segunda-feira, 8 de julho de 2019

A reunião que mudou o destino do Benfica

"Nas últimas horas, o mundo benfiquista foi abalado por uma notícia ainda mais chocante do que as contratações de Nelo e Tavares no verão de 1994. Algo pior do que um aumento dos redpasses, uma terrível campanha da Champions, ou alguém ver uma luz e voltar atrás numa decisão, o que está a chocar os benfiquistas da internet é um encontro entre elementos do Sport Lisboa e Benfica e alguns sócios.
A 7 de Junho teve lugar a última Assembleia Geral Ordinária. Indo ao site do clube verificamos que «O ponto único da reunião magna benfiquista foi apreciado e votado por 634 Sócios (correspondente a 15 009 votos), tendo o mesmo merecido 13 131 votos a favor (87,49%) e 946 contra (6,30%). A abstenção cifrou-se em 932 votos (6,21%).» Destaco seguinte: 634 sócios. Estiveram presentes 634 sócios naquela sexta-feira à noite. Não estava frio, não estava calor, não chovia, mas era fim de semana prologando e isso complica sempre alguma coisa. #prioridades (como se diz na internet) 
Nessa noite, há um mês, ouvi a apresentação do orçamento, votei e depois decidi que iria falar. A ideia estava na minha cabeça há umas horas e só faltava saber se teria coragem e força para discursar. Devia ser quase meia-noite quando falei. O tempo foi pouco, é sempre pouco, e, sobretudo, parece ainda menos. São pouco mais de dois minutos mas acho que tudo o que tinha para dizer passou, que chegou aos consócios. Aos 634 sócios que estavam ali. E depois a mais uns quantos que leram isto: De muitos, um A ideia sempre foi muito clara: vivemos um tempo de ditadores de sofá agarrados a um telemóvel, computador ou tablet, e dirigir um clube como o nosso é extraordinariamente complexo. Liderar a parte empresarial de uma marca como o Benfica é um verdadeiro quebra-cabeças e, neste mundo, nada é o que parece. Talvez seja por isso, que não quero um Benfica-empresa, que não gosto deste futebol moderno, mas que ao mesmo tempo não consigo deixar de sofrer por aquelas camisolas berrantes.
No final da Assembleia, todos os que falaram nessa noite foram convidados a ir ao Seixal expor com mais tempo e pormenor o que havia sido dito. Parecia um convite inesperado e pouco realista mas teve mesmo um resultado prático, houve mesmo reunião. Ou seja, a SAD e alguns elementos do clube acharam que seria importante mostrar uma abertura para com os sócios. Alguns dirão que há um interesse maquiavélico por detrás, que pretendem calar os contestatários, que pretendem passar a cartilha, que pretendem fazer uma operação de charme. Honestamente, acho que é um pouco de tudo. E não vejo mal algum nisso porque sinto que uma atitude de abertura aos sócios será sempre positiva. Também porque me sinto confiante em mim mesmo e sei que nada mudou na minha forma de analisar o clube e quais as minhas ideias para o futuro do mesmo. A principal mudança é que agora tive acesso a mais alguma informação e que posso passá-la de forma responsável a alguns amigos e colegas que vivem o clube da mesma forma.
Não sou o Cavaco Silva, não tive acesso a nenhuma informação privilegiada que me fará enriquecer com compra e venda de ações nos próximos tempos. Apenas ouvi pessoas do clube, de diferentes áreas empresariais e desportivas, a explicarem o que está «na parte escondida do iceberg». E ouvir o que os outros dizem é o mais importante. Ouvir mais, falar menos. Tentar compreender o que nos dizem, observar atitudes e gestos repetidos para compreender a razão e a lógica das pessoas ou das empresas. Na noite de 7 de junho disse que «O Benfica é feito por nós aqui, na Assembleia. E é feito no estádio da Luz, nos outros estádios, nas roulottes, nas viagens, na casa dos avós, dos primos e dos tios, ou no jogo de bola na nossa rua (…) O Benfica é uno e é múltiplo, é singular e é diversidade, é liberdade de expressão e de que questionar. Nunca se esqueçam, o Benfica é nosso e faz-se de todos. Da opinião de todos.» E tudo isso se mantém, mais do que isso, tudo o que disse na altura faz ainda mais sentido atendendo ao que se passou nas últimas horas.
Nas últimas horas, discutiu-se em fóruns e no Twitter qual a razão para termos ido, quem somos nós, foi dito que nos tornámos «elementos da Mossad», foi adulterada informação sobre a reunião, foi posta em causa a integridade de desconhecidos. A internet é um local bizarro, é mesmo, todos opinam e quase sempre todos opinam sobre os motivos errados. Vivemos numa era de velocidade e de opiniões, o resultado é quase sempre lastimável. Não me interessa se eu fui usado, ou se ganhei street credit com a reunião, o que ganhei foi conhecimento sobre o clube e isso aconteceu apenas e só por um motivo: o clube decidiu premiar quem falou na última Assembleia Geral. É fundamental compreender isto: o clube tem mais de 230 mil sócios, desses só 634 saíram de casa naquela noite, destes nem 20 foram falar. É isto que nos torna diferentes, não uso especiais, uso apenas diferentes. Fomos dar uma opinião, lamentar-nos, apresentar propostas ou, simplesmente, dar valor a um direito que temos num clube democrático como o Benfica: falar. Dar uma opinião no local mais importante do clube. A Assembleia Geral é o órgão social mais importante de um clube, vide Sporting, e é importante que todos percebam isso. É na AG que se faz Benfica, é lá que se evita que se alterem estatutos ou se comprometa o futuro, não é na internet. Nas últimas horas houve tanta gente a medir pilas alheias que se esqueceram de ver se ainda têm algo no meio das pernas. Mostrem-se valentes e participem (democraticamente) na vida benfiquista.
E pluribus unum."


PS: O mais engraçado que li sobre esta reunião, foram as reacções de alguns dos sócios convidados: afinal mandar uns bitaites no teclado ou sentados no sofá, não é a mesma coisa, do que tomar decisões com conhecimento próprio sobre os diversos assuntos!!!!
Também foi engraçado a critica: «Então agora o Presidente passa informação confidencial a qualquer um?!!!» Não, neste caso, foram a sócios que tomaram da palavra na última Assembleia Geral...
Informar os sócios em privado, sobre alguns assuntos do Clube, pelo que sei, ainda não é crime!!!

SL Benfica reforça as alas com Caio Lucas

"O Sport Lisboa e Benfica reforçou o seu plantel com a contratação do jovem extremo de 25 anos, Caio Lucas.
O brasileiro tem no SL Benfica, a primeira oportunidade de jogar na Europa, após passagens pela Ásia onde jogou nos japoneses do Chiba Kokusai, no Kashima Antlers e nos Emirados Árabes Unidos, ao serviço do Al Ain FC.
Caio Lucas tem uma capacidade técnica acima da média e desequilibra a equipa adversária com muita facilidade, atributos que são apreciados pelo clube da Luz. O seu estilo de jogo rápido e algo inesperado, tornam o jogador verdadeiramente imprevisível para os defesas adversários. Na sua última equipa, o Al Ain, o extremo brasileiro realizou 120 jogos e apontou 48 golos.
No plantel das águias, Caio tem a concorrência directa de Cervi, Rafa Silva, Zivkovic e Toto Salvio, estando este último na porta de saída e, sendo assim, Caio Lucas apresenta-se como um substituto de uma possível vaga nos corredores ofensivos dos encarnados.
Com contrato até 2023, espera-se do jogador um activo importante já na próxima temporada para a conquista de títulos de águia ao peito."

O futebol feminino poderá melhorar o masculino?

"O Mundial feminino mostrou que o futebol, sem truques, burocracias e envenenamentos, é sedutor sempre que jogado com qualidade e paixão, o que também inclui respeito pela equipa adversária e pelo público. Este Mundial, jogado em França, pelo espectáculo e pelo interesse que suscitou, mostra que há algo de novo na competição desportiva. Também traz alertas reforçados para o sistema que se serve do futebol português.

O caso português. Primeiro, apareceram as noites de futebol falado que foram proliferando nos principais canais de televisão por cabo. A conquista de audiências puxou o culto da máxima intriga, até insulto. Agora, este futebol falado também ocupa parte das tardes de televisão, com especulações sobre eventuais transferências. Na maior parte dos casos, nada há de novo, mas há audiência fácil conquistada a custo baixo, sem necessidade de investimentos em reportagem. Os programas da tarde ainda estão livres dos envenenadores que atacam à noite em alguns dos canais.
Abundam lugares vazios em bancadas de vários estádios de futebol portugueses em jogos do principal campeonato masculino. Porquê? O que é que leva ao afastamento do público? Será a baixa qualidade do futebol jogado? Será a falta de ligação entre a equipa e a comunidade, efeito de escassa participação de jogadores criados no clube que prefere importar futebolistas, muitos só de passagem? Será o discurso grosseiro de alguns dirigentes? Será o tal envenenamento produzido pelo futebol falado? A realidade mostra-nos jogos da liga principal portuguesa com apenas escassas centenas de espectadores nas bancadas. É um caso português, sem paralelo por exemplo em Espanha onde jogos do segundo escalão chegam a ter dezenas de milhar de espectadores.
Junta-se uma outra pergunta: o que se passa com o trabalho de formação em alguns clubes? Será que preferem importar jogadores com qualidade incerta a formá-los nas suas escolas? O caso do Sporting é flagrante: criou, com o empenho de Aurélio Pereira e outros, uma academia que formou sucessivas gerações de grandes futebolistas, de Paulo Futre a Cristiano Ronaldo, passando por Luís Figo e tantos mais. Quantos futebolistas da academia do clube integram a tão financeiramente asfixiada actual equipa principal do Sporting? É, neste aspecto, devido elogiar os bons resultados da actual formação, tanto no Benfica como no Porto.
A Federação Portuguesa de Futebol tem gente competente no ofício, a começar pelo topo. A Liga dos Clubes anuncia boas intenções. As selecções masculinas funcionam e ganham, ainda que sem jogo de encantar. Mas o sistema de muitos dos clubes parece nefasto para que o futebol seja um espectáculo sedutor.
Poderemos esperar a reforma do modelo de dirigentes nos clubes de futebol e passar a ouvir prazer em vez de ódios nos serões do futebol falado? Parece pouco provável.

O mundial feminino. O jogo das meias-finais, entre as selecções dos Estados Unidos e Inglaterra foi visto por 11,7 milhões de pessoas no Reino Unido e tornou-se, de longe, o programa de televisão mais visto este ano nas ilhas britânicas. Não se pense que o entusiasmo é apenas produto do orgulho britânico. A selecção francesa já estava fora do Mundial e, mesmo assim, mais de seis milhões de pessoas viram este mesmo jogo em França – significa 31,1% do público diante dos ecrãs franceses nessa noite.
O interesse dos franceses nas transmissões dos jogos deste Mundial feminino fica atestado pelos números de espectadores em dois jogos da selecção francesa: 12 milhões no jogo com as brasileiras, 11,8 milhões no jogo com a selecção dos Estados Unidos. É escassa a diferença em relação aos 12,5 milhões que viram o França-Uruguai, nos quartos-de-final do Mundial masculino, no ano passado, jogado na Rússia (os uruguaios tinham afastado os portugueses nos oitavos-de-final).
Também neste Mundial feminino, a meia-final jogada entre a Holanda e a Suécia fez o quase pleno (79,8%) entre os telespectadores suecos e a televisão holandesa anuncia que esta transmissão é o programa mais visto desde a meia-final Holanda-Argentina, na meia-final do Mundial masculino de 2014, no Brasil.
Há relatos de mais de enormes audiências nos Estados Unidos. O triunfo das americanas é tratado com excepcional destaque a cinco das seis colunas no topo da primeira página do The New York Times, também no The Washington Post, ou em jornais financeiros como The Wall Street Journal e o Financial Times. Para o The Dallas Morning Post elas são “simply the greatest”.

O poderio das futebolistas dos Estados Unidos. Esta selecção feminina tem um palmarés de domínio absoluto: já ganhou quatro (1991, 1999, 2015, 2019) dos oito campeonatos do mundo e quatro ouros olímpicos (1996, 2004, 2008, 2012).

De onde vem este poderio? Em 1970 havia 700 mulheres futebolistas nas escolas dos EUA; agora, há mais de 390.000. Uma lei, conhecida como Título 9, aprovada em 1972 pelo Congresso dos Estados Unidos, proibiu toda a discriminação nos programas de educação financiados pelo Estado. Esta lei levou à generalização das competições desportivas femininas nas escolas e universidades nos Estados Unidos. O futebol foi uma das modalidades que dispararam nas universidades. No final dos anos 90 já estavam lançados campeonatos profissionais femininos e as universidades competiam entre si para terem como alunas as melhores desportistas, no caso, futebolistas. A quantidade gerou modelos inspiradores e a excelência. Assim apareceram Megan Rapinoe, Carli Lloyd ou Alex Morgan. As americanas começaram há muito e assim vão muito na frente. A qualidade da formação contribui para a boa prática e o espectáculo sedutor.

O futebol feminino é uma esperança. O diário Le Monde conta como em Tijuana, no norte do México, epicentro de criminalidade brutal ligada ao tráfico de droga, o investimento na ocupação de terrenos vadios por campos de futebol e a criação de campeonatos femininos está a permitir às mulheres romperem o cerco. Também em Molenbeek, periferia com má fama da cidade de Bruxelas, o futebol feminino é visto como antídoto à estigmatização.
As contas da FIFA sobre este Mundial feminino dizem-nos que a média de 20 faltas no conjunto dos 54 jogos mostra melhor comportamento em campo do que no último Mundial masculino, com 27 faltas na média de todos os jogos. Neste Mundial feminino apenas houve um cartão amarelo por simulação.
O balanço FIFA sobre o futebol feminino conta 33 milhões de mulheres que, para se divertirem, para se emanciparem ou pelo prazer de jogarem e ganharem, integram equipas de futebol por todo o mundo. Num subúrbio de uma cidade da África do Sul, numa favela do Rio de Janeiro, numa megacidade da Índia, numa vila da cordilheira dos Andes ou num estádio de Amesterdão, Lyon, Estocolmo ou Londres.
Talvez o modelo do futebol feminino possa ajudar a melhorar o masculino."

Como os Estados Unidos tratam as campeãs a pontapé

"A selecção feminina dos EUA ganhou o Mundial pela quarta vez, bateu recordes de vendas e audiências, mas até comida recebe menos que os homens

Este artigo não versa sobre o futebol feminino, mas sobre algo completamente diferente: o futebol da selecção feminina dos Estados Unidos, que ontem juntou o quarto título mundial às suas quatro medalhas de ouro olímpicas . A eliminatória dos quartos-de-final, com a França, foi o jogo de futebol mais visto em canais norte-americanos de língua inglesa desde o Mundial masculino de 2018. Uma hora depois da final, a Nike tornava público que a camisola desta selecção se tornou a mais vendida de sempre no seu site, feminina ou masculina. E já existem números destes há vários anos.
Apesar disso e sem necessidade aparente, a federação trata de forma muito diferente homens e mulheres. Eles viajam com mais conforto, gozam de bastante melhores condições de trabalho e até lhes dão mais comida ["The National Team: The Inside Story of The Women Who Changed Soccer"*], para além de terem remunerações não só muito maiores como, sobretudo, desproporcionais relativamente às receitas que cada selecção gera.
Quando Megan Rapinoe, ontem eleita melhor jogadora do Mundial, ajoelha durante o hino e diz que não porá os pés "na merda da Casa Branca", é capaz de ter uma ou duas razões para estar irritada com Trump e com o Congresso dos EUA. A própria FIFA, como lembra o site "Politico.com", acha a relva artificial desaconselhável para os homens, mas obrigou as mulheres a jogar o Mundial de 2015 em relvados de plástico, a troco de patrocínios, conseguem adivinhar?, da indústria de relva artificial. 
Aquele lilás do cabelo de Rapinoe é a cor de uma indignação mais do que justificada."

Sporting é de todos e não é de ninguém

"Na ascensão e queda de Bruno de Carvalho há matéria imperdível para doutoramentos em ciências sociais e políticas

No dia 17 de Fevereiro de 2018, no pavilhão João Rocha, Bruno de Carvalho obteve uma vitória esmagadora na AG que lhe alargou poderes e na qual exortou sócios e adeptos a apenas verem a Sporting TV e a lerem o jornal do Sporting. Depois dessa reunião magna, disse o então presidente da mesa da AG, Marta Soares: «O Sporting ganhou a consolidação de uma liderança, que hoje ficou demonstrado ser inquestionável. Poderá não se gostar do estilo, mas o que conta é a dedicação que Bruno de Carvalho devota ao Sporting, com inteligência, competência e vontade de levar o Sporting àqueles momentos altos que desejamos».
Quatro meses e uma semana depois, a 23 de Junho, os sócios do Sporting, em AG destituiva, decidiram, por 71 por cento contra 29, afastar Bruno de Carvalho da presidência do clube. Nesse curto espaço de tempo, houve o jogo no Wanda Metropolitano e, a seguir, o post suicidário de BdC, a rábula do Paços de Ferreira, o adeus à Champions e o ataque a Alcochete. Centro e vinte dias alucinantes bastaram para que o líder supremo passasse a persona non grata.
Entre a AG destituiva do Pavilhão Atlântico e as eleições mais participadas de sempre no Sporting distaram apenas dois meses e meio. Frederico Varandas, eleito com 42,3 por cento dos votos, iniciou um novo ciclo e BdC deu sempre a ideia de que não estava a perceber o que tinha acontecido, habitando numa realidade alternativa. Veio a seguir e decisão do Conselho Fiscal e Disciplinar de expulsá-lo, por actos que foram contra os estatutos do clube, e BdC continuou a falar de injustiça, depois de tudo o que tinha feito pelo Sporting. De AG, em AG, até à reunião magna do último sábado, o ex-presidente foi sucessivamente derrotado, até dizer realmente o que lhe ia na alma: «Sinto vergonha da massa associativa». Entre a AG norte-coreana de Fevereiro de 2018 e esta declaração passou menos de ano e meio. Em síntese, honra ao Sporting que, dentro da mais estrita legalidade, resolveu de forma superior um problema que colocou em causa a natureza do clube. Só uma entidade com uma matriz tão vincada seria capaz de acordar do pesadelo e retornar ao espírito de 1906.
E daqui para a frente? O brunismo, sabedor da volatilidade das maiores nos clubes, continuará o seu caminho, procurando alimentar-se dos insucessos desportivos do Sporting. Esta é a nova circunstância, nascida da queda de BdC.

A profecia que se realizou um ano depois
«Hoje, deixei de ser, para sempre, sócio e adepto deste clube»
Bruno de Carvalho, no Facebook, a 24 de Junho de 2018
cerca de um ano, após a AG que o destituiu da presidência do Sporting, Bruno de Carvalho fez uma declaração, por escrito, em que dava conta de que deixava de ser sócio e adepto do clube de Alvalade. Parecia que estava a adivinhar o que lhe havia de acontecer. Aliás, confesso que nem sabia que era possível deixar de ser adepto de um clube, como quem desliga o interruptor e apaga a luz...

Ás
André Gomes
Depois do Everton ter pago 25 milhões ao Barcelona pelo seu passe, foi-lhe perguntado porque não vingou em Camp Nou. O campeão europeu por Portugal, pura e simplesmente, explicou tudo com o facto de não ter aguentado a pressão e agradeceu aos blaugrana pela oportunidade de jogar com alguns dos melhores. Um senhor!

Ás
Megan Rapinoe
Prevaleceu a lei dos mais forte e os Estados Unidos venceram, pela quarta vez, o Mundial de futebol feminino, que teve na capitã norte-americana, Megan Rapinoe, a principal figura mediática. Os próximos anos vão aprofundar a popularidade do futebol jogado por elas, que está a crescer de forma exponencial...

Rei
José Mourinho
O Special One tem estatuto e condição financeira que lhe permitem dizer não, até a uma oferta de cem milhões de euros para treinar na China. Para Mourinho, o mais importante é encontrar um projecto na Europa que lhe agrade, e é essa parte que, com as equipas de topo a entrar na pré-época, se mostra mais difícil de concretizar.

Que pena não termos outro Agostinho
Está na estrada a 106.ª edição do 'Tour de France', um dos eventos desportivos mais importantes, à escala mundial. É deveras notável a vitalidade que a 'Grand Boucle' demonstra, depois de todas as tormentas relacionadas com o 'doping' que teve de ultrapassar. É a força de uma marca e a força de uma modalidade.

Vitória histórica
São os grandes palcos que moldam a história dos desportivos de elite. A João Sousa, melhor tenista português de sempre, faltava o que lhe está a acontecer em Wimbledon, ou seja, mostrar-se à altura ao mais alto nível, na catedral do ténis. Vi o jogo do vimaranense com o inglês Daniel Evans num restaurante das Avenidas Novas, que está muito longe de ser uma clientela de 'sports café'. E a verdade é que, quando Sousa consumou a vitória, um aplauso espontâneo percorreu as mesas, entre um misto de orgulho nacional e admiração pela forma como o tenista português se entregou à maratona de cinco sets de intensidade elevadíssima. Quando João Sousa entrar no 'court' principal de Wimbledon para defrontar Nadal, sabe que, aconteça o que acontecer, já ganhou..."

José Manuel Delgado, in A Bola

Bruno de Carvalho, ponto final

"Mais de dois terços dos sócios do Sporting deram a Frederico Varandas uma oportunidade de os fazer felizes

A história de Bruno de Carvalho ainda não acabou: só vai acabar quando a Justiça considerar que chegou ao fim.
Mas a história de Bruno de Carvalho com o Sporting, acredito, acabou mesmo.
Os associados foram chamados a pronunciar-se e mais de dois terços disseram que não queriam mais a sombra do antigo presidente a pairar sobre o clube. Foi um número sintomático, portanto.
Bruno de Carvalho fez muita coisa bem durante muito tempo. Acima de tudo, recuperou a capacidade de colocar os sportinguistas a sonhar: bons jogadores, um bom treinador, uma equipa a lutar por títulos. Perante o que tinha acontecido antes dele, não é coisa pouca.
Mas cometeu um erro capital: achou que o clube lhe pertencia.
Não soube ter a humildade de dar um passo atrás para dar dois em frente: demitir-se para se recandidatar e, muito provavelmente, ganhar as eleições.
Entrou numa guerra que desgastou a imagem dele e, acima de tudo, desgastou o Sporting.
Os adeptos não lhe perdoaram esse braço de ferro que só fez mal ao clube. Por isso, de Assembleia-Geral em Assembleia-Geral, afastaram-no tanto que hoje nem é digno de pagar quotas.
O que os sócios disseram no sábado é que não o querem mais por perto: querem enterrar o passado para olhar para o futuro com esperança.
Sem andar aqui a dar voltas, e voltas, e voltas, em torno de uma coisa que não faz bem a ninguém. 
Sobretudo quiseram livrar-se do fantasma de Bruno de Carvalho e dar a Frederico Varandas a oportunidade de os fazer felizes. É importante que todos pudessem perceber isso.
Mais do que importante, aliás: é fundamental."

Mentiras sofisticadas e mentes crédulas: Lance Armstrong e o Tour e o ciclismo (...)

"O Tour de France, a maior competição velocipédica do mundo e um espectáculo extraordinário mesmo para aqueles que o acompanham à distância, arrancou este fim de semana e o meu desinteresse é quase absoluto. Não conheço as equipas e não faço ideia de quem são os candidatos à vitória final. Os nomes dos sprinters, aqueles que dominam as primeiras etapas e disputam a última etapa a velocidades suicidas pelas ruas de Paris, no último dia da prova, nada me dizem, e dos trepadores, os homens que oferecem o filet mignon, creio que só me é familiar o nome de Nairo Quintana, embora tenha de confirmar nos jornais se o colombiano está mesmo na prova.
O meu desinteresse nada tem de notável, excepto por um pormenor: durante anos combati o tédio das férias grandes acompanhando religiosamente as transmissões televisivas do Tour, num fascínio pela modalidade que tinha começado em 1989 com a Volta a Portugal em bicicleta. Atirada para uma zona menos nobre do chamado calendário velocipédico internacional, a Volta nunca atraiu as grandes equipas internacionais, nem os maiores nomes da modalidade. Em 1997, o polaco Zenon Jaskula, que tinha alcançado o terceiro lugar no Tour uns anos antes, venceu a prova portuguesa, mas na altura já não era um ciclista de topo, antes uma espécie de pré-reformado que veio passear a sua superioridade numa prova paroquial.
Eu vivia com a esperança de que, um dia, a nossa Volta atingisse o estatuto da quarta grande prova por etapas, a seguir ao Tour, ao Giro e à Vuelta, mas isso nunca aconteceu e, muito provavelmente, nunca acontecerá. Apesar do entusiasmo dos jornalistas desportivos que acompanhavam o evento e em cujas palavras a subida à Torre se transformava num Tourmalet e o Monte Farinha – a Senhora da Graça – pedia meças ao Alpe d’Huez, a Volta nunca deixou de ser uma competição menor, com os seus ídolos caseiros, uma espécie de pequeno panteão lusitano que, não obstante a sua condição secundária, preenchia a minha imaginação de criança.
A primeira Volta a Portugal que segui com devoção islâmica, convocado pelos muezzins da rádio para as orações diárias, foi a de 1989. Como é natural, Joaquim Gomes, que venceu essa edição, tornou-se o meu ídolo. Ainda recordo uma reportagem que passou no Domingo Desportivo em casa do campeão, depois do triunfo, e de pensar que o corredor da Sicasal-Torreense era um dos maiores ciclistas do mundo, um dos maiores ciclistas de sempre. Nunca deixei de torcer por ele, fosse nos míticos embates com o brasileiro Cássio Freitas ou com Orlando Rodrigues ou naquela Vuelta de 1994, em que ele, chefe de fila de uma equipa – o Boavista – sem pedalada para aquelas andanças, lutou bravamente contra alguns dos melhores ciclistas do pelotão internacional. Raras vezes sofri uma desilusão desportiva tão grande como naquele ano de 1990 em que Joaquim Gomes perdeu a Volta a Portugal para Fernando Carvalho na última etapa, um contrarrelógio que terminava na Maia. 
A nossa Voltinha foi a droga de entrada, salvo seja, para uma paixão pelo ciclismo que me levava a acompanhar o Tour e a festejar os seus campeões como o norte-americano Greg Lemond e, acima de todos, a montanha que era o navarro Miguel Induraín, mas também a admirar o cortejo de secundários como os italianos Claudio Chiapucci e Gianni Bugno, os suíços Tony Rominger (especialista em Vueltas) e Alex Zülle, os franceses Richard Virenque e Laurent Jalabert, e os sprinters, como Abdoujaparov, os homens das camisolas verdes, cujo sistema de pontuação nunca percebi e continuo sem perceber. Equipas como a Banesto, a Once, a Festina, a Motorola, a Deutsche Telekom, a Française des Jeux, eram para mim nomes tão admirados como os dos maiores clubes de futebol. Julgava que durariam para sempre.
Em 1995, assisti em direto à etapa em que um jovem ciclista italiano, Fabio Casartelli, morreu após uma queda. Creio que no dia seguinte os seus colegas de equipa – a Motorola – cortaram a meta todos juntos, à frente do pelotão, em jeito de homenagem. Entre esses homens estava Lance Armstrong. O norte-americano tinha sido campeão do mundo de estrada em 1993, numa prova disputada na Bélgica. Nesse ano, eu estava a passar umas férias no Luxemburgo, em casa de uns tios, e recordo-me de ler os jornais com a notícia da vitória do norte-americano. Foi a primeira vez que ouvi falar dele. No ano em que Casartelli morreu, Armstrong ganhou uma etapa no Tour e dedicou a vitória ao malogrado colega. Ninguém poderia imaginar que, dez anos depois, o ciclista norte-americano estaria a comemorar a conquista inédita de um sétimo Tour consecutivo.
Depois de lhe ter sido diagnosticado um cancro em 1996, de se ter submetido a um tratamento agressivo e, contra as previsões dos médicos, ter sobrevivido, Armstrong voltou a competir. Se isto já por si era uma história extraordinária de superação, a primeira vitória do norte-americano no Tour, em 1999, foi considerada um milagre e transformou Armstrong numa estrela global que o ciclismo, apesar de todos os grandes nomes do passado, nunca conseguira criar. As vitórias seguintes alcandoraram-no a um posto em que o seu único rival histórico só poderia ser Eddy Merckx, com a diferença de que o “canibal” disputava todas as provas do calendário enquanto Armstrong era uma máquina programada para triunfar no Tour.
As suspeitas sobre os métodos de Armstrong apareceram cedo, mas foram sendo arrumadas por uma série de interesses que, como depois se veio a descobrir, mancharam toda a modalidade: de ciclistas a directores desportivos, da União Ciclista Internacional à agência de controlo de doping. A história de Armstrong começou por ser demasiado boa para ser verdade até que se tornou demasiado grande para cair por terra, “too big to fail.”
Ontem, com notável sentido de oportunidade, a RTP passou o filme Vencer a Qualquer Preço, do estimado Stephen Frears, e que conta a incrível história da ascensão de Armstrong e da sua espectacular queda. Está longe de ser um dos melhores filmes de Frears, mas isso para o caso pouco interessa. O que interessa é que o filme consegue mostrar que a fraude montada por Armstrong, apesar de bastante sofisticada, só funcionou porque contou com a conivência de uns e a credulidade de quase todos, incluindo os adeptos da modalidade. Como é que um ciclista que era um trepador sofrível antes da doença se transformou num Super-Homem, a subir montanhas como se estivesse de mota? As justificações para esse mistério residem menos na genialidade do esquema de Armstrong do que na nossa necessidade colectiva de acreditarmos numa boa história.
Após o escândalo da Festina, em 1998, toda a gente queria acreditar que o ciclismo era agora um desporto limpo em que era impossível aos batoteiros escaparem à malha cada vez mais apertada do controlo. Mas se a malha do controlo era mais apertada, a malha da credulidade era um enorme buraco e foi por aí que Armstrong, com a cumplicidade de quase todo o sistema, incluindo os jornalistas, passou sem que o questionassem a sério. Por muito boa que seja, uma mentira só vende se houver um mercado de mentes crédulas. Numa época em que o descrédito da modalidade era enorme, toda a gente precisava de um redentor. Hoje, quando muitas pessoas, como eu, já não conseguem acreditar no ciclismo e o fascínio infantil que tinham pela modalidade ficou para sempre manchado, é bom lembrar que os redentores anunciados quase nunca salvam ninguém. A começar por quem os idolatra e a acabar, tragicamente, em si mesmos."

“O meu pai morreu de cancro, tinha eu 14 anos. Tenho noção de que posso ter prejudicado o meu irmão para continuar no futebol”

"Aos 43 anos, o ex-médio do Benfica, que tinha como imagem de marca cabelo comprido e ar tímido, perdeu o cabelo mas não a vontade de manter-se ligado ao futebol, ainda que num papel de gestão. Coordenador da formação do Amora FC, clube onde iniciou a carreira antes de rumar à Luz, recorda (...) o seu percurso, que passou por Espanha e também pelo Sporting, ainda que sempre de forma discreta. Com dois filhos adoptados, Bruno Caires revela de quem foi a ideia do famoso livre em que ele e Dani fingem que se zangam e conta alguns episódios que viveu no Japão com a selecção de sub-18, campeã da Europa em 1994

Nasceu em Lisboa, é filho de um jogador de futebol, comece por falar-nos do seu pai e da sua mãe.
O meu pai chamava-se Eurico Caires, oriundo da Madeira, e a minha mãe Maria Helena Dias Caires, do Algarve. Onde estamos agora, na Amora, era onde a minha mãe residia. O meu pai veio jogar para o Benfica muito novo e através de uns amigos conheceu a minha mãe. Casaram e tiveram três filhos. 

O seu pai foi só jogador de futebol ou teve outra profissão?
Quando deixou de jogar virou a página e fez algo diferente, teve uns talhos e teve uma churrasqueira, aqui na zona. A minha mãe era doméstica.

Tem quantos irmãos?
Dois. O mais velho tem 47 anos e a minha irmã tem 39 anos. Sou o irmão do meio.

Lá em casa sempre se torceu pelo Benfica?
Sim, a veia sempre foi benfiquista.

Lembra-se de ver o seu pai jogar?
Vagamente. Ainda vi aqui uns cinco ou seis jogos. Eu era pequeno, não tenho uma noção muito viva. 

Era um miúdo calmo ou deu muitas dores de cabeça?
Era uma criança calma. Dos três irmãos sou o mais calmo. O meu irmão é mais falador, a minha irmã também é mais extrovertida.

O futebol começou muito cedo?
Sim, começou onde estamos, no campo do Amora FC, só que na altura era pelado, e não havia infantis. Mas umas pessoas ligadas ao clube quiseram formar uma equipa para participar no Girabola, porque também não havia campeonatos distritais como há agora. Foi a partir daí. Jogávamos na escola, mas toda a gente sabe quem é que jogava bem, o meu pai era uma referência na zona da Amora e a pessoa que levou isso para a frente juntou um lote de atletas, incluindo eu, e fizemos uma boa equipa.

Tinha quantos anos?
10, 11 anos. Fizemos um excelente campeonato e acabamos por ir à final.
Gostava da escola?
Quer dizer... É aquela situação que agora vejo nos meus filhos. Tenho um filho e uma filha, a filha vai entrar este ano na escola, e já gosta de andar com os livros atrás, é dedicada; o filho temos de andar sempre a chatear [risos]. Eu nunca fui um grande aluno, fui fazendo a escola. Mas gostava de ir porque fiz grandes amigos na escola.

Como vai parar ao Benfica?
As coisas correram bem no Amora, na altura era diferente, hoje os pais são mais presentes, mais preocupados - às vezes até demais - com os filhos e o meu pai não. Mas, como fomos à final, como toda a gente dizia que eu tinha alguma capacidade e o meu pai também via isso, porque eu passava a vida a jogar à bola na rua, resolveu levar-me ao Benfica. É engraçado que o meu irmão foi para o Sporting e eu fui para o Benfica.

Porquê?
O meu pai foi ao Benfica tratar de algumas coisas, porque ele jogou com o João Alves, o Nené, Artur Jorge... E o Nené era o coordenador do futebol juvenil e perguntou ao meu pai: "Então porque é que não trazes cá o miúdo?" Fui lá fazer um treino e pronto. O meu irmão foi para o Sporting nas mesmas circunstâncias, o meu pai dava-se muito bem com o Carlos Pereira, que estava ligado ao Sporting, e de uma forma parecida também levou o meu irmão, que já estava no Sporting quando eu fui para o Benfica, com 11 anos. Foi por acaso.

Custou-lhe deixar os amigos do futebol da margem sul para ir para o Benfica?
Não, na altura a única coisa que custava é que demorava duas horas a chegar ao Estádio da Luz.

Ia sozinho, com 11 anos?
Ia sozinho, de transportes. Na altura era o fim do mundo. apanhava aqui o autocarro para a Piedade, na Piedade apanhava outro autocarro para a Praça de Espanha e de lá o metro para o Colégio Militar. Outros tempos, hoje andamos sempre atrás dos filhos. Também tinha vários amigos que viviam na zona, uns na Piedade, outros em Paio Pires e quando chegámos ao último ano de juniores já éramos à volta de 12 atletas da margem sul. O único drama é que se perdêssemos o autocarro só chegávamos no outro dia quase [risos]. A ponte era um caos, às vezes chegava atrasado e por isso devia pagar multas mas como era o mais novo e o que ganhava menos, era perdoado [risos]. Na altura o Gaspar Ramos era o director do futebol do Benfica e também tinha o mesmo problema, por isso estava safo [risos].

Quem eram os seus ídolos?
Eram jogadores que via passar lá no Benfica, porque quem se lembra do antigo estádio da Luz recorda-se que os seniores passam por nós e havia uma grande ligação. Ricardo Gomes, Paulo Sousa, Mozer, Rui Costa, vários atletas, é difícil enumerar todos.

E o cabelo comprido, era para imitar alguém?
Não. Sempre tive o cabelo comprido, desde miúdo. Também não gostava muito de ir ao cabeleireiro. Naquela altura usava-se cabelo comprido. Agora já não o tenho [risos].
Quando começam as primeiras saídas à noite?
Com 16, 17 anos. Havia um ou outro que puxava e começou por aí. Até então estávamos sempre ocupados ou com torneios ou na selecção. Mas a minha primeira saída à noite deve ter sido com o meu irmão. Nós íamos muito para Sesimbra. Mas era mais nas férias.

Já era reconhecido como jogador do Benfica?
Não, isso foi só quando cheguei aos seniores do Benfica. Uma pessoa queira ou não as pessoas reparam, há os autógrafos ou querer tirar fotografias. Acaba por ser um bocadinho incómodo, porque não se consegue estar à vontade ou fazer uma parvoíce que toda a gente faz.

Os namoros também começam nessa altura?
Sim, com a namorada de sempre, a Carla, que é a minha mulher. Vivíamos na mesma praceta. O nosso casamento foi muito engraçado. Porque no dia do casamento quem conhecia os noivos ia a casa de um e do outro e não saía da mesma praceta [risos]. Conhecemo-nos desde pequenos e começámos a namorar a partir dos 15, 16 anos.

Lembra-se do valor do primeiro ordenado?
Em juniores já havia uma tabela e todos ganhavam o mesmo, mas não me lembro. Depois nos seniores, se calhar equivalia a 1500€.

É no Belenenses que faz a estreia como sénior.
Sim. Nas Antas, com o FCP. Da minha geração, fomos campeões da Europa de sub-18 e eu fiquei no Benfica, na altura do Artur Jorge. Nesse primeiro ano não joguei no Benfica porque naquele tempo não era fácil com 18 anos chegar e jogar. Em dezembro fui para o Belenenses com o João Alves. As coisas correram bem.

Estava muito nervoso?
Uma das coisas que os meus colegas na altura me diziam é que eu não tinha a idade que tinha. Porque eu tinha 18 anos mas eles achavam que eu fazia coisas com muita calma e sem estar nervoso. Na altura o João Alves só me deixou jogar meia parte e correu-me muito bem. Sempre fui um jogador que, como se costuma dizer... O stress não passa por mim.

Foi campeão Europeu em 1994 com a selecção.
Sim, nos sub-16 ficámos em 4º lugar e fomos campeões depois. No Europeu de sub-16 perdemos nas meias-finais contra a Espanha, foi um amargo de boca porque tínhamos uma selecção com grande capacidade. Lembro-me que ficamos no grupo da Holanda, o Ajax tinha acabado de ser campeão da Europa com o Seedorf, Kluivert, mais um ou outro e eles também jogavam na equipa da Holanda. A nossa equipa tinha Dani, Nuno Gomes, Quim, Rui Óscar, Beto, Alfredo Bóia, José Soares, Mariano, João Peixe e outros.

Faziam muitas asneiras, muitas partidas uns aos outros nos estágios da selecção?
Sim. Ali era onde fazíamos mais asneiras. Acho que a federação na altura tinha muita paciência para connosco. Mas também já sabiam que havia sempre um mais artista do que outro.

Recorde lá umas histórias dessa altura.
Fomos campeões da Europa e depois fomos fazer uma digressão ao Japão e aí foi o caos, só fazíamos asneiras. Lembro que ficávamos sempre em hotéis de cinco estrelas, mas a comida não era nada agradável para nós. Num deles, fomos jantar para uma sala onde meteram um biombo, os treinadores e o staff ficaram de um lado e nós do outro. Só que aquilo tinha um vidro que dava para o hall, por onde as pessoas passavam para ir para os quartos. Vieram aquelas sopas de ninho não sei das quantas e mais comida, e quando demos conta tínhamos as pessoas todas com as mãos na cabeça porque estávamos a atirar as coisas uns aos outros e o vidro estava imundo [riso]. Outra parvoíce que fazíamos era entrar nas lojas e sair com ursos de peluche do nosso tamanho, sem pagar, e eles como são muito civilizados, não nos diziam nada [risos]. No final claro que devolvíamos, porque havia alguém na federação que nos obrigava a fazê-lo. Não tinha a ver com o dinheiro porque nós já ganhávamos dinheiro, era mais pela brincadeira, para chocar, porque eles culturalmente eram completamente diferentes de nós. Lembro que também saíamos desses almoços e íamos a correr para o McDonalds. Na altura ainda não havia aqui. Como as salas de jogos, cá não havia muitas e lá era em todo o lado. Até é coisa de que não gosto muito, mas íamos para lá e fazíamos corridas de carros, gastávamos o dinheiro todo na sala de jogos e nos hambúrgueres. Nos hotéis também havia sempre um que acordava com a cara cheia de pasta dos dentes ou metíamos sal nos lençóis, enfim, as brincadeiras que acabavam por ser muito saudáveis.
Também as fazia ou ficava a ver os outros a fazer?
Era mais de observar e às vezes também me tocava a mim. Também sofria na pele. Lembro-me de outra, antes de irmos para o campeonato do mundo de sub-20, era a mesma geração: acabámos o estágio e só saíamos de viagem no domingo. Era uma sexta-feira à noite, estávamos todos motivados para ir jantar e ir beber uns copos depois do jantar. E houve um artista, não vou dizer o nome, que deu uma mocada com o carro à noite e em vez de irmos sair fomos todos tristes para casa [risos].

Nesse Campeonato do Mundo em 1995 o Bruno protagoniza um livre com o Dani que ficou para a história. Simulam que se chateiam, empurram-se e tudo, mas marcam e é golo.
É verdade. Quando cheguei à selecção o Carlos Queiroz já tinha subido à selecção A, mas toda a estrutura, o Nelo Vingada e o Agostinho Oliveira, mantinha-se e por isso havia um trabalho de continuidade. A nossa selecção muitas vezes ganhava os jogos e nós perguntavamos como era possível porque tínhamos a noção de que os outros tinham mais capacidade, mas nós, não sei como, lá conseguíamos ganhar os jogos e os torneios. Lembro-me que para nós, aquilo era uma seca, passar a tarde a treinar livres. E o Nelo Vingada tinha essa metodologia desses livres e treinámos aquilo umas 10 vezes. Naquele jogo, contra a Holanda, já estavam a ganhar 3-0, então o Agostinho foi para a área e naquela altura dissemos: "Bora fazer aquele livre". Fizemos e quando olhamos para o adversário vemos que eles pensavam que nós estávamos mesmo a chatear-nos à séria e correu bem. 

Mas de quem foi a ideia de ensaiar um livre assim, com aquela simulação de zanga?
Foi o Nelo Vingada: “Vocês vão, fazem que batem um no outro, vão para trás e chutam logo a bola”. Passámos uma tarde toda a treinar aquele livre no Estádio Nacional. Resultou [risos].

Depois do Belenenses, volta ao Benfica, entretanto sai o Artur Jorge e o Mário Wilson assume o comando da equipa. Como era o velho capitão?
Era fantástico, fantástico. Tinha o dom de cativar. Normalmente os treinadores gostam de falar um bocadinho antes do treino e muitas vezes é maçador, ele não. Ele contava histórias e metia-se com toda a gente. Aquela meia-hora ou 40 minutos antes do treino, toda a gente estava lá só para ouvir as histórias do Mário Wilson. Os ensinamentos dele não tinham muito a ver com a parte técnico-táctica mas com vivências. Ganhámos a Taça de Portugal. Foi muito giro. Estive seis meses em que não tive muitas oportunidades de jogar e ele lançou-me.

A época seguinte seguinte já foi com o Paulo Autuori.
Mais uma metodologia. Ele tinha estado no Marítimo e vinha como campeão do Brasil. Mais rigoroso na pré-época. Acabou por sair. Houve ali uma altura em que o Benfica vendeu alguns dos melhores atletas, estávamos em 1º lugar, o Helder e o Dimas saíram, depois houve uns problemas com alguns brasileiros e aquilo desmoronou um bocadinho. Depois veio o Manuel José até ao final da época. Já se sabe que isto no futebol não há o amanhã, é ganhar.

E o Manuel José, que tal?
Diferente também. Muito rígido. Quis implementar as suas ideias. Conseguimos ir à final da Taça mas perdemos com o Boavista. No ano seguinte começa a pré-época, faço as primeiras jornadas e depois é que vou para o Celta de Vigo.

Como e porquê?
Já havia muitos clubes certamente interessados em mim e o Benfica achou por bem, e eu também, que seria uma boa oportunidade ir para um campeonato completamente diferente. Foi um salto qualitativo.

Tinha empresário?
Era o José Veiga.

Foi sozinho para Espanha?
Não, a minha mãe foi comigo. A Carla também passou lá muito tempo. Foi fácil. Estava lá o Cadete, havia alguns jogadores espanhóis da minha idade que jogavam na selecção e que estavam no Celta, por isso acabou por ser muito fácil a minha integração. Sendo que os primeiros seis meses são sempre mais complicados por estar longe do seio familiar e dos amigos, que é uma coisa a que dou muita importância.

E ao futebol, foi fácil adaptar-se?
O futebol era totalmente diferente, os métodos de treino também, treinos mais curtos, o nível dos atletas era muito bom. Fizemos um grande campeonato. Depois tive a infelicidade, em Fevereiro, de me lesionar. Foi uma ruptura de ligamento cruzado. Estava pré-convocado para o Europeu 2008, pelo Humberto Coelho, mas num jogo em Salamanca, a tentar fazer um corte, lesionei-me. Esse ano já não joguei mais.

Começa a época seguinte com o Victor Fernández.
Sim, treinador também diferente, o jogo com poucos toques na bola, nesse ano voltámos a ter grandes jogadores, tínhamos uma super equipa, ou seja, estivemos dois anos sem perder em casa. Chegámos às meias-finais nas competições europeias... Foi giro. Fiz também grandes amigos na cidade, tenho lá quase uma segunda família, uns espanhóis que conheci através de amigos e com quem criei grande amizade. Vou lá regularmente e dou-me muito bem com eles.

No ano a seguir começa no Celta de Vigo mas acaba por ser emprestado ao Tenerife. Porquê?
Fui para lá nos últimos seis meses da época. No Celta não estava a jogar muito, tínhamos o Mazinho, Celades, Makelélé, Giovanella, e eu como vinha de lesão queria ter mais minutos.

Gostou da ilha?
Sim, nunca tinha estado numa ilha, gostei porque também acabou por não ser por muito tempo. Fui no final do Janeiro e a época terminou em maio.

Estava sozinho ou com a sua mãe?
Estive quase sempre sozinho.

O que fazia nos tempos livres?
Havia treinos bidiários, havia vários jogadores portugueses, o Tiago, o Costinha e outros brasileiros com quem estava. Depois por ser ilha, todos os jogos que tínhamos fora, ao fim e ao cabo passávamos o fim de semana todo fora.

Não tinha nenhum hobby, como jogar Playstation, por exemplo?
Não. Em Espanha os treinos eram mais tarde, só começaram às dez e meia, onze. Almoçam tarde, jantam tarde, era outra dinâmica. Também descansava ou acaba por estar com os colegas ou em casa.

Não tem nenhuma história para contar dos tempos passados em Espanha?
Quando cheguei ao Celta de Vigo, no segundo ano, depois de fazermos uma excelente época, fomos convidados para ir jogar com o AC Milan, no centro de estágio onde eles estavam, em Itália. E na altura o Celta de Vigo ainda estava com uma estrutura bastante pequena. Tínhamos um roupeiro que já era uma pessoa com alguma idade, mas que era acarinhado por todos. Quando chegámos ao jogo ele começa a desfazer as malas e descobrimos que não tinha trazido os equipamentos. Aquilo foi uma risota total. Foi história para mais de um mês em Espanha, porque tivemos de jogar com os equipamentos do clube da terra [risos].
Como é que vai parar ao Sporting?
Vim fazer um jogo à selecção B e fui dos melhores jogadores. Na altura o Sporting foi para a Liga dos Campeões, queria reforçar-se, eu também tinha vontade de jogar mais.

Não lhe fez confusão ir para o Sporting, sendo benfiquista?
É como todas as profissões, se gostamos muito de fazer uma coisa, e neste caso é jogar, e se temos um clube que mostra interesse... Também achei interessante poder jogar na Liga dos Campeões e o Sporting tinha acabado de ser campeão. Muitos dos colegas que lá estavam tinham jogado comigo no Benfica: Dimas, Paulo Bento, João V. Pinto... O Sporting ia estar em muitas competições, por isso queria um grupo grande mas isso fez com que essa gestão não fosse fácil para o treinador. Todos os jogadores que lá estavam tinham bastante capacidade.

Arrependeu-se?
Como em tudo na vida, se nós não tomamos as decisões não sabemos. É sempre relativo. Na altura as coisas não correram bem. Eu sempre fui um jogador que precisei de jogar. Há jogadores que não jogam mas entrando conseguem enquadrar-se bem. Eu tinha umas características diferentes, precisava de jogar para ter algum sucesso, só entrar não me era fácil.

Era um problema psicológico?
Não, tem a ver com as minhas características, como não era um jogador muito rápido, precisava de jogar muito.

Vai parar à equipa B porquê?
Na época seguinte o Sporting quis fazer algumas alterações, são situações que temos de perceber. O Sporting tomou essa decisão, sempre tiveram uma postura correta comigo, e tentámos arranjar outras soluções.

É quando vai emprestado para o Maia.
Sim, estive no Maia, onde já joguei com mais alguma regularidade. Depois voltei ao Sporting, mas fiquei na mesma na equipa B.

Já lá voltamos. Quando veio de Tenerife toma a decisão de casar.
Sim.

Foi viver para onde?
Onde vivo hoje, na zona do Lumiar.

A sua mulher foi consigo para a Maia?
Sim, foi giro. Como estávamos perto de Vigo íamos lá muitas vezes.

Não foi complicado quando voltou ao Sporting e dizem-lhe que vai para a equipa B? Era o mais velho.
Nós queremos sempre outras situações. Mas foi interessante passar algumas das vivências que eu tinha aos jovens. Claro que sentia que aquilo era um espaço mais para os jovens e acabei por tentar ir para outro clube. Fui para o Sporting da Covilhã. Fui em Fevereiro, o campeonato acabou em maio. Foi pouco tempo. Fiz lá alguns amigos. O clube tinha poucos pontos mas desde que lá cheguei fizemos o dobro dos pontos que tinham feito até então, quase que nos salvávamos.

Entretanto vai para o Louletano. Como surge?
O Amílcar da Fonseca tinha jogado com o meu pai, eu já conhecia bem Portimão, porque é onde passo sempre as férias. Ele enquadrou-me, explicou o projeto. Tentou fazer uma equipa para subir, mas foi um ano também difícil porque a mentalidade que estava instaurada no clube não era para aquilo. Ou seja, parte do plantel, uns trabalhavam, outros estudavam, o clube estava numa fase que queria e tinha capacidade financeira para tentar subir mas aquilo não resultou porque os treinos eram bidiários e havia uns que vinham aos treinos, outros que não vinham. Não foi fácil. Tínhamos individualidades com alguma capacidade mas com o passar do tempo aquilo foi desgastando, se o clube subisse, se calhar a maior parte dos atletas não podia continuar e alguns eram filhos de directores... Até que acabámos por, na parte final, passar um mau bocado no sentido em que as expectativas eram altas e tivemos de lutar para não descer de divisão.

E resolveu pendurar as botas. Porquê?
Aquilo que passei nesse ano foi totalmente diferente do que tinha sido a minha carreira até aí e resolvi que estava na hora de parar. Uma das coisas que me desgastou também é que tínhamos de ir jogar muitas vezes à Madeira e aos Açores e eu não gosto muito de andar de avião [risos]. A minha vida foi sem os amigos, sem a parte familiar e eu gosto muito do convívio. Foram muitos anos a comer só massa e arroz e chegou a uma altura que me fartei. Depois também tinha algumas mazelas que não me deixavam treinar bem. Tinha alguns problemas ao nível dos gémeos, já treinava e jogava com algumas dores e achei por bem colocar um ponto final.

Já sabia o que ia fazer a seguir?
Sempre gostei do meio imobiliário, o dinheiro que fui ganhando fui aplicando em imobiliário. Criei uma empresa, a "Friends & Company", que cresceu e ganhou novos sócios, neste momento temos dois clubes, um que é o Amora FC, onde gerimos o futebol juvenil até aos juniores, e o outro que é o Leão Altivo, que funciona dentro de uma escola. Quando chegámos aqui ao Amora FC há cinco anos, com esta direção, da qual também faço parte como vice-presidente para o futebol juvenil, tínhamos cento e tal atletas e hoje temos 400. Já temos equipas no nacional, já temos uma estrutura bem engraçada.

Mas desde que pendurou as botas até vir para o Amora FC, passaram 10 anos. O que fez nesses 10 anos?
Criámos a tal empresa "Friends & Company" e o Sporting lançou nessa altura as escolas de futebol Academia Sporting e nós fomos um dos primeiros a ter essa oportunidade. Criámos aqui em Corroios esse espaço para atletas fora do Sporting e começamos a partir daí esse caminho.

Na área de treino?
Não, eu estive sempre mais na área de gestão. Nunca tirei o curso de treinador e acho que ser treinador é uma profissão muito igual à de futebolista, para pior. Ou seja, é 24 horas sobre 24 horas a pensar no futebol e eu não quero. Por isso estou na parte de gestão. Mas claro que quando há necessidade, porque os treinadores aqui estão por gosto, nós conseguimos pagar a gasolina... Às vezes há um treinador que sai e meio da época e em vez de estar a substituir então eu acabo por preencher essa lacuna. Mas do que gosto mesmo é do jogo, isso é que motiva, porque é tentar passar alguma das vivências que temos, corrigir os atletas, o jogo.

Deixou os estudos em que ano?
Quando estava no Benfica, no 12º ano, não terminei.

Quando foi pai pela primeira vez?
Eu tenho dois filhos adoptados. Eu e a minha esposa não tivemos filhos biológicos.

Por opção?
Não, por outras situações. Não deu. Temos o Nelson, de 11 anos, e a Maura, que tem 6.

Adoptaram há quanto tempo?
Ambos vieram para nós com seis meses de vida. Portanto, há 10 anos e meio e há cinco anos e meio. É fantástico. É das experiências mais bonitas. Uma das coisas que me deixa mais feliz é que ambos são de cor negra, o Nelson de descendência angolana e a Maura cabo-verdiana, e as pessoas olham para eles e dizem que são muito felizes.

Eles já fizeram as perguntas difíceis?
O Nelson tem uma noção melhor, porque fez o acompanhamento da irmã, mas não faz muita questão de falar. A irmã tem uma forma diferente de estar, ela é mais curiosa, mais faladora. Ela pratica desporto, está na ginástica acrobática de competição e é normal que alguns miúdos perguntem porque é que ela é de cor diferente dos pais. Obviamente eles sabem que são adoptados. A família e os amigos têm ajudado também desde que eles chegaram, há sobrinhos meus que sobre a Maura já perguntaram por que é de cor diferente, do Nelson nunca perguntaram. São dois filhos fantásticos. São muito apegados a nós.
É crente?
Não posso dizer que seja crente a 300%, porque a vida também me tirou algo, estar com o meu pai mais tempo. Eu tinha 14 anos e ele 35 quando faleceu.

Faleceu como?
De cancro. Começou na perna, os médicos tentaram resolver mas passados uns anos voltou. Apareceu quando eu tinha oito, nove anos e depois mais tarde. Eu passava muito tempo no futebol e não tive muita noção. Só quando ele faleceu.

Do que sentiu mais falta depois dele falecer?
Acima de tudo da presença dele. A minha mãe acabou por ser uma super mulher que teve de fazer os dois papéis com três filhos. Tinha na altura o talho e a churrasqueira que o meu pai tinha criado. Foi difícil para ela.

Foi para lá ajudar muitas vezes?
Eu não tanto, agora o meu irmão... Tenho a noção de que posso tê-lo prejudicado porque ele também tinha alguma capacidade no futebol e na altura como era o mais velho, teve de participar na parte familiar.

Ele ainda jogava nessa altura?
Jogava, jogava aqui no Amora. Ele esteve no Sporting e no Belenenses, só que o meu pai precisava de ajuda e o meu irmão teve de vir jogar para mais perto e veio aqui para o Amora.

Nunca teve problemas com nenhum pai?
Não, há sempre uma explicação para as coisas. Há o contexto do clube, do treinador, dos atletas. Mas é verdade que o grande problema do futebol hoje tem a ver com as pessoas que estão fora do campo. E já houve reportagens sobre pais que agridem treinadores. Tento sempre que eles perceberam que isto é um caminho, uma forma dos filhos fazerem desporto e de ter amigos, de perceber que há regras.

Vi que é apoiante do PCP, aqui no Seixal?
Acima de tudo o meu apoio tem a ver com a dinâmica que temos criado aqui. A junta de freguesia tem sido um motor de apoio ao nosso desenvolvimento. Quando fazemos aqui um torneio, a Câmara apoia. Há um movimento de toda a gente e toda a gente acaba por beneficiar do crescimento do Amora FC. Acho que é legítimo da minha parte apoiar as pessoas que nos têm apoiado, mas não sou filiado em nenhum partido.

Para terminar, não tem mais nenhuma história que possa contar?
Lembro-me de uma. Quando deixei de jogar à bola fui fazer um jogo de veteranos. Quando cheguei ao campo vi que só tínhamos 10 atletas. Reuni o grupo e disse, vamos entrar a jogar assim, não vamos dizer nada à outra equipa e quando chegar o colega que falta, entra, é tranquilo. O que imaginei? Como tínhamos uma equipa forte, se fossemos dizer que tinhamos menos um eles podiam galvanizar-se. Começamos um bocado retraídos, marcamos um golo, mas sempre com menos um e eles sem darem conta [risos]. Quando chega o colega que faltava, abeira-se da linha e pergunta se tem de sair alguém. Um colega responde: “Não, entra”. E nisto a equipa adversária para toda: "Não. Então? Vão jogar com mais um?” E nós: “Com mais um não, que nós temos estado a jogar com menos um”. E eles: “Está bem está, se com menos um é assim…” Levaram uma tareia [risos]."