""Estamos no minuto 92, Kelvin remata e é gooollooooo...não, esperem! Houve uma falta um minuto antes, VAR anula". "Canto para o Sporting, centro para a área...Miguel Garcia cabeceia e os leões estão na final da Taça UEFA! Ou não...a bola aparentemente saiu 1 milímetro fora do campo no centro para a área. Golo anulado!". "Estamos no Bessa e o jogo está prestes a acabar...mas Jonas aparece isolado, pode marcar....e marca! Atenção, sinal de VAR! Jonas tinha 1 milímetro da coxa em fora-de-jogo, o golo não conta".
Os horríveis programas sobre "futebol" de 2ª feira à noite conseguiram. Tanto se debateu os penaltys televisivos, os fora-de-jogo por um pixel, a questão da intensidade nas faltas que isso invadiu o relvado e nada é como antes. Principalmente para os poucos adeptos que ainda vão ao estádio e não vêem pela televisão. Ainda ontem no Jamor tivemos o jogo parado durante 5 minutos após um golo, sem ninguém nas bancadas ter a mínima ideia do que se estava a passar. Ver na internet também é impossível, porque os estádios continuam a ser zonas de quase zero rede. Até que o golo que foi gritado e festejado deixa de ser golo, porque aparentemente 15 toques antes do toque final para o fundo da baliza um jogador do Benfica estava com o corpo milimetricamente adiantado em relação ao último defesa. E é para isto que esventraram o momento mais puro do futebol: o golo.
Umas das maiores críticas que os americanos fazem ao "soccer" é a raridade do golo. Que no basket há pontos a entrar constantemente, no futebol americano idem idem e no basebol aspas aspas. Mas no "soccer" podemos ter que esperar uma hora e meia até esse momento, se tivermos sorte. Que aborrecido, dizem eles. Mal sabem que essa é uma das razões pela qual o resto do planeta se apaixonou por este desporto tão simples e tão belo. É que o golo é a euforia, o orgasmo, o regresso à infância. Já dizia Nick Hornby no seu mítico "Fever Pitch" que não há na vida de uma pessoa um momento de alegria tão puro e contido de extâse, até pela forma surpreendente e não garantida como ele surge. Casar, ter uma promoção no trabalho, ganhar o Euromilhões serão sensações únicas, mas marcar um golo no último minuto num derby? Como dizia um grafitti numa parede em Itália, numa daquelas fotos virais das redes sociais: "Sei bella comme um gol al 90'!". Poderá haver piropo mais apaixonado que este?
Pois com o VAR esse momento já não é o mesmo. Hoje em dia e pelos vistos até ao final dos nossos dias como adeptos, nunca mais vamos poder festejar um golo a 100%. A explosão tem que ser contida, pois por mais eufórica que seja, há sempre um receio que vai surgindo segundos depois "Será que vai valer? Queres ver que o VAR vai descobrir algo para anular?".
"Ah, mas com o VAR acabaram-se as polémicas de arbitragem!". Tem sido assim, não é? Desde que existe o vídeo-árbitro nunca mais existiram erros, nem lances duvidosos. Os programas de 2ª feira à noite falam agora de jogadores e tácticas, porque o VAR tudo corrige e acerta. É que ao menos fosse assim...mas não, o VAR pouco ou nada resolveu. Continuam a existir erros, continua a haver uma avaliação humana, as opiniões continuam a variar de pessoa para pessoa, continua a haver quem ache que tudo está comprado, minado, combinado. O que é que o VAR resolveu mesmo? Eu respondo: matar mais um pouco a pureza do futebol.
Eu sei que isto é uma guerra perdida, o conceito de vídeo-árbitro já não volta para trás. E que se calhar a maioria concorda. Mas ficarão sempre uns românticos como eu que irão sempre ansiar pelo regresso ao festejo do golo gutural, bárbaro, de alma cheia e preenchida. Sem revisões, medições, linhas paralelas e análises de perspectiva. Porque quero que o futebol volte a ser belo como um golo aos 90'."
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