única solução possível.
Os tempos não são fáceis e talvez nunca tenha feito tanto sentido avaliarmos, no contexto desportivo, o efeito borboleta de Edward Lorenz como parte da teoria do caos. Neste caminho longo, árduo e de muito trabalho que é a preparação olímpica, vamos assumir que o adiamento abriu a possibilidade de reflectirmos, identificarmos as oportunidades e definirmos as estratégias para melhorar aquilo que fizemos no último ano, mas sempre, sempre em segurança.