"O treinador da águia, que ouve notícias, lê jornais e gosta de andar informado, já se deu conta que o fantasma do costume volta atacar e, até ver, com mais força
Na semana em que regressam as competições europeias os jogadores das equipas portuguesas estão bem. Podem sentir-se enfastiados, por ausência prolongada de competição, entrecortada pelos jogos de selecções e apenas para os que tiveram esse privilégio, mas cansados, não, felizmente.
O Benfica, como único representante luso na Liga dos Campeões, é o primeiro a entrar em cena, amanhã, no seu estádio, diante de um Lyon às aranhas, actual 17.º classificado na Liga francesa, a quem está obrigado a ganhar, por respeito ao estatuto europeu da águia e, sobretudo, para manter viva a esperança de chegar aos oitavos de final, um dos objectivos desportivos proclamados por Luís Filipe Vieira e que, por excesso de ambição, dizem, tem sido gozado à tripla-forra por causa da sucessão de mais resultados, que se explicam pela discutível competência de jogadores com mais elevado estatuto e, talvez, pela vertiginosa ascensão de um treinador cujos méritos não se contestam, mas que, admito, ao chegar demasiado alto e depressa, se tornou imprudente ao ponto de admitir que, apesar de noviço na função, já terá crédito para errar e perder. Não tem, principalmente a este nível, porque os adeptos não vão esquecer nunca o vergonhoso legado de Rui Vitória que colocou o Benfica nas bocas do mundo pelos piores motivos, ser o último de entre os 32 clubes que participaram na edição de há dois anos: seis jogos, seis derrotas, um golo marcado e 14 sofridos. Na presente edição o quadro é menos deprimente, mas, muito cuidado, porque, neste altura, no universo dos oito grupos da Champions, com dois jogos e duas derrotas, além do Benfica, apenas se assinalam Atalanta, Leverkusen e Lille.
Há duas semanas escrevi neste espaço que, sendo Pizzi e Rafa Silva as principais referências da equipa encarnada e segundas ou terceiras escolhas da Selecção, alguma defeituosa avaliação prejudicou construção de um colectivo que se queria forte e que, afinal, se tem revelado mais vulgar do que o anterior.
A derrota sofrida com o FC Porto, ainda por cima na Luz, estragou tudo, ao colidir com o que se agradável o Benfica produziu na pré-temporada (vitória na International Champions Cup) se prolongou por Agosto, com triunfo na Supertaça e estreia empolgante na Liga (duas vezes 5-0, ao Sporting e ao Paços de Ferreira). O desfecho daquele clássico, porém, encolheu drasticamente a margem de tolerância, porque é assim que se vive o futebol, e Bruno Lage sentiu-se obrigado a reinventar a filosofia de jogo da equipa, com o mesmo plantel, sim, mas com novas ideias, e não através de experiências repetidas e adaptações gastas que só podem conduzir ao fracasso: foi assim com o Leipzig e, mais cruel, com o Zenit, por isso o presidente confessou a sua vergonha. Além de, como Lage compreenderá, a eliminatória com o Eintracht Frankfurt, na época passada, tal como aconteceu, ter provocado desconforto atroz, principalmente pela ligeireza, não há outro termo, com que foi abordada a segunda mão.
No jogo com o Lyon o Benfica tem de ser competente, mostrar capacidade de sofrimento, espírito de luta e de entreajuda e, de uma vez por todas, deve haver coragem na identificação e responsabilização de jogadores que, sendo fortes com os fracos e se amedrontam com os fortes, não justificam o que recebem, que é muito, nem as mordomias com que são tratados, ao nível do que melhor se pratica.
Em todas as circunstâncias, deve ser máxima a exigência do treinador, contratado para corresponder aos anseios da massa adepta, com vitórias e títulos, e não para receber elogios dos jogadores, razão pela qual me pareceu um inopinado exagero classificar de tremenda a atitude que tiveram no jogo com o Cova da Piedade.
De atitude tremenda precisa o Benfica amanhã, verdadeiramente tremenda, porque se for idêntica à que se viu na Piedade, diante de um oponente menor, não é previsível que o Estádio da Luz volte a reviver o ambiente das grandes noites europeias. Tantas na sua história, embora cada vez menos...
Por outro lado, o treinador da águia, pessoa culta, que ouve notícias, lê jornais e gosta de andar informado, com certeza que já se deu conta que o fantasma do costume volta a atacar e, até ver, com mais força. A única forma de o afastar é ganhar mais. O que nem é difícil. Bruno Lage até está em vantagem, mas não chega. Para consumo interno, já dizia Mário Wilson, qualquer treinador se arrisca a ser campeão no Benfica. O segredo estará em descobrir um Mourinho que aceite o desafio de lhe devolver o dimensão europeia que durante três décadas exibiu com reconhecido mérito e o tornou um emblema ainda hoje respeitado e admirado em tudo o mundo.
Na quinta-feira há Liga Europa. Acredito que FC Porto, Sporting e SC Braga vão passar à fase de eliminatórias. Ao Vitória de Guimarães tocou-lhe a fava, mas a visita ao Arsenal deve ser festejada. Prestigia o clube e os seus jogadores vão adorar exibi-se no relvado do Estádio Emirates."
Fernando Guerra, in A Bola
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