"Fui sempre contra o uso das novas tecnologias no futebol. Uma coisa são os jogos a sério, com pessoas de carne e osso; outra, diferente, são os jogos de computador. Misturar as duas coisas só podia dar asneira.A realidade está à vista. Nunca houve tanta suspeição no futebol como há hoje. E, para agravar as coisas, o espectáculo perdeu espontaneidade.Comecemos pela suspeição. Antes, discutiam-se os erros dos árbitros, mas poucos se atreviam a dizer que eram intencionais. Hoje, quando há um erro, a suspeita é imediata: se o VAR pôde ver as imagens várias vezes e errou, é porque quis errar. Os erros deixaram de ter desculpa. E neste campeonato já houve erros que decidiram jogos – e podem decidir o título. Ora, quando assim acontece, a suspeição está colocada ao mais alto nível.
Levanto uma questão pouco abordada. Hoje, quando há um golo, a jogada tem de ser toda revista pelo VAR. Ora, se houver intenção de beneficiar (ou prejudicar) um clube, torna-se fácil: como ao longo de uma jogada há quase sempre lances duvidosos, basta assinalar uma falta qualquer à equipa que marcou o golo para este ser anulado.Antes, era muito mais difícil. Só estava em causa a parte final do lance: se havia fora de jogo ou falta do marcador do golo. Hoje as hipóteses de invalidar um golo são inúmeras.
Vamos agora à perda de espontaneidade.Os golos eram – e são – os momentos mágicos do futebol. Aqueles em que o estádio explode de entusiasmo ou mergulha na tristeza. Mas agora as emoções são mitigadas pela dúvida: o VAR vai validar ou não o golo? Os adeptos controlam-se. Não explodem de alegria nem mergulham logo no desespero: esperam pelo VAR. E este compasso de espera é fatal. Matou a magia do golo.Recentemente, numa eliminatória da Champions, a segundos do apito final e depois de um jogo avassalador, cheio de emoções, o Manchester City marcou um golo que lhe daria a passagem na eliminatória. Uns festejaram, outros desesperaram – até porque na jogada não se divisava nada de irregular. Mas o VAR foi descobrir um fora de jogo de 5 cm, sem qualquer influência na jogada, mas que levou à anulação do golo e à eliminação do City.Daqui em diante, nos jogos do Manchester City, nenhum adepto – lembrando-se daquele momento -- voltará a festejar um golo de modo espontâneo.
Tudo isto – a desconfiança em relação aos resultados dos jogos e até dos campeonatos, o fim da espontaneidade nos festejos dos golos – terá consequências devastadoras no futebol. Até porque o VAR tenderá sempre a ir mais longe, a querer intervir mais no jogo, a querer decidir em caso de cartões amarelos e faltas perigosas – com pausas cada vez maiores na partida. O futebol tinha a vantagem de ser um jogo muito simples. Ao complicarem-no, com a introdução de quartos árbitros, de árbitros de baliza, de VARs, de protocolos, vão acabar por matá-lo."
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