"Ribeiro dos Reis foi uma figura ímpar do Benfica e é, por vezes, injustamente esquecido. A sua importância na construção do futebol do clube é irrevogável. Como jogador e como técnico. E até como dirigente.
Conheci muito bem a Dra. Margarida Ribeiro dos Reis. Era proprietária da velha A Bola e uma pessoa interessantíssima. Muitos adeptos do Benfica recordar-se-ão de a ver entregar a Bola de Prata a vários jogadores encarnados, no antigo Estádio da Luz.
A Dra. Margarida, também ela benfiquista ilustre, era filha de uma das grandes figuras da história das águias e muitas vezes injustamente esquecida: o tenente-coronel Ribeiro dos Reis.
António Ribeiro dos Reis foi um casapiano, tal como o seu grande amigo e companheiro de muitas jornadas Cândido de Oliveira. Depois estudou no Liceu Pedro Nunes, à Estrela.
Adorava futebol. E era empreendedor como poucos. Quis organizar uma equipa de alunos para participar no Campeonato de Lisboa de futebol de quartas categorias. Não conseguiu. Foi para o Benfica.
Todos os domingos, Ribeiro dos Reis, por amor ao jogo inventado pelos ingleses e por paixão pelas camisolas vermelhas, ia a pé de Santo Amaro, onde morava, até Sete Rios. Jogava com um entusiasmo cativante. Depois regressava pelo mesmo caminho. Sem dinheiro para uma botas de futebol, usava as do dia-a-dia. Mas forrava-as de pano para garantir que sempre duravam mais uns tempitos...
Em 1913, Novembro, estreou-se pelas primeira categorias do Benfica. Vitória sobre o Sacavanense por 8-0. Nessa época, o Benfica foi campeão invicto de terceiras categorias, e Ribeiro dos Reis foi titular na maior parte dos jogos. E ainda foi fazer uma perninha às segundas categorias e ao desempate entre Benfica e Sporting pelo título depois de terem chegado ambos ao fim igualados na tabela. O Benfica ganhou 3-0, Ribeiro dos Reis marcou um golo e açambarcou outro campeonato na mesmíssima época. Tinha alma de campeão!
Ribeiro dos Reis não se divida apenas pelas várias categorias do futebol encarnado.
Fazia, como sempre fez, mil e uma coisas.
Foi, sobretudo, um enorme jornalista que passou pelas páginas do Sport Lisboa logo a partir de 1914. As suas análises profundas sobre as influências sociais e económicas do desporto na vida dos cidadãos portugueses deixaram os seus leitores sem dúvidas quanto à craveira intelectual que possuía. Foi um dos fundadores de A Bola.
Avancemos no tempo cerca de 30 anos.
O Sport Lisboa e Benfica promove uma enorme homenagem a Ribeiro dos Reis.
Neste mesmo jornal que tem hoje em mãos, escreve-se: 'Rendeu-se homenagem vibrante, sincera e grandiosa, mas sem o falso esmalte protocolar, a alguém do desporto nacional, homem do espírito forte e forte acção, que tem lutado sempre com a mesma fé, indiferente à maledicência, alheio ao manejo da baixa política desportiva. Os murmúrios dos despeitados e dos maldosos nunca o fizeram vacilar no caminho recto'.
Ribeiro dos Reis soube ser superior aos que quiseram envolvê-lo em mesquinhces. Até quando abandonou pelo seu próprio pé o cargo de seleccionador nacional, ele que fora o primeiro treinador a conseguir uma vitória com Portugal, contra a Itália, em 1925.
Durante onze anos foi jogador das primeiras categorias do Benfica. Em fases diferentes da carreira, esteve cerca de oito anos como treinador do clube.
Atingir a sua grandeza não está ao alcance de qualquer um.
A sua grandeza de carácter que o fez agradecer assim ao Benfica num dia sem regresso 'Os nossos actos seguem-nos. Hão-de ser sempre a nossa força moral. Acabo de ouvir tão lisonjeiras apreciações à minha actividade no campo desportivo e o meu orgulho está precisamente no facto de não enjeitar nenhum dos meus actos. Trouxe-se demasiado à boca de cena o indivíduo. É justo esbater a sua figura para fazer surgir em seu lugar a colectividade em que se formou, em que ele se fez gente. As homenagens que me foram prestadas endereço-as ao Benfica, em cuja escola de virtudes temperei o meu carácter'.
E que carácter!"
Afonso de Melo, in O Benfica
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