"Não sei o que acham os grandes chefs mas pelo tom a preto e branco com que nos brindam com as novas tendências culinárias, não acredito que a salsicha tipo Frankfurt seja vista como algo muito apreciado. Talvez Anthony Bourdain fosse a excepção, ele que em dias de grande cacetada poderia fazer de uma não-iguaria um deleite para o seu paladar. É assim um título tão fácil como rasco, um pouco como o jogo entre Frankfurt e Benfica que, ao contrário da 1.ª mão há uma semana em Lisboa, nos fez bocejar pela maior parte do tempo. Ainda assim, o resultado final fez despertar, pelas considerações exageradas que já são normais na análise futebolística portuguesa, a fúria dos adeptos encarnados para com uma equipa que deixou escapar, em solo alemão, uma vantagem de dois golos. Ora, se é verdade que o Benfica não conseguiu ser aquilo que foi descrito, na maior parte do tempo, na era Bruno Lage, também será verdade que a intenção do técnico para segurar a vantagem não seria, certamente, a de que o Benfica pudesse ser inofensivo em toda a 1.ª parte. As rotas, é verdade, não foram encontradas, mas não é verdade que não houvesse uma intenção para encontrar o(s) golo(s) fora.
Mas por mais que Bruno Lage explique – que Félix defendeu na esquerda mas que se posicionou mais ao centro (à esquerda dos médios adversários) – o rótulo da análise estará sempre lá. Se perdeu, a culpa é do que mudou. Se ganhasse, acreditamos, não haveria mal no Mundo, até porque, se bem nos lembramos, não foi com um festival de futebol que o Benfica levou de vencido o Galatasaray, quer na Turquia, quer na Luz. E quem o disse na altura? Quem sequer ousou dizer, quando o Benfica ganhou (ou empatou passando) que a equipa – com tão pouco tempo de trabalho, abraçada em período tumultuoso, e com tão pouco treino aquisitivo – se sentia muito mais confortável em organização defensiva para depois soltar poderosas transições?
Rota não-encontrada
Por aqui, como é hábito, foi dito. Como será dito hoje que o plano do Benfica não foi só defender. Mas para que ele não atacasse em condições de segurar a vantagem que criou na Luz, mais factores devem ser tidos em conta que o habitual esfaqueamento e apedrejamento que dominam as TV’s e as redes sociais. E aquela que tornou o Frankfurt-Benfica em algo aleatório e difícil de controlar, curiosamente, não foi, até à hora em que escrevo estas linhas, encontrada nas análises. Diz-se, há muito, que a bola no ar é de todos, e a opção, quer do Benfica, quer do Eintracht, por jogar directo a partir de trás, tornou o jogo numa coisa anárquica e quase impossível de perceber para que lado ia pender. Assim, se alguma coisa deveria surgir em primeiro lugar nas questões a Bruno Lage sobre a eliminação, essa deveria ser a opção pela falta de ‘saídas limpas’ que permitissem que a bola não chegasse com veneno onde o Benfica a queria. Ao invés, mantendo o estilo do Frankfurt no jogo (que bateu sempre à procura de primeiras ou segundas bolas) o futebol das águias assemelhou-se a um GPS que repetia: Rota não-encontrada!
Apesar de ter feito um jogo muito abaixo do seu nível, o Frankurt aproveitou melhor o facto de a bola ter passado muitíssimo tempo no ar nesta 2.ª mão. Foi vindo de lá que nasceu o 2.ª golo do Eintracht. 1.ª bola ganha e Rode a encontrar espaço para finalizar.
Mas, para Lage, e para outros, a crucificação (a estúpida crucificação por parte de quem tudo sabe e que pelo tom deverá ganhar a Champions ano sim, ano sim) a crucificação, dizia, só chega quando se perde. Quando no Dragão a equipa encontrou rotas, e conseguiu mesclar a excelente organização defensiva soltando em transição ou mantendo a posse no meio-campo ofensivo, tudo foi perfeito. E a ideia ontem, era exactamente a mesma, apenas a anarquia para onde o Frankfurt levou o jogo, e a opção por não evitar isso mesmo, impediram que o Benfica encontrasse rotas. Isto sem a visão a preto-e-branco que eleva treinadores a Deuses com comando de Playstation, sendo que eles, mesmo sendo Bruno Lage e treinando o Benfica, também não conseguem prever tudo o que o adversário vai fazer. E foi fazendo fé na ligação que permitiu o 4.º golo na Luz que Lage queria chegar à meia-final. Não apareceu a ligação na 1.ª, apareceu na 2.ª, e se a bola de Gedson ou a de Salvio entrassem (ou se houvesse um VAR que anulasse o primeiro golo dos alemães)… Lage seria de novo o Deus que tantos querem, à força, que seja. Talvez seja necessário perceber aqui que o 8 ou 80 como se comenta futebol, nasça de quatro ou cinco ilusões de quem o comenta. E a de que o treinador tem de ser perfeito para caber dentro da caixa dessas ilusões, como a de que a equipa da qual nós somos adeptos tem de ganhar sempre com a nossa táctica de FM (ou a de entrar para lá que nem tarzões), talvez tenha necessariamente de ser mais aperfeiçoada do que a de um treinador que já provou ser excelente na sua profissão. Perfeito? Não. Mas alguém o é? E o que é então a perfeição? A cenoura à frente do burro à qual nunca se chega? ou a transcendência degrau acima, degrau acima, aceitando o nível em que realmente se está para depois elevá-lo?
Frankfurt-Benfica, 2-0 (Kostic 37 e Rode 67)"
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