quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

O jogo das emoções

"Um Benfica-Sporting (ou um Sporting-Benfica) continua a ser o duelo que gera mais emoções, que mais faz acelerar os corações dos adeptos e o que mais histórias tem para contar. O dérbi eterno irá hoje conhecer mais um capítulo, num jogo onde nunca existe favorito e cujo desfecho tem sempre a capacidade de deitar por terra os prognósticos que parecem mais óbvios. É esta a magia de qualquer confronto entre os velhos rivais.
É também por isso que um jogo entre Benfica e Sporting tem igualmente a responsabilidade de ser um exemplo para o desporto nacional, em geral, e para o futebol, em particular. A grande festa que é este dérbi merece ter lugar num clima saudável, com total fair play e desportivismo.
Estamos certos de que será isso, uma vez mais, que irá acontecer. O Benfica já marcou presença na final do Jamor por 38 vezes (26 vitórias), enquanto o Sporting chegou lá em 28 ocasiões (16 vitórias). 
Em 2019, só um deles vai lá estar, mas isso apenas iremos saber a 2 de Abril, dia em que se disputa a 2.ª mão da meia-final que hoje arranca. Vão ser 55 dias até que regresse a emoção do dérbi dos dérbis. É muito tempo, sim, mas há jogos pelos quais vale sempre a pena esperar.

PS: Jorge Andrade, ex-jogador do Estrela da Amadora, do FC Porto, do Deportivo da Corunha e da Juventus (e que, infelizmente, terminou a sua carreira demasiado cedo em virtude de graves lesões sofridas), fez um comentário na RTP3, onde colabora há vários anos, que merece o mais veemente repúdio. O antigo internacional português disse ‘apenas’ isto: “Eu, se ainda jogasse, dava só um pisão no João Félix e não havia mais João Félix durante o jogo. E aí tinham que recorrer a outro estilo de jogo.” Uma declaração lamentável e que merece ser melhor explicada pela Direcção de Informação da RTP."

«Se ganhar o Sporting ninguém fica chateado»

"Para quem já havia 'enterrado' o Benfica e glorificado o Porto, esta segunda volta promete...

1. O futebol é a soma (nem sempre aritmética) de momentos bons e maus. Como diz Bruno Lage, o futebol é presente. Passa-se de um estado de euforia à depressão e desta à exaltação (e vice-versa) num abrir e fechar de olhos. Por isso, nem excessos a mais (passe o aparente pleonasmo) num momento positivo, nem defeitos a mais num momento negativo. É sempre uma atitude de sensatez refrear entusiasmos face ao céu limpo e brilhante, como saber relativizar nuvens que, tarde ou cedo, anunciam desalento.
O certo é que há presentes mais (des)iguais do que outros. Escrevo depois da saborosa, justa e escassa vitória do Benfica contra o seu histórico rival lisboeta e nacional e do percalço do Porto em Guimarães. Falo de um presente que hoje já é passado, ainda que de boa memória e espero por um futuro que amanhã será presente (novo jogo, agora para a Taça). Quanto ao passado, importa registar que, em Alvalade, o Benfica igualou o número de vitórias da equipa leonina (32), enquanto, jogando em casa, a diferença é avassaladora (46 contra 15). Aliás, nos últimos dez anos, o SLB só uma vez foi derrotado em Alvalade (em 2012).
O sempre ungido Sérgio Conceição, na antevisão do Vitória - Porto, resolveu falar do dérbi lisboeta. E disse: «Dérbi? Se ganhar o Sporting ninguém fica chateado». Pois é, a amizade entre dragões e leões está acima de tudo, mesmo depois dos amuos na final da Taça da Liga. Eu que não passei procuração a Conceição e pertenço ao grupo dos ninguém agradeço, enternecidamente, a petite provocation do mister. Afinal no fim do dia, como agora sói dizer-se em estilo anglo-elitista, foi o técnico portista que ficou chateado, assim reduzindo a pó o ninguém que, afinal, é alguém.

2. Categórica exibição do Benfica, que até me fez lembrar a que há 25 anos resultou num mágico e inesquecível 6-3, agora com João Félix a emular o então encarnado João Pinto.
Um clássico com 6 golos (escassos os do Benfica face à superioridade incontestada) já não se via há muito. Pelo contrário, andávamos a ter que gramar os 0-0, 1-0, 0-1, ou, mais esparsamente, uma goleada de 2 golos. Que belo jogo em Alvalade, sem calculismos paralisantes, sem tacticismos cinzentos, sem quezílias despropositadas, sem o monopólio anestesiante e entediante do futebol só jogado a meio-campo! Basta compará-lo com os jogos de amizade SCP - FCP onde para ninguém perder, ninguém ousa ganhar.
E, desta vez, não há sequer o pretexto ou desculpa da arbitragem. Isso apesar de - no que seria o segundo golo do SLB e primeiro de J. Félix - até se poder perguntar como é que Artur Soares Dias, a um metro da vista, achou que não havia falta (até esbracejou para a jogada seguir) e, a mais metros no nonitor, mudou de opinião. Mesmo admitindo que foi falta, pergunto: por que razão aqui se anula o golo e em duas faltas bem mais notórias no Porto - Benfica da Taça da Liga, o VAR e o árbitro decidiram por uns miminhos portistas. Onde está a equidade do critério?

3. Jogaram ou sentaram-se nos bancos das duas equipas 14 jogadores portugueses: o Benfica com 8, o Sporting com 6. E, no Benfica, houve 5 atletas recente e directamente vindos da formação.
Há coisas que para um leigo embora atento, como eu, custam a compreender. Ver Samaris como suplente de suplentes no consulado anterior, observar Gabriel antes inconsequente centro-campista, agora consistente médio e, sobretudo, durante semanas a fio, ver jogar João Félix fora de posição nuns esparsos e esmolares minutinhos.
Bruno Lage tem sido uma boa surpresa, até nas conferências de imprensa. Alguns dos jornalistas sempre presentes nessas liturgias mediáticas ficam ser o brinquedo com os que adornam perguntas lapassianas, tontas, deslocadas ou armadilhadas. E porquê? Porque Lage responde de um modo enxuto: 10, 15 segundos, sem adiposidades, sem redemoinhos palavrosos, em suma e em inglês, em estilo shot. Fala de futebol e não do que não é para lá chamado, explica opções técnicas, não perde tempo com elogios hipócritas à outra equipa ou críticas mordazes às arbitragens (mesmo que, como na Taça da Liga, fosse quase irreprimível). Como ele tem repetido, em futebol não lhe interessa o se, que é o refúgio dos indecisos ou medrosos. «O jogo com o Sporting vai ser uma final» disse na antevisão do dérbi, assim arriscando e se esquivando à treta de «é apenas mais um jogo, só vale 3 pontos», etc., etc. «Jonas e Fejsa estão convocados?» Resposta com um só vocábulo: «Não». Outros diriam blá, blá, blá, amanhã saberão, etc., etc. «Castillo e Ferreyra fazem falta?». Responde: «Não foi o senhor que a semana passada me perguntou sobre o Jonas e nada disse sobre os que agora refere?». De um visionário jornalista: «Como é que jogando em 4-4-2 os dois sul-americanos foram dispensados?», a que B. lage respondeu ensinando: «4-4-2 quer dizer 4 na defesa, 4 no meio -campo e 2 avançados. Ouviu? Falei em avançados e não de pontas-de-lança. E tenho 5 avançados» (o jogo em Alvalade ilustrou bem esta ideia=.
Temos treinador. Não se deslumbra com cada dia presente, nem esmorece com momentos negativos. Não está à frente da equipa por «ter mau perder». Prefere sempre a serenidade, ganhando ou não, sem tiques vedetistas, vozeirões exaltados ou afirmações subliminares.

4. Antes desta última jornada, o Benfica estava na iminência do intervalo de (-8 pontos, -2 pontos) atrás do FCP e (+2 pontos, +8 pontos) à frente do SCP. No fim dos jogos, ficou a 3 do Porto e com 8 (em bom rigor 9) de avanço sobre os leões. Jornada muito positiva que tem três consequências:
a) o Benfica volta a depender de si próprio para se sagrar campeão;
b) a luta para o título e 2.º lugar de acesso às eliminatórias da Champions está limitada ao Porto, Benfica e - é bom não esquecer - Sp. Braga que, por acaso, até recebe os seus directos concorrentes;
c) considerando os jogos teoricamente mais difíceis, o Benfica já jogou com o Vitória e o Sporting (faltam FCP e Sp. Braga), o Porto apenas com o Vitória (faltam Sp. Braga, Benfica e SCP) e o Braga ainda não enfrentou nenhum destes adversários. Vale o que vale, até porque nem sempre é nesses jogos que se perdem pontos decisivos. Foi ocaso da primeira volta do Benfica, com 11 pontos (!) perdidos com Chaves, Belenenses, Moreirense e Portimonense. Enfim, para quem já havia enterrado o Benfica e glorificado o Porto, esta segunda volta ainda promete...

5. Não havia necessidade... refiro-me à oportunidade da entrevista do presidente do Sporting na televisão pública. Pelo menos, no que diz respeito às suas declarações sobre o Benfica e seu presidente, em vésperas do grande débi. Felizmente, do lado do SLB, imperou o silêncio, antes e depois do jogo. Admito que, numa fase menos boa do clube - que, apesar de tudo, emergiu de uma gravíssima crise com os menores danos possíveis - despender parte significativa da entrevista falando do rival é fácil, é barato (embora não dê milhões), a turba aprecia, o (seu) povo aplaude e os problemas internos ficam a marinar. Esta pan-obsessão pelo Benfica é patológica. Do lado dos rivais, fala-se mais do Benfica do que dos próprios clubes! E sempre com o moralismo de como se tudo neles fosse imaculado, sem processos, sem pressões e de uma respeitabilidade à prova de bala...

6. Encerrou mais um mercado de Inverno. Menos entusiástico e chorudo do que em anteriores épocas. Por cá, esta janela mercantil foi aproveitada de diferentes maneiras: o Benfica a despachar monos ou decepções e a promover jovens; o Sporting surpreendentemente endinheirado ou avançado em receitas futuras a comprar hipóteses de maravilhas e diamantes por lapidar; o Porto, num misto de entradas, saídas e regressos, tentando não repetir os erros do Inverno passado em que se craques vieram, dispensados saíram.
É bom chamar jogadores da equipa B que têm dado boas provas e podem ser muito úteis na equipa principal: Ferro, Jota, Florentino e Zlobin. Assim se dá seguimento a uma política de formação sustentada. Poupou-se na folha salarial e dá-se oportunidade a jogadores promissores e conhecedores da grandeza do clube. É assim que entendo a razão de ser da equipa B: a de haver uma intercomunicabilidade não apenas ocasional, mas sistemática entre ela e o plantel da equipa principal.

Contraluz
- Espectáculo:
Agora que a Liga Espanhola anda mais arredia da televisão, pude voltar a Espanha por via da Taça do Rei. E logo para assistir a esse formidável Barcelona, 6 - Sevilha, 1. Um regalo para quem gosta de futebol e um hino à sua beleza que nos faz esquecer as diatribes e parvoíces do nosso caseiro futebol.
- VAR:
Como é possível o árbitro (e sobretudo o VAR) ignorarem um penálti descarado a favor do Feirense contra o Vitória de Guimarães! Uma bola cortada com o braço que até um cego veria, é ignorada e, pior do que isso, justificada gestualmente pelo árbitro como tendo batido na barriga (!) do infractor! Uma coisa é a inevitabilidade do erro, outra bem diferente é o atropelo completo à verdade, ao bom senso e à justeza numa situação que não oferece um milésimo que seja de dúvida."

Bagão Félix, in A Bola

De Alvalade à Luz e os 298 do Bonfim

"A propósito do dérbi de hoje, a história ensina-nos que os 4-2 do Benfica ao Sporting em Alvalade pouco importam para logo à noite. Recuemos à época de 1985/86 e aprendamos alguma coisa sobre a especialidade dos jogos entre os eternos rivais. Nessa temporada, a 12 de Março, o Sporting foi à Luz perder por 5-0, para a Taça de Portugal (e se não fosse a inspiração do divino Damas nessa tarde chuvosa...); um mês depois, a 13 de Abril, os leões, já fora da corrida pelo título, voltaram ao anfiteatro das águias, para a partida da penúltima jornada do Campeonato. E triunfaram por 2-1 (ao Benfica o empate chegava para ser campeão), entregando o título ao FC Porto, que assim se classificou para a Taça dos Campeões de 1986/87, que viria a vencer.
A dinâmica do dérbi tem vida própria, os jogadores sentem de forma particular estes momentos e o Sporting apresentar-se-á hoje na Luz, apesar das limitações de uma época que devia ser vista apenas como ano zero, qual leão ferido e por isso muito mais perigoso. O Sporting joga pela honra e mal do Benfica se pensar que hoje é o prolongamento do último domingo...

PS - Estiveram no estádio do Bonfim, na noite da última segunda-feira, a assistir ao Belenenses SAD - Moreirense (sétimo contra quinto da I Liga), 298 espectadores. Estará tudo a fazer de conta (especialmente a Liga de Clubes, que devia corar de vergonha por tão triste imagem do futebol profissional que tutela!) que não percebe que estamos a assistir a uma das maiores trapalhadas do desporto português, uma deriva em forma de fuga para a frente que já provocou danos irreparáveis e tem tudo para acabar mal?"

José Manuel Delgado, in A Bola

Travesti

"1. No Sporting bem podem mudar os protagonistas (presidente, treinador, jogadores...) que o clube continua a parecer aqueles automobilistas que num engarrafamento estão sempre a mudar para a faixa que parece fluir melhor, num efeito placebo de mobilidade.
2. Com timing despropositado e conteúdo requentado, o ataque de Frederico Varandas ao Benfica e a Vieira transformou-o num zombie daquilo que prometeu ser. Querer afirmar-se pelos ataques ao rival faz tanto sentido como um aluno querer ter boa nota por denunciar o colega com cábulas.
3. No campo, a equipa tem sido, nos últimos tempos, um travesti futebolístico em relação à génese Keizer, que prometeu o romantismo de Nicholas Sparks e oferece o terror de Stephen King.
4. Já o Benfica de Lage (até agora agradável surpresa, até no discurso) mostrou em Alvalade a simbiose perfeita entre uma colónia de formigas (a defender) e uma manda de elefantes (a atacar).
5. «O Benfica tem dado suficientes provas da sua preocupação com os interesses da indústria», podia ler-se numa newsletter do Benfica, no intervalo dos tweets incendiários e afins. Quando Valdimir Putin diz que o rap contribui para a degradação da sociedade russa, pelo menos não o faz vestido de Eminem.
6. A julgar pela lucidez, bom senso e visão na entrevista que li, algumas pessoas do Benfica devem tomar dois Domingos Soares de Oliveira por dia, de 12 em 12 horas, após as refeições.
7. O português de Ristovski não chega para dar conferências de imprensa, mas é suficiente para cantar Ena Pá 2000.
8. Pinto da Costa a falar em «regresso às tristes figuras de quem não tem a dignidade de reconhecer que o adversário foi mais forte» é como Iron Maiden a cantar música de coro de igreja.
9. João Félix tem 19 anos, mas cara de 9 e maturidade de 29. Tem a velocidade dos Super Wings, o faro da Patrulha Pata e a fantasia dos PJ Masks, mas o que impressiona mais é não ser um desenho animado."

Gonçalo Guimarães, in A Bola

Os directores de comunicação dos mais titulados - Um modo de actuar


"Confessamos que, apenas, gostamos de falar de futebol e dos seus aspectos positivo.
Porém, também, sabemos que almejamos um papel que temos de denunciar e brandir as injustiças que vamos percepcionando, por esse futebol fora.
A história conta-se em poucas palavras.
No passado Domingo, numa bola dividida com Herrera a meio campo, o avançado do Vitória SC, Alexandre Guedes caiu.
Imediatamente assistido, toda a gente que assistia ao desafio percebeu que a situação era melindrosa, com o jogador a necessitar de imediata assistência.
Por essa razão, foi dada, no momento, ordem de substituição do atleta, que saiu do estádio de ambulância para o hospital.
Viria mais tarde a saber-se que existia uma suspeita de traumatismo crânio-encefálico e que o jogador, por essa razão, não poderia continuar em campo.
Porém, apesar de todas as pessoas saberem que um atleta nestas condições não está capacitado para competir, há uma nova figura do futebol português, que parece capaz de subverter todos os protocolos médicos, demonstrando uma sapiência acima da média.
Falamos dos directores de comunicação dos clubes mais titulados que tudo sabem, que tudo opinam e que, em duas palavras três incendeiam o futebol português.
Depois da situação que ocorreu no estádio, Francisco J Marques, director de comunicação de FC Porto, teve o desplante de dizer que "uma coisa é recorrer a todos os meios legítimos para tentar parar o adversário, outra coisa é ultrapassar os limites e contar com a benevolência das equipas de arbitragem. Em Guimarães temos dois lances para mostrar que ilustram isso muito bem, o primeiro do Guedes, que choca com as costas do Herrera, fica a queixar-se do lábio e é assistido na cabeça, tendo de sair de maca. O FC Porto é uma equipa de intensidade elevada e isso causa desgaste. Esta paragem serviu para parar o jogo. Mais de três minutos de paragem a meio da segunda parte é impensável. Quebrou o ritmo e deu oportunidade de recuperar o fôlego numa altura de pressão do FC Porto. Não se tratava de nenhuma lesão grave. Este tipo de coisas, juntamente com as faltas sucessivas, demorar a marcar o pontapé de baliza, são sempre situações em que os árbitros têm de estar atentos. Isto está a ser utilizado como estratégia."
Ora, vejamos o que passa para a opinião pública e para os adeptos que não viram o jogo. Imediatamente que houve uma estratégia para estragar o desafio, com um jogador fiteiro.
Porém, num acesso de má fé, esqueceu-se de passar o resto da informação e que sabia: que o jogador foi levado para o hospital.
Quanto às perdas de tempo, mais uma vez, esta nova figura do futebol português demonstra outra característica: habilidade em seleccionar factos. A assistência a Guedes é um acto de perda de tempo... e a de Marega que demorou um tempo similar, não foi perda de tempo? E não terá sido esse momento em que o ritmo de jogo se esvaiu?
Infelizmente, o futebol português, na sua espiral regressiva, deu guarida a este tipo de figuras, a que poderíamos chamar de bonecos de ventríloquo. Tudo sabem, tudo dizem, mas raramente com opinião própria...simplesmente, são usados porque se forem castigados em nada afectam os clubes dos quais são assalariados.
E, enquanto, tiverem tempo de antena assim continuarão a degladiar-se entre eles, numa curiosa pugna de quem berra mais alto e quem mais conhecimentos tem das diversas ciências, para além da futebolística...neste momento, J Marques tomou a dianteira na da medicina, pois conseguiu ver a "olho nu" o que os médicos do Hospital precisaram de descobrir através de uma tomografia axial computadorizada...
Sinais dos tempos!"

Pobreza de espírito, pobreza de mentalidade!

"Após o Vitória- FC Porto de ontem à noite, Wakaso foi o vitoriano escolhido para as declarações na flash interview. O médio ganês do Vitória ainda sente dificuldades para se exprimir em português, todavia fez um notável esforço para se exprimir na língua de Camões em frente às câmaras de televisão. Certamente um momento stressante para alguém que não está habituado a fazê-lo, ainda por cima num idioma que não é o seu. Wakaso teve uma atitude de coragem e de se lhe tirar o chapéu. Contudo nem toda a gente partilha desta opinião. No final da entrevista, os locutores da TSF afirmaram que é inadmissível o jogador ainda não falar português após tantos anos em Portugal. Para colocar a cereja no topo do bolo, um dos locutores disse que falta saber se Wakaso sabe falar a própria língua.
São declarações tristes, ainda por cima num órgão de comunicação social que deveria ser de referência. Vivemos em pleno século XXI num mundo cada vez mais global e que exige capacidade de adaptação, mas também capacidade de compreensão.
Compreensão essa que nem toda a gente é capaz de ter. Ou porque têm palas nos olhos, ou porque nunca sairam do conforto do lar ou porque nunca alargaram os horizontes. Ou simplesmente todos estes factores.
Por isso pedimos a todos os Wakasos desta vida que falem, que se exprimam e que não se escondam. E que nunca tenham medo de errar, porque após cada erro há sempre uma lição e uma aprendizagem. E assim, os pobres de espírito e de mentalidade reduzida serão sempre derrotados.

ADENDA:
Em meu nome pessoal, mas principalmente como editor de Desporto da TSF, quero pedir desculpa ao Wakaso e a todos os sócios e adeptos do Vitória Sport Clube. Foi um momento infeliz da nossa parte e que, definitivamente, não deveria ter acontecido. Tratarei de, eu próprio, ir ter com o Wakaso para lhe pedir desculpa. Este pedido de desculpa não é só meu. É de toda a equipa de Desporto da TSF. Deixo ficar um grande e forte abraço para todos os Vitorianos. Um abraço que espelha a estima, consideração e admiração que tenho pela enorme instituição que é o Vitória Sport Clube. 
Comunicação, em adenda, enviada pelo director da TSF, João Ricardo Pateiro."

Tudo o que influenciou o dérbi da Liga e o que deverá decidir o dérbi da Taça (a análise tática do Sporting-Benfica)

"Sporting: O que corrigir para ser mais forte?
Controlo de cruzamentos
Este tem sido uns dos principais problemas defensivos do Sporting de Marcel Keizer. No domingo, em Alvalade, o primeiro golo do Benfica demonstrou isso mesmo: linha defensiva do Sporting totalmente desalinhada e pouca protecção da baliza aquando do cruzamento de Grimaldo.
De outro ângulo, é possível perceber também que a distância (em largura) entre os dois centrais é muito grande, o que acaba por facilitar muito a finalização de Seferovic. André Pinto encontrava-se muito longe do avançado do Benfica, e nem sequer o conseguiu incomodar no momento do cabeceamento.
No jogo de logo à noite, é de prever que a equipa de Bruno Lage volte a procurar tirar partido dessa debilidade defensiva do Sporting, através de combinações nos corredores laterais, para posterior cruzamento para zonas de finalização.

Desarticulação da linha média
Se o Sporting quiser sair da Luz com um bom resultado, é fundamental que não volte a conceder tanto espaço dentro do seu bloco defensivo. Foram vários os momentos em que o mau posicionamento da linha média permitiu ao Benfica chegar com facilidade ao espaço à frente da linha defensiva.
No segundo golo do Benfica, um exemplo disso mesmo.
Os posicionamentos interiores dos extremos benfiquistas e, principalmente, de João Félix, certamente voltarão a ser uma constante no processo ofensivo encarnado, com o Benfica a tentar explorar o espaço que o Sporting possa conceder nessa zona do campo.

Fase de construção
No momento ofensivo, os problemas na fase de construção voltaram a ser bem visíveis e, se se mantiverem na Luz, dificilmente o Sporting chegará muitas vezes com qualidade às zonas de finalização.
A falta de paciência em zonas recuadas e a pouca capacidade para entrar com a bola controlada no bloco do Benfica resultaram em muitos passes longos para a frente, com pouco ou nenhum critério. 
Nos momentos em que o Sporting tentou jogar apoiado, nem sempre os posicionamentos foram os mais correctos e, por isso, as dificuldades em dar seguimento aos lances foram enormes.
A excessiva distância entre elementos e a pouca ocupação do espaço entre a linha média e a linha defensiva do Benfica foram alguns dos “pecados” do Sporting no dérbi passado, que em muito contribuíram para uma prestação tão fraca a nível ofensivo.

Benfica: O que evitar para voltar a dominar?
O Benfica - que praticamente não passou por dificuldades nenhumas em organização defensiva no jogo de domingo - terá de reduzir ao máximo as perdas de bola que possam originar transições rápidas do Sporting.
A equipa de Bruno Lage tem de evitar que Samaris receba a bola de costas para os médios do Sporting - que são muito rápidos a pressionar pelo lado cego –, porque será fundamental que o Benfica não perca a bola em zonas comprometedoras.
Se o Benfica condicionar a primeira fase de construção do Sporting, estará certamente muito mais confortável em organização defensiva, uma vez que o Sporting tem demonstrado uma grande incapacidade para sair a jogar quando sofre uma pressão mais alta.
No seu meio-campo defensivo, as marcações individuais dos laterais do Benfica aos extremos do Sporting poderão ser um factor de desequilíbrio defensivo. Apesar do Sporting não ter tirado proveito disso no último jogo, André Almeida apareceu várias vezes no corredor central, atraído por Nani. 
Tendo em conta o último jogo e o momento actual das duas equipas, é de esperar um Benfica com mais bola, e a pressionar em zonas mais altas, de modo a condicionar a primeira fase de construção leonina.
O Sporting, por sua vez, deverá posicionar-se num bloco médio, com o objectivo de estar sempre compacto, e esperar pelo momento da recuperação da bola para sair rápido para o ataque."

(...) e o dérbi de há 17 anos que o deixou sem dormir: "Há sempre alguém que me fala no Jardel. Errei forte e feio. É a minha cruz"

"15 de Dezembro de 2001. 21 horas.
Noite fria. Emoções ao rubro. Jogava-se mais um dérbi entre os grandes de Lisboa.
A pouco mais de uma semana do Natal, todos os caminhos iam dar ao (velhinho) Estádio da Luz. 
Setenta e cinco mil almas enchiam as bancadas com cor, alegria e muito entusiasmo. Verde e branco de um lado, muito vermelho do outro.
Mas já lá vamos. Antes de recuperar essas memórias, recuemos dez anos.
Tirei o curso em 1991. Um acaso levou a outro e lá fui parar, a uma sala da AFL e que ainda hoje existe, na Rua dos Fanqueiros. Caprichos da vida: um madeirense de gema, que chegara ao continente dois anos antes, acabou por tornar-se num árbitro lisboeta.
A acção demorou cerca de um mês, mais coisa menos coisa. Lá aprendi a teoria toda, pela voz, saber e experiência de nomes históricos da arbitragem nacional.
Apesar do empolgamento das aulas, a verdade é que nunca me passou pela cabeça arbitrar jogos de futebol. O que eu queria mesmo era conhecer as regras, perceber os porquês e os comos. Queria ter legitimidade para criticar. Queria poder opinar de forma avalizada.
Como adepto, nunca fui doente, irracional ou desvairado. Nunca sofri, nunca me desgastei ou chateei. Em minha casa, éramos todos assim. Saudáveis.
O que eu gostava mesmo era de jogar à bola. Cada garagem, cada portão, cada cantinho servia de baliza. Depois era só enrolar umas quantas folhas de papel, chamar a malta e pronto. Começava o jogo. O mesmo que acabava mal chegava a histérica da vizinha aos gritos, a refilar com tudo e com todos. Desmancha prazeres.
Aos domingos à tarde ia para o quintal e fechava para obras. Colava os ouvidos no rádio e devorava aquelas tardes desportivas bem ritmadas, à espera daquele momento em que a voz potente e sem rosto gritava "Gooooooooloooo"!
Dez, quinze segundos de suspense e incógnita! De expectativa, de pura adrenalina: "De quem foi, de quem será?", perguntava-me. Era qualquer coisa de fantástico...
À noite, não ia para a cama sem ver o resumo de todos os jogos, até mesmo daquele que vinha de Chaves e chegava quase sempre de madrugada. Caía de sono, pois claro... mas esperava. Esperava sempre.
Terminei o curso de árbitro e convenceram-me a experimentar. A fazer um jogo. Só um.
E lá fiz. Fiz um. Depois mais um. Depois outro. E depois... mais dois mil.
O medo deu lugar ao gozo. A timidez abriu portas à vontade. Passei a gostar daquilo. A gostar muito. 
Era paixão, pura paixão. A mesma que tem o jogador que joga com um sorriso genuíno ou o adepto que vibra com o clube do coração.
Nos anos seguintes, dediquei-me de corpo e alma e fiz o meu caminho. Jogos após jogo, aqui e ali, em todos os cantinhos do distrito. Foi uma escola dura mas fundamental no meu crescimento.
A subida à primeira categoria foi rápida. Demasiado rápida para o que era suposto.
Pelos intervalos da chuva, fui bafejado pela sorte e por um contexto em que prevalecia a necessidade de haver "sangue novo". Em apenas seis épocas, cheguei ao escalão maior do futebol português. 
Tinha vinte e quatro anos. Vinte e quatro anitos. Um pequeno peixinho num aquário cheio de tubarões.
Percebi que estava completamente fora dela quando, no primeiro curso de abertura de época, preparava-me para entrar na sala onde estavam os árbitros principais e o (então) presidente mandou-me para a dos árbitros assistentes. Não me conhecia...
De volta à noite memorável de 2001.
O grande jogo da Luz, o meu primeiro grande teste, surgiu por capricho do sorteio. Era assim, na altura. As bolinhas é que escolhiam porque os homens não confiavam nos homens (psssiiuuu... os árbitros eram os mesmos, sorteados ou nomeados, mas não lhes digam nada).
A nível desportivo, a fase era boa, muito boa. Tinha acabado de ser indicado à FIFA e sentia-me feliz. Aos vinte e oito anos e em vésperas de receber as insígnias de internacional, preparava-me para arbitrar aquela que seria a partida mais mediática e sonante da carreira. Nem eu sonhava quanto. 
Lembro-me que quase não dormi nos dias anteriores. Estava expectante, ansioso, nervoso até. Nunca na minha vida arbitrara um jogaço daqueles, com tanta gente a assistir, com tanto impacto e mediatismo.
Estava deslumbrado.
Foi o jogo mais longo da minha vida e hoje, mais de 17 anos depois, sinto que ainda não acabou. 
Aqui e ali, há sempre alguém que me fala no Jardel. No famoso Jardel.
Cada um tem a sua cruz e essa é a minha.
Essa enorme infelicidade faz emergir uma verdade inabalável: a memória do adepto pode ser muito apurada e selectiva. É incapaz de se lembrar do que comeu ao pequeno-almoço mas jamais se esquecerá do erro cometido ao minuto oitenta e quatro de um jogo realizado há tantos, tantos anos. 
Quanto ao lance em si, não tem história. Errei. Errei forte e feio.
O enganador diz que fez o seu trabalho, logo o enganado é corrupto. Dizem que faz parte. Está bem então.
Em boa verdade, bem antes desse minuto fatal, já eu estava perdido em campo.
Amarelos atrás de amarelos, um vermelho directo, péssima gestão de emoções e dois lances nas áreas que decidi na dúvida e que ainda hoje vejo como (muito) suspeitos: um, na área encarnada, a envolver Argel... e o penálti assinalado por alegada mão deliberada do Beto. Humm...
Certo, certo é que foi demasiado jogo para tão pouco árbitro. Estava verde. Não estava preparado para um espectáculo com aquela dimensão, com protagonistas de luxo e fiz, de facto, um péssimo trabalho.
VAR, VAR... onde andavas tu?
Uma das poucas memórias positivas que guardo dessa noite foi a da postura, educação e respeito que recebi de Robert Enke. Um senhor, antes, durante e depois das incidências.
Há pessoas tão superiores à vida que só o Céu as sabe entender.
Depois desse, outros vieram, por cá e lá fora. A carreira fez-se, mas sempre com essa pedra no sapato.
Mas o futebol evoluiu e hoje há outras condições, mais preparação e muitos mais meios. Os árbitros chegam mais tarde ao topo, com outra experiência na base e estão cada vez mais bem apetrechados, física e teoricamente. Estão também habituados a este frenesim mediático. Este é o seu métier. 
Espero, sinceramente, que mais logo possamos todos assistir a um verdadeiro espectáculo dentro de campo e fora dele. Os ingredientes são de luxo e as atitudes dependem de cada um.
Uma certeza: o Jardel não estará por lá. Graças a Deus!!"

Ainda vamos ter muitas saudades de Rui Vitória

"Luís Filipe Vieira sugeriu, na entrevista a Cristina Ferreira do início de Janeiro, que “as pessoas ainda vão ter muitas saudades” de Rui Vitória. Tem razão. Os rivais todos os dias rezam pelo seu regresso.

Rui Vitória abandonou o comando do Benfica no início do ano e já se sente a falta do mister de Alverca do Ribatejo. Há um legado que não se apaga de um dia para o outro, mas convenhamos que o seu sucessor tem feito por rapidamente destruir toda uma herança ruivitoriana que tinha vindo a tornar-se na imagem de marca dos confrontos do Benfica com os adversários directos.
O Benfica venceu o Sporting, é certo. Contudo, é-me difícil entender estas ideias de futebol revolucionárias do treinador que veio a substituir o saudoso Rui Vitória, Bruno Lage (Ou Laje, segundo oráculos de diversos noticiários televisivos). Quer dizer, agora, de repente, é possível estabelecer um claro domínio em casa dos rivais ao ponto destes não encaixarem seis ou sete por mero acaso? Onde ficou o respeito pelas grandes equipas? Por que razão não fez entrar o segundo trinco aos 60 minutos de jogo? O que é feito da confiança cega nas garrafas de água mineral? A facilidade com que se derruba toda uma ideologia é, no mínimo, desconcertante.
Como benfiquista, não posso deixar de notar que Bruno Lage torna a minha vida bastante mais complicada. Os últimos meses de Rui Vitória forçaram-me a desligar da actualidade futebolística, a recusar-me a comentar o desporto, a ceder facilmente a compromissos que me impediriam de ver os jogos do Benfica (sem qualquer tipo de culpa ou mesmo sem aquela ansiedade galopante que se instala habitualmente quando estamos longe de uma televisão à hora do apito inicial). Bruno Lage veio acabar com essa paz espiritual.
Agora, que o meu clube infelizmente começa a apresentar um futebol irresponsavelmente atraente, sou obrigado a acompanhar o Benfica a par e passo. Lage faz com que perca preciosas horas de sono a rever lances, a visionar programas de comentário na televisão, a ler blogues e fóruns. Fica anotado que desperdicei toda uma segunda-feira nesse registo, pelo que suplico a Bruno Lage que se coíba de apresentar um futebol rendilhado na quarta-feira e que o Benfica, se possível, se exiba de forma apenas ligeiramente satisfatória. Afinal, quinta-feira é dia de trabalho e eu não tenho vida para continuar embevecido com um treinador.

Nota: esta crónica é um claro exercício de fanfarronice. O leitor terá todo o direito de me desprezar pela excitação desmedida que se infere que estou a sentir por causa de uma excelente exibição. Mas, se nos escusássemos de exibir descabida fanfarronice quando as coisas correm bem e de revelar luto, depressão e melancolia quando correm mal, o futebol talvez perdesse a sua razão de ser."

TPC para entregar na quarta-feira

"Terá sido bem mais doloroso para o corpo técnico do Sporting o visionamento do jogo de domingo do que seguramente para o homólogo do Benfica. Em contagem decrescente para o segundo take do derby no intervalo de quatro dias, essa análise detalhada será mais um instrumento de correcção de defeitos próprios do que a construção de um roadbook para tirar partido das fragilidades do adversário. E o raciocínio aplica-se aos dois. Porque mesmo quando se ganha com uma superioridade tão vincada, há ilações a tirar.
No bloco de apontamentos de Marcel Keizer haverá um par de tópicos assinalados a vermelho por estes dias. Comecemos pelas perdas de bola. Confrangedor talvez seja um adjectivo brando para rotular o que aconteceu em Alvalade nesse capítulo. Os números (22 perdas para o Sporting contra 12 do Benfica) não ilustram na totalidade o caudal de más decisões tomadas logo na primeira fase de construção, que não só não permitiram à equipa ligar sectores, como reduziram o espaço que o rival tinha de percorrer para alcançar a baliza de Renan.
A forte reacção do Benfica à perda não pode explicar tudo, a começar pelos gestos deficientes na saída como os que se viram a Jefferson, Wendel ou Gudelj. E a incapacidade de a equipa avançar em apoio tornou totalmente inconsequente (e inadequado) o posicionamento dos extremos, sempre abertos e muito altos na esperança de poderem surpreender o adversário em transição ofensiva. É verdade que o Sporting precisava (mais do que nesta quarta-feira, até) de correr riscos, sim, mas sem descurar os equilíbrios que só se alcançam com trabalho de laboratório.
Mesmo sem conseguirem construir com a qualidade que se exige, os “leões” estavam obrigados a dar outra resposta em organização defensiva, mas o que mostraram foi uma total ausência de controlo. Muito por culpa do entrosamento deficiente de um quarteto defensivo que não pode escudar-se nas mudanças forçadas (e foram logo três) para justificar comportamentos tão pobres. Desde a (incorrecta) colocação dos apoios dos centrais à (enorme) distância entre Coates e André Pinto, passando por um total desacerto na definição da última linha (Bruno Gaspar e André Pinto foram pródigos em colocar Seferovic ou João Félix em jogo), o desempenho sectorial foi um sobressalto permanente. E o preço a pagar foi elevado.
Foi como se Marcel Keizer tivesse recebido uma repreensão do professor na sala de aulas e fosse obrigado a um regime de trabalhos para casa (TPC) redobrados neste arranque de semana. Entre a vertigem ofensiva do início do mandato do holandês e a toada bem mais especulativa e inibidora que se viu na final a quatro da Taça da Liga, urge encontrar um ponto de equilíbrio, uma ponderação adequada de factores. Tal e qual um pneu, que deve ser gerido com a quantidade exacta de ar, sob pena de atrasar o andamento (pressão a menos) ou de ameaçar rebentar (pressão a mais). A esse respeito, o livro de especificações do treinador do Sporting precisa de sérias emendas.
Não é o único, porém. Entre os imensos indicadores positivos que o Benfica derramou sobre o rival, há riscos e lacunas a minimizar. As mais óbvias residem no corredor central do meio-campo, onde os dividendos decorrentes do aumento do nível de intensidade e dos metros que a equipa conquista aos adversários são muitas vezes comprometidos por falhas técnicas. Porque mais expostos (e essencialmente porque habitam numa zona-chave do terreno), Samaris e Gabriel terão forçosamente de reduzir os erros na execução (a recepção do grego no lance do primeiro golo do Sporting, por exemplo) para evitarem que a equipa se parta e seja obrigada a reposicionar-se rapidamente, num contexto de maior desordem. Assim como o trabalho de cobertura do espaço que sobeja nas costas de Grimaldo quando o Benfica avança para a organização ofensiva deve ser mais rigoroso para matar a sede de profundidade do rival.
Mais do que dores de crescimento, são riscos que Bruno Lage está disposto a correr para poder abafar o rival no seu meio-campo defensivo. E isso percebe-se até olhando para o modelo de jogo que o Benfica perfilha na formação, baseado numa construção apoiada logo a partir do guarda-redes, com o intuito de, mesmo sob pressão, sair a jogar de forma limpa desde trás. Os custos deste ideário ficaram bem patentes, por exemplo, no golo que o Benfica B sofreu diante do Mafra no passado sábado, na sequência de um erro crasso de Zlobin; os benefícios, esses, são visíveis na frequência com que a equipa chega com critério a zonas de definição (no derby de domingo, todos os 14 remates dos “encarnados” foram feitos dentro da área do Sporting).
Em comum, os dois rivais têm o selo de work in progress, porque nem Keizer, nem Lage gozaram ainda de tempo suficiente para consolidar alguns comportamentos. Mas não é essa também a condição permanente de uma equipa de futebol, um projecto eternamente inacabado?"

Um Varandas sem graça

"A mais sábia resposta que Luís Filipe Vieira poderia ter dado a Varandas foi não dar resposta alguma. Ignorou-o, pura e simplesmente

Frederico Varandas quis armar-se em engraçado através de uma estratégia de comunicação desajustada e até imprópria nos termos utilizados, mas acabou por não ter graça alguma, nem sequer imaginação, na medida em que se limitou a fazer eco de ideias que o presidente portista debitara, pelos mesmos dias, na revista do seu clube. Simples coincidência, por certo, embora não seja de hoje, nem de ontem, esta estranha subserviência que Alvalade tem revelado em relação ao rival nortenho em matéria de política concertada para provocar ruído no bem estar no inimigo comum, que é o Benfica.
Por motivos que me escapam, resolveu, ou alguém lhe sugeriu que o fizesse, turvar o ambiente em vésperas de dois dérbis, dirigindo um ataque sem nexo à figura do seu homólogo benfiquista em termos e modos que bem se dispensavam e que não dignificaram quem os subscreveu. Terá sido uma questão de estilo. Talvez, ou de falta dele.
Esta campanha de propaganda foi pensada para encontrar retorno na Comunicação Social, mas tudo começou a correr mal desde o primeiro lançamento, na quinta-feira, em que a mensagem Frederico Varandas ataca Vieira apenas serviu para incomodar os verdadeiros adeptos, mais preocupados com a exibição apagada da equipa em Setúbal e consequente perda de dois pontos para os restantes candidatos ao título do que propriamente com os tiques de egocentrismo de quem ainda há pouco chegou ao teatro de operações na qualidade de mais alta figura da hierarquia leonina.

A mais sábia resposta que Luís Filipe Vieira poderia ter dado a Varandas foi não dar resposta alguma. Ignorou-o, pura e simplesmente. Não se deu ao trabalho de reagir a linguagem deselegante, nem se deu ao cuidado de despender o seu precioso tempo a alimentar conversa com quem prefere usar a palavra mais para agredir e ofender e menos para dialogar.
Vieira é de outra estirpe, na verdade. Travou batalhas imensas para salvar a águia das cinzas, pôs em marcha um projecto ambicioso e de notável dimensão, preparou a instituição encarnada para os desafios do futuro e apresenta obra feita, grandiosa e apreciada.
Varandas, pelos vistos, gosta mais de prometer, e a propósito dos 100 dias da sua presidência, uma semana antes do Natal do ano passado, esgotou-se em autoelogios, em traçar cenários e em dizer coisas tão fantásticas como José Peseiro não ser o treinador de que o leão precisava, porque, afirmo ele, os adeptos acreditam que «o Sporting de Marcel Keizer pode ombrear com os rivais e ser campeão».

O presidente leonino sentiu-se muito indignado com a reacção de Vieira sobre o desempenho de Fábio Veríssimo enquanto videoárbitro no jogo da meia final da Taça da Liga, frente ao FC Porto. O assunto não lhe dizia respeito, mas fica sempre bem defender os amigos, e foi o que fez, ao colocar-se ao lado de Pinto da Costa, com quem parece sentir-se confortável no selecto recato das tribunas de honra.
Vieira não disse nem mais nem menos do que o presidente portista sobre Artur Soares Dias, vítima de encontro provocado por determinado grupo de adeptos com as mais venturosas intenções e que, por acaso, além de ser o melhor árbitro português da actualidade, foi classificado com nota elevada neste último dérbi de Alvalade. E o que afirmou então PC?
«O senhor Artur Soares Dias não tem condições para arbitrar. Se é honesto, não pode apitar e não tem competência para isso. Não se podem dar estes jogos a árbitros que não têm condições psicológicos para estes momentos. Artur Soares Dias não pode arbitrar mais jogos do FC Porto».
É claro que Varandas, que tanto se afadigou em desancar Vieira, não se atreveria a idêntico procedimento em relação ao bom companheiro PC, mas, se calhar, convém escolher melhor as companhias e informar-se sobre os terrenos que pisa. É que quando despediu Peseiro, o Sporting estava a dois pontos do líder da classificação, agora... está a onze, a oito do segundo e a sete do terceiro.

Nota final - Bruno Fernandes, além de excelente praticante, é inteligente e pensa pela sua cabeça. Por isso foi certeiro nas declarações após o dérbi de anteontem: «O Sporting tem de começar a fazer as suas próprias contas e não as das outras equipas. Temo feito as contas àquilo que os outros podem fazer e temo-nos esquecido de fazer as nossas contas».
Para bom entendedor... Trata-se de um recado pertinente, dirigido a quem se preocupa mais com as discussões na casa do vizinho em vez de cuidar, antes, dos seus próprios problemas."

Fernando Guerra, in A Bola

Foi um Félix que lhes deu

"Mesmo para um adepto moderadamente optimista, surpreende a extensão das mudanças na equipa do Benfica. Se, por um lado, as melhorias servem para provar a sucessão de equívocos tácticos e de abordagem aos jogos que o Benfica vinha acumulando, por outro, demonstram que treinar bem e escolher os melhores é meio caminho andado para o sucesso. O que Bruno Lage fez em quatro semanas prova que a equipa estava tão mal que, até, pequenas mudanças teriam de produzir grande impacto. As recuperações anímicas e físicas são, quase sempre, muito mais consequência do que causa da melhoria da qualidade de jogo.
Em Alvalade viu-se o que já não se via há muito num clássico: um Benfica personalizado, a sair a jogar desde trás, a privilegiar o corredor central e com variações na forma como atacava. Acabaram, finalmente, as bolas batidas na frente, assim como os cruzamentos desmiolados. Talvez mais importante, a equipa pressiona com critério. Aliás, foi na forma como defendeu no campo todo, recuperando a bola e saindo quase sempre em superioridade numérica, que esteve a chave para a vitória convincente frente ao Sporting.
Sem pré-temporada e praticamente sem tempo para treinar, o 4x4x2 que Lage implementou já revela dinâmicas e movimentações que prometem. Mas não é possível separar o sistema das características e qualidades individuais dos jogadores.
Com Pizzi na ala, a equipa ganha equilíbrio; com Gabriel a 8, a circulação de bola melhora muito e João Félix tem sido o jóquer que é sempre necessário nestes momentos. Mas esta ideia de jogo e este sistema dependem de jogadores com características específicas, que não existem no plantel: Jardel e Rúben já saem a jogar com mais frequência, mas falta um central com melhor definição no passe vertical; com Fejsa com muitas limitações físicas, é preciso um 6 capaz de jogar com segurança, na primeira linha, muitas vezes de costas para o jogo (é esse o perfil de Florentino, e a forma como a equipa B joga está, a prazo, a prepará-lo para a tarefa). Acima de tudo, com Pizzi na ala e a aparecer muitas vezes em posições interiores (é o que torna possível o meio-campo a dois), o lateral-direito tem de jogar mais por fora e ter um perfil ofensivo. Não esquecer que o melhor Pizzi foi o que jogou na ala com Nélson Semedo,
Mas o Benfica de Lage não seria possível sem o talento de João Félix. Ele é o suplemento criativo de que a equipa necessitava. Agora que perdeu a inibição típica de quem acabou de chegar ao futebol sénior, revela o que já se antevia na formação: irrepreensível nos espaços curtos, capaz de acelerar o jogo com verticalidade e letal frente à baliza. Acima de tudo, tem a imprevisibilidade na leitura de jogo ao alcance de apenas meia dúzia em cada geração. Foi a partir dos seus movimentos que se construiu a exibição memorável do Benfica em Alvalade."

A formação, o treinador, o futuro

"No final do jogo de Alvalade, que o Benfica venceu com uma superioridade indiscutível, Luís Filipe Vieira falou aos jornalistas para pedir aos benfiquistas que acreditem no Seixal como o futuro do futebol do clube. Acredito que não seja difícil o consenso. O Seixal será, certamente, o futuro do Benfica, como Alcochete será o futuro do Sporting, o Olival será o futuro do FC Porto e a formação de jogadores será, obviamente, o futuro de todos os clubes que quiserem, mesmo, ter futuro no futebol em Portugal. Mas importa não confundir as coisas. A formação é o pilar central de uma estrutura, o eixo essencial de uma politica, a linha fulcral de uma estratégia. Porém, o futuro de um clube de dimensão internacional, sobretudo no caso português, não se esgota na formação, mesmo que seja de excepcional qualidade. Exige mais, é muito mais complexo, abrange áreas diversas e uma enorme capacidade de juntar e coordenar competências.
Figura central será, sempre, o treinador. Aqui, há que ter alguma paciência, dar tempo ao tempo, para se poder avaliar, devidamente, Bruno Lage. Importante é dar-lhe as melhores condições para evoluir. Potencialmente, parece ser um caso muito interessante e, sobretudo, muito prometedor, mas não é bom pensar que se trata de um jovem que já nasceu ensinado, ou de um génio precoce, que já não tem nada para aprender. A pouco e pouco, degrau a degrau, o que não elimina o quase dever de ser profissionalmente ambicioso, Lage é ainda jovem em processo de crescimento, que precisa mais de uma estrutura que o acompanhe e proteja do que propriamente de uma corte que o enalteça."

Vítor Serpa, in A Bola