"Rui Rio não tem tido vida fácil desde que ascendeu à liderança do PSD. Valha a verdade, também não tem feito muito por isso.
Mas diga-se em abono da mesma verdade que, independentemente dos deméritos próprios, muito poucos o têm ajudado (ou podido ajudar) e as circunstâncias também não o têm favorecido.
Ora, acontece que o caos instalado no futebol nacional e particularmente num dos chamados ‘três grandes’ clubes é um dos raros circunstancialismos em que se algum político pode com toda a moral dizer de sua justiça é Rui Rio.
Porque, contra quase tudo e quase todos - menos a maioria dos munícipes do Porto -, Rio afirmou-se na política marcando claro distanciamento em relação aos complexos e, no mínimo, promíscuos meandros do futebol.
‘Está feito’, profetizaram, quando se impôs como presidente da Câmara da Porto contra os mandos e desmandos de Pinto de Costa e do todo poderoso FCP.
Ainda na semana passada, Rui Moreira voltou a receber na Câmara do Porto, no alto dos Aliados, os campeões nacionais de futebol, com as tituleiras da comunicação social impressa, digital, radiofónica e televisionada a celebrarem o regresso dos dragões à varanda da sede da edilidade 19 anos depois (ou seja, na primeira oportunidade em que o puderam fazer depois de Rio ter passado testemunho a Moreira).
Rui Rio não faz comentários sobre futebol, não pede bilhetes para os filhos poderem ir à bola de borla e em lugares VIP, não frequenta nem aparece sentado ao lado dos presidentes ou dirigentes dos clubes grandes, médios ou pequenos, não segue viagem nas comitivas de convidados especiais para jogos de competições da UEFA ou da FIFA.
Faz anos que, nesse capítulo, marcou certeira diferença, mantendo sábio e ponderado distanciamento em relação ao mundo do futebol.
Não é por isso estranho que, agora, como no tempo do escandaloso caso do Apito Dourado de Pinto da Costa ou do igualmente condenável totonegócio de Valentim Loureiro, Rui Rio surja com reconhecida autoridade para falar.
E Rui Rio falou.
Como falou Marcelo Rebelo de Sousa, Ferro Rodrigues, António Costa e tantos outros políticos.
Marcelo condenou a invasão de Alcochete e as agressões aos jogadores e técnicos do Sporting, mas procurou acalmar ânimos e relativizar o problema, tentando desviar as atenções para a... campanha «do Pirilampo Mágico».
Já Ferro Rodrigues foi incapaz de conter o seu sportinguismo e clubite na intervenção enquanto presidente da Assembleia da República, aconselhando à realização da final da Taça sem público (à porta fechada) ou no campo do Desportivo das Aves. E António Costa logo avançou com a ideia de criação de uma alta autoridade para combater fenómenos de violência.
Já Rui Rio - e bem - veio uma vez mais pôr a tónica na necessidade de separação e distanciamento da política em relação ao futebol, acrescentando - mal - que há necessidade de aperfeiçoamento da legislação.
Salvo o devido respeito, se não se percebe por que razão haveria de realizar-se a Taça de Portugal à porta fechada, como propôs Ferro Rodrigues, também não se percebe a necessidade de mais uma alta autoridade nem de novos pacotes legislativos.
A lei e os meios de combate a fenómenos de violência e a organizações criminosas como as que nascem e proliferam nas claques dos clubes de futebol já existem e são mais do que suficientes.
É preciso é vontade política e coragem para enfrentar os clubes e as hordas de malfeitores travestidas de grupos de adeptos organizados.
A Taça de Portugal no Jamor, entre o Sporting e o Desportivo de Chaves, não tem risco de segurança maior.
A sua realização poderia, e deveria, ter sido posta em causa, não pelo risco que lhe está associado (muito pequeno e certamente controlado pela experiente Polícia que há muito acompanha eventos e jogos com muito mais perigos), mas como castigo imediato - e exemplar - para um dos clubes qualificados face ao comportamento criminoso (premeditado e planeado) de um grupo de adeptos e à negligência e complacência (na menos má das hipóteses) dos seus principais dirigentes para com esses criminosos.
A lei já penaliza com critério e com molduras penais suficientemente dissuasoras e punitivas os fenómenos de violência organizada e associação criminosa como aqueles a que assistimos na Academia de Alcochete esta semana.
‘Estar atento’ ou ‘acompanhar com preocupação’ o que está a passar-se no meio de futebol - como disseram dois desenquadrados secretários de Estado na primeira reacção do Governo aos acontecimentos de Alcochete - não é nada.
Há é que agir. E, como fez e diz Rui Rio, manter as devidas distâncias entre a política (e já agora a Justiça) e o futebol. Até para que políticos (como os agentes da Justiça) possam intervir livremente sempre que se justifique. Como agora.
O resto, entre mais debates e novos pacotes legislativos ou altas autoridades, só contribui para adiar a resolução dos problemas. E para a falta de autoridade."