"Caro Thierry Correia,
Foi com muita curiosidade que observei a tua estreia na equipa principal do Sporting, no lugar de defesa lateral direito, por causa dos impedimentos dos três craques que o clube adquiriu para a posição nos últimos dois anos por valores cada vez maiores: dos dois milhões de Ristovski para os 4,5 de Bruno Gaspar e para os 8 de Rosier, em três verões consecutivos.
Ao todo, portanto, serão cerca de 15 milhões de euros atirados ao vento numa lógica antagónica à matriz formadora do Sporting. Ontem, quando subiste ao relvado do estádio Algarve, levavas a bandeira de Alcochete, como um último moicano a fazer acreditar na sobrevivência da “espécie”, por contraponto ao adversário, todo orgulhoso dos seus Rubens & Florentinos.
O Nuno Tavares, teu amigo do Benfica e das selecções, também estreou na mesma noite e ficou com a coroa da moeda que tem sempre esta face obscura do lado de baixo. Ele ganhou estrondosamente e festejou muito, tu perdeste copiosamente e choraste até meteres dó. É a vida, meu caro Thierry, e a aventura só agora está a começar.
O Nuno Tavares, que é canhoto e muita gente achava que estava metido numa alhada para fazer o lugar de um jogador de referência como o André Almeida, teve de se preparar para a missão ao longo de semanas e passar por testes exigentes, em conjunto com a equipa.
Tu sofreste uma lesão e tiveste menos tempo de treino, mas, além disso, foste incluído numa equipa, numa formação defensiva em estreia absoluta e num sistema que não foi devidamente ensaiado nem submetido a testes de resistência.
O que o Nuno Tavares teve a mais tu tiveste a menos. E isso fez toda a diferença, uma enorme diferença.
Mas, desde os adeptos aos comentadores profissionais e às redes sociais, o carinho que despertaste no final da partida acabou por retirar-te do rol dos culpados da hecatombe de Loulé. Tiveste responsabilidades em vários golos, na cobertura, na perda de bola, no deficiente posicionamento, repartindo culpas colectivas, mas foste ilibado pela indulgência que devemos aos mais novos e iniciantes. Sabemos, pelo que já fizeste, que vais continuar a crescer e a fortalecer e, quase de certeza, converteres os tais 15 milhões de “reforços” em perda total.
Mas, atenção, os sportinguistas, por causa dos longos anos sem títulos, tendem a não ver a realidade com clareza. Antes daqueles três mosqueteiros, tinha passado um quarto, o italiano Piccini, por quem não deram um chavo mas acabou por dar lucro à saída, chegar à selecção italiana e deixar uma boa memória. É assim o Sporting, emotivo, dramático, irracional.
Gostam de ti e desculpam-te os erros, até ao dia em que a frustração dos campeonatos perdidos os leve a transferir-te também para o grande quarto escuro dos filhos que não singraram. A incapacidade de analisar as deficiências próprias e o vício de culpar terceiros são dois dos motivos recorrentes para o insucesso do teu clube.
Sei que não te iludes e que estás consciente dos erros cometidos neste jogo. Dizem os chineses que, escapando ao perigo de morte, acordamos mais fortes. Por isso, jovem Thierry, seca as lágrimas e segue o teu destino."
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