"A História não está do lado do SL Benfica. Quando entrar em campo esta quinta-feira, para virar o resultado de Kharkiv contra o FK Shakhtar, os encarnados terão o peso das suas experiências anteriores a contrabalançar o que se espera ser uma noite boa para a equipa.
Das 36 vezes que o Benfica entrou a perder nas eliminatórias europeias, apenas em 11 conseguiu virar o resultado e avançar para a próxima fase. Uma clara demonstração de que o clube se sentirá sempre mais confortável a gerir o resultado e não em busca dele, mas nem sempre as condições se reúnem para que tal aconteça e a má fase da equipa impossibilitou tais circunstâncias.
Conseguirão os comandados de Bruno Lage inverter o próprio legado do clube e avançar na Liga Europa? Como fonte de inspiração, ficam aqui as maiores reviravoltas europeias, por ordem cronológica.
1.
SL Benfica 3-1 Fenerbahçe SK (agregado 3-2) – Ocupado entre Campeonato, Taça e Europa, aquele trágico Benfica de Jesus tinha que gerir os momentos e o plantel.
Loucura ou necessidade, o jogo em Instambul é jogado com muitas das segundas linhas e a ideia era clara: aguentar resultado curto para resolver na Luz, com a artilharia em peso. Mas em épocas de luxo, as segundas linhas acabariam por ser André Gomes e Aimar, que comanda a equipa a exibição confortável e o 1-0 para os turcos é aceitável.
Tal como planeado, na Luz a equipa é apoiada por 65 mil gloriosos benfiquistas que transformaram aquela noite num dos melhores ambientes da nova Luz, a par do jogo com o United em 2005. Gaitán e Cardozo fizeram o resultado e o paraguaio, como homem do jogo, inscreveu ainda mais o seu nome na história do Benfica.
2.
SL Benfica 1-0 Olympique Marseille (2-2 agregado) – Diz quem viu que a partida no Velódrome em 1989/1990 foi dos maiores amassos que o Benfica levou – aliás, o 2-1 final foi uma benção divina, tal não foi o desnível entre as equipas.
Havia Mozer, Deschamps, Francescoli, Waddle e Jean Pierre Papin nos campeões gauleses, pelo que foi natural a ideia de Eriksson em aguentar na primeira mão e dar o assalto na segunda. Com 120 mil nas bancadas, o ambiente ensurdecedor levou a equipa para a frente e ofuscou a constelação de Marselha, que atónitos ficaram com a forma como o Benfica se agigantou e virou a eliminatória.
A mão de Vata já no final do jogo mais não foi que uma lição adiantada de karma: em 1993, surgiria o escândalo da corrupção e o clube cairia na Ligue 2. Bernard Tapie, o presidente, foi forçado a demitir-se e condenado à prisão. O Benfica avançaria até à final do Prater, perdendo frente ao AC Milan de Sacchi (0-1).
3.
SL Benfica 5-1 Feyenoord Rotterdam (5-2 agregado) – Num período de domínio holandês na Europa, com Ajax e Feyenoord a dividirem louros nas conquistas, começava-se a discernir o legado que a escola holandesa iria dar ao mundo da bola.
O Benfica de Jimmy Hagan de 1971/1972 era uma equipa prodigiosa, com plantel sem igual (Néné, Jordão, Jaime Graça, Simões, Artur Jorge, Eusébio, Toni…), mas sucumbe na Banheira de Roterdão perante a técnica dos comandados por Ernst Happel. O lendário treinador austríaco insinua no final do primeiro jogo que os encarnados não se aguentariam na Eredivisie: sobranceria a potes e a motivação benfiquista em ebulição.
Na Luz, as palavras proferidas foram certamente engolidas por uma avalanche de futebol ofensivo, que atinge o auge quando Van Hanegem tem a triste ideia de reduzir aos 75’. Como resposta à audácia do ingénuo craque holandês, Néné por duas vezes e Jordão construiram a goleada na melhor versão dos “15 minutos à Benfica”.
4.
SL Benfica 3-0 Celtic FC (3-3 agregado) – Não se trata de uma completa remontada, mas o misticismo à volta do episódio de 1969/1970 justifica a inclusão. O Celtic de Jock Stein era uma potência das ilhas britânicas e tinha ganho a TCCE três anos antes, no Jamor – a epopeia dos Lisbon Lions é a primeira saga de sucesso britânico na Europa –e apanhá-los, naqueles aúreos anos e logo à segunda eliminatória era tarefa ingrata para o Benfica de Otto Glória. Ousou-se falar em final antecipada, ideia que os jogos confirmaram.
Primeiro, os encarnados afundam num Celtic Park vibrante da mais pura loucura escocesa; duas semanas passadas, a Luz engalanava-se para operar a reviravolta. O 3-0 chegou aos 90’, por intermédio de Diamantino Costa, já o nervosismo se tinha transformado em desespero nas bancadas. Prolongamento e… nada. O desempate por penalidades, que só seria introduzido no ano seguinte, não estava nos planos.
Tal como na meia-final do Euro68, onde a Itália se safou de um 0-0 titânico frente à União Soviética, a arbitrariedade de uma moeda jogada ao ar iria determinar o desfecho de tão aguerrido confronto. Jock Stein e Billy McNeill de um lado, Coluna e Francisco Calado, adjunto do técnico benfiquista que não quis observar a tragédia in loco, transformaram o confronto futebolístico em jogo de casino. Cara ou Coroa? Billy disse a primeira e a sorte fez-lhe a vontade.
5.
SL Benfica 6-0 FC Nuremberga (7-3 agregado) – Nos quartos-de-final da Taça dos Clubes Campeões Europeus de 1961, a caminho da final de Amesterdão, o Benfica (já com Eusébio) vê-se frente a frente com os máximos campeões germânicos, que, com oito títulos, até aí eram a principal potência da Bundesliga.
Para piorar a situação, a equipa é obrigada a enfrentar o rigoroso Inverno da Baviera no primeiro dia de Fevereiro, o que premedita condições que o sol lusitano impede-nos de testemunhar. É natural então a derrocada da primeira volta, 3-1 para os da casa, justificado pela hábito alemão e pelo relvado transformado em pista de gelo. Os portugueses, obviamente pouco dotados para a patinagem artística e sem calçado condizente, deram um trambolhão que só Costa Pereira evitou ser maior.
Na Luz, e com o solo nas perfeitas condições para a prática da bola, a técnica dos portugueses confundiu e ultrapassou a robustez adversária, que foram buscar seis às redes e agradeceram o apito final do árbitro. Águas, José Augusto (x2), Coluna e Eusébio (x2): foram estes os autores dos golos."
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