quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

O triplo no início, o rame-rame depois


"O Benfica começou bem, muito bem até, no jogo com o Portimonense, para rapidamente cometer os mesmos erros, falhar nos mesmos momentos, mostrar as mesmas dificuldades que em jogos anteriores. A vitória por 2-1 acontece graças a 25 minutos frenéticos, mas os encarnados acabaram o último jogo de 2020 a sofrer

palavras que nos irão perseguir para sempre, frases que nos assombram porque o futuro é tramado, ninguém o conhece e a maior parte das vezes andamos aqui somente a arriscar. Para a generalidade da população, a um par de dias do fim deste ano, a frase que mais atormenta será algo deixado há precisamente 12 meses nas caixas de mensagens de amigos, nos encontros fortuitos na rua, aquele “2020 vai ser bom”, ou um “Que 2020 seja melhor que 2019”, “Ano novo, vida nova” e sucedâneos.
Hoje sabemos que os nossos desejos sairam todos ao lado.
Mas para lá dessas palavras, que há um ano nos pareciam inócuas, de circunstância, e que agora tememos, Jorge Jesus entrará em 2021 com outra frase persecutória, aquele “vamos arrasar, vamos jogar o triplo” que lançou do alto de toda a sua conhecida confiança no dia em que foi apresentado no regresso ao Benfica. Ela está aí para o assombrar em todo o seu esplendor e o jogo com o Portimonense, o último do ano, foi uma espécie de chamada de atenção para que não se festeje antes do tempo.
Porque o Benfica começou o jogo a, de facto, jogar o triplo. Sou de humanidades e por isso não grande coisa a matemática e por isso não sei se esta multiplicação será factual, mas falando de forma mais ou menos simbólica, sim, o Benfica teve 25 minutos de bom futebol, de ataque vertiginoso, que deram dois golos e mais uns quantos momentos que poderiam fazer crer que a profecia de Jesus estaria finalmente a confirmar-se.
Darwin marcou o primeiro, numa grande jogada de, como se diz agora, “futebol associativo”, que começou numa recuperação de Weigl, passou por Taarabt, depois por uma combinação entre Waldschmidt e Rafa e terminou com o uruguaio a encostar a bola para a baliza. Bonito.
Não menos bonita, ainda que com um final um pouco mais atrapalhado, a jogada do 2-0, aos 23’, uma boa combinação de Darwin com Rafa, com o internacional português a aproveitar a incapacidade de matar o lance dos centrais do Portimonense que, por essa hora, ainda parecia algures longe, talvez no Algarve.
E aqui estávamos, aos 25 minutos de jogo, com o Benfica a jogar bem e a marcar, parecia estar-se a construir um início de noite tranquilo para a equipa da casa. Só que com o 2-0 o Portimonense reagiu, apareceu, reorganizou-se e quase automaticamente o Benfica começou a sentir dificuldades na construção, a encadear a mais simples jogada de ataque.
Essa incapacidade seria transposta para a 2.ª parte, em que o nível de jogo caiu para nível correspondente ao frio dos últimos dias, mas sempre com o Portimonense com mais bola - aliás, acabaria o jogo com 55% de posse. No Estádio da Luz. Hum.
Com muitas dificuldades de pressão a meio-campo, o Benfica limitou-se praticamente a tentar o contra-ataque na 2.ª parte, sempre com muito pouco critério e com Darwin não poucas vezes completamente sozinho lá à frente. E como já tem sido hábito esta temporada, a qualidade do Benfica, que existe, como se viu na 1.ª parte, foi aparecendo apenas momentaneamente, como aos 56’, quando Waldschmidt encontrou Darwin na pequena área, com o uruguaio, com todo o espaço, a rematar ao poste.
Mesmo que bastante melhor no jogo, ao Portimonense faltavam as oportunidades de golo. Luquinhas esteve perto, aos 71’, mas foi só já nos descontos que Beto reduziu, de cabeça, após mais uma perda de bola a meio-campo do Benfica. Já não foram a tempo os algarvios, porque se têm marcado antes o Benfica iria sofrer para aguentar a vitória.
Seguramente que quando falou em jogar o triplo, Jorge Jesus não estaria a pensar em jogar o triplo apenas durante 25 minutos, para depois se ver o rame-rame habitual. 2020 provou-nos que devemos ter cuidado com o que desejamos."

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