sábado, 10 de agosto de 2019

A propósito do (des)controlo emocional (do Sporting e não só)

"“Remontadas” como as que observámos entre o Liverpool e o Barcelona, na Liga dos Campeões, vitórias esmagadoras entre adversários equiparados, como sucedeu na Supertaça Cândido de Oliveira, no passado fim de semana, ou, ainda mais surpreendentemente, entre adversários cuja dotação em termos dos valores individuais dos plantéis, se encontra completamente desequilibrada e onde, ainda assim, a equipa notoriamente mais “frágil” acaba por se “agigantar” e vencer... sempre existiram no desporto e sempre irão acontecer.
Contudo, elas são o espelho manifesto de como um correto ajustamento motivacional e emocional de um plantel, pode vir a ser o factor desequilibrante e, por essa razão, o que determina a vitória.
Muito se falou no sobre um eventual “descontrolo emocional” da equipa do Sporting: razões foram apontadas do ponto de vista da preparação física, técnica, táctica... só faltou, de facto, explorar em profundidade as razões de natureza psico-emocional (o que não deixa de ser curioso, atendendo a que o tema central seriam as emoções).

Emoções e Alta Competição
À partida, espera-se que um atleta (poderia ser um treinador ou um árbitro), porque compete em alta competição, terá igualmente um domínio elevado das suas competências psico-emocionais - entenda-se, capacidades como: manter a atenção sustentada por um período alargado, fazer uma correta gestão da frustração, saber persistir em cenários de adversidade, saber estar em equipa, saber ser liderado ou liderar, entre tantas outras.
Espera-se.
Espera-se... como se a simples exposição ao treino e à competição, pudessem resultar numa angariação cumulativa deste tipo de competências, numa proporção simples tipo: “quanto mais joga mais exposto se encontra à experiência, quanto mais exposto, mais treina e evolui”.
A investigação não corrobora, na verdade, esta assunção até porque, da mesma forma que aprendemos gestos técnicos errados, também aprendemos a activar emoções igualmente “erradas”. 
Há, pois, muitos atletas que, actuando comportamentos e emoções desadaptativas (ex: raiva), acabam por ter sucesso pontual e imediato, contudo, dificilmente se traduzirá em sucesso consistente e contínuo, se esta emoção for activada de forma indiscriminada e contínua, pois pode conduzir, por exemplo, a situações de exaustão emocional e potencial abandono.
Não deixa de ser curioso, no entanto, esperar que aconteça algo (ex: que os atletas exibam domínio das suas competências emocionais) quando não se criam os contextos necessários para que possa ser desenvolvido treino de forma consistente e sistematizada.

Exercício de “Sorte Ou Azar”
Por esta razão, por não haver ainda um conhecimento científico suficientemente difundido, acerca dos processos de treino em indivíduos e equipas que visam a integração planeada de competências cada vez mais elevadas, impera ainda no meio uma máxima de “sorte ou azar” que deverá afastar-se de um futebol que se pretenda assumir, cada vez mais, como ciência.
De facto, enquanto não assistirmos à integração da Psicologia (e, já agora, da Nutrição – alavanca fundamental para a optimização não só fisiológica, mas também dos processos cognitivos e emocionais dos atletas), enquanto ciência, nas equipas multidisciplinares que assistem os plantéis (e suas equipas técnicas), naquela que é a optimização do processo desportivo, muitos resultados surgirão por aparente “mero acaso”, pela activação não planeada (logo de difícil repetição) de estados de “flow” (estados de desempenho óptimo) em 2 ou 3 atletas que consigo arrastam a confiança e desempenho de toda uma equipa.
Mero acaso... sem relação causa-efeito... sem conseguir identificar como activar ou desemcadear a emoção desejada.
Logo, sem previsibilidade, sem capacidade de repetir e sem controlo voluntário – afinal, a tal “sorte”.

Maturidade (Mestria) Psico-Emocional Precisa-se!
Naturalmente que qualquer atleta ou treinador que atue em contextos de alta competição possui, necessariamente, um conjunto de competências psico-emocionais suficientemente elevadas para justificar a sua presença nesse nível competitivo – ainda assim, uma larga maioria, não exibe um controlo voluntário sobre as mesmas, evidente quando não consegue inverter uma sucessão de erros ou comportamentos de insucesso.
Por esta razão, e se o desafio for projectar os nossos atletas de um cenário de alta competição para um de Excelência, importa agregar no seu processo desportivo, o contributo inestimável de uma série de disciplinas cientificas (a Psicologia e a Nutrição são apenas duas delas) que, integradas numa perspectiva de Treino e Optimização de Competências, contribuirão certamente para a diminuição da alietoriedade que se assiste no que respeita à actuação do potencial desportivo de atletas e equipas no decorrer de toda uma época desportiva.
Há, no entanto, diferentes “maturidades” necessárias, senão vejamos:
- Das Federações que devem espelhar o processo cientifico subjacente ao desempenho desportivo, através da criação de equipas multidisciplinares que, articuladamente, devem colaborar com os clubes (suportando em especial os mais necessitados);
- Dos Clubes, que devem assumir o seu papel formativo e, desde cedo, activar estas mesmas equipas multidisciplinares junto dos atletas mais jovens, educando-os na multidimensionalidade subjacente à prática desportiva;
- Dos Atletas (ou Treinadores), nomeadamente nos escalões seniores, que devem chamar a si a responsabilidade do seu desenvolvimento pessoal em áreas especificas onde, por alguma razão, o clube não possui recursos.
Ou não fosse esta uma área de responsabilidade partilhada.
Em boa verdade, e como em tantas outras áreas da sociedade, deve-se “esperar” menos e fazer mais."

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