"Como é hábito, os clássicos raramente são grandes jogos, são antes encontros para ganhar (ou perder)
1. Manda o respeito pela cronologia, começar por assinalar a circunstância feliz de os três representantes portugueses na Europa terem vencido os seus jogos na mesma jornada. É obra, se pensarmos que situação idêntica só se havia verificado cinco vezes neste século! Para tal, os deuses estiveram connosco. Em Atenas, o Benfica foi verdadeiramente ciclotímico, passando de uma entrada fulgurante para uma saída pesarosa. Valeu Vlachodimos que se está a evidenciar como uma muito boa aquisição encarnada e Alfa que assinou o ómega do jogo, com uma cavalgada à moda antiga. Na cidade do Porto, valeu Casillas com uma belíssima exibição que evitou várias vezes o golo dos turcos. Na Ucrânia, perante um adversário bastante débil e de nome esquisito, o Sporting lá acordou de longa letargia, e com fortuna, depois dos 90 minutos. Em suma, fragilidades evidentes, mas proveitoso pecúlio que é bom para o ranking, ainda que seja muito difícil nos próximos tempos alcançarmos um lugar que dê direito automático de duas equipas entrarem directamente na liga milionária.
2. Passando ao nosso campeonato, verificou-se uma quase antinomia futebolística. FC Porto e Sporting perderam, Sp. Braga empatou e só o Benfica venceu. Numa perspectiva aritmética, o meu clube ganhou 8 pontos aos mais directos concorrentes, situação raríssima, mas saborosa.
Na Luz, o clássico. Passámos uma semana de comentários e análises que, maioritariamente, colocavam o SLB numa inferioridade quase inultrapassável. Ora porque ia atrás na classificação, ora porque Rui Vitória nunca ganhara ao FCP, ora porque não tinha defesas-centrais, ora porque o Estádio da Luz era o salão de festas dos portistas. Mesmo assim, fui para o nosso Estádio, desconfiado perante tão doutas sentenças. Desconfiado de que o Benfica iria ganhar. E assim foi. Venceu com natural dificuldade, mas bem e merecidamente. Foi a equipa que, sobretudo no segundo tempo, mais quis ganhar o jogo. Como é hábito, os clássicos raramente são grandes jogos, são antes encontros para ganhar (ou perder). O de domingo não fugiu à regra e teve poucos momentos de espectacularidade. Se exceptuarmos os primeiros quinze a vinte minutos, o Benfica conseguiu, psicologicamente, ultrapassar o anátema de jogar retraído perante os portistas. Ao invés, o Porto pareceu sempre muito timorato, como se na cabeça dos jogadores estivesse, desde o minuto zero, o objectivo de um empatezinho. Prova disso, é o sabidão Iker Casillas ter, desde o início, retardado sistematicamente a reposição da bola em jogo, como fazem amiúde as equipas pequeninas. Foi de tal modo flagrante que o árbitro se viu obrigado a mostrar-lhe o cartão amarelo aos 19 minutos (o costume em Portugal é ser exibido aos 90 minutos), sob pena de o ónus recair sobre o próprio juiz.
O (di)lema do adversário pareceu, implicitamente, confiar no Lema do Benfica. Digo isto baseado no que, à saciedade, ouvi e li de opiniões, comentários e desejos nos dias que antecederam o clássico. Ou porque Lema passou automaticamente a «lesma» antes sequer de alguma vez ter sido visto a jogar, ou porque depreciativamente o argentino tivesse vindo de uma equipa do meio da tabela (Belgrano). Afinal nada diferente de Pepe, Jorge Andrade e Rolando que passaram pelo Marítimo, Estrela da Amadora e Belenenses antes de se estabelecerem no FCP. E também me lembro de Chidozie que se estreou há uns anos na Luz e que até se safou bem (mas isso é a excepção boa, porque azul-e-branca...).
Felizmente, Lema jogou e bem. Não perdeu uma bola nas alturas, não tremeu, meteu Soares no bolso. No resto foi acompanhado por outro lema, o do Benfica, que todos os jogadores souberam interpretar com galhardia e tenacidade: E pluribus unum.
É claro que o sempre ufano e vaidoso Fábio Veríssimo haveria de lhe cortar uma estreia bastante positiva, obrigando o Benfica a jogar 12 minutos com menos um jogador. Que raio de critério andava na cabeça do árbitro, no que toca à (in)coerência das decisões de natureza disciplinar? Num jogo desta importância, não hesitou em mostrar o vermelho a Lema num lance que nada o justificava (assim indo ao encontro da fita do portista André Pereira), para, logo a seguir, deixar passar uma acção imprudentíssima de Herrera - também amarelado - sobre Rafa. Como é possível um árbitro internacional ser tão descaradamente enviesado e parcial? Aliás, disciplinarmente, foi assim todo o jogo. Grimaldo na sua primeira acção faltosa levou logo um amarelo. Mas, por exemplo, Otávio fez uma, duas, três, quatro faltas e só à quinta foi avisado gestualmente que era a última sem cartão.
Num ambiente empolgante e com um público (benfiquista e portista) dentro dos bons limites da civilidade, destaco alguns jogadores do Benfica. Começo por Rúben Dias - que, aqui, já referi com alguma preocupação por certos momentos de jogo - como um verdadeiro capitão. Força, posicionamento, fibra, carácter, até se deu ao luxo de não dar pretextos para um qualquer cartão que sempre é requerido a priori pelos adversários. Vlachodimos sempre sereno, foi quase mero espectador. Já espeta-dor foi o antes renegado Seferovic que trabalhou muito e não falhou no momento decisivo. Grimaldo está com a corda toda: deu para Marega e para pôr a cabeça de Maxi Pereira em molho. Gostei também de Gabriel, vê-se que tem futebol nos pés e cabeça no jogo. Rafa, este ano com excelente atitude, é um espoletador por via da rapidez, verticalidade e poder de finta.
3. O Estádio da Luz é um grande palco, onde quase sempre se ganha, mas nem sempre se pode vencer. Não é nenhum salão de festas alheio, como, por estes dias, ouvi e li, com sobranceria inusitada.
Mesmo assim, fui consultar a descrição de alguns salões de festa, e encontrei lá o «Espaço Pétala Vermelha». Vejamos a sua descrição publicitária: «Salão para passar momento agradáveis, especialmente recomendado para fins de tarde. Cozinha completa com churrasqueira. Bar sempre aberto sem custo adicional e oferta de chocolate suíço, iluminação decorativa, relvado para pista de dança, visão panorâmica para o aeroporto».
Qualquer semelhança é pura coincidência.
4. Mais uma corrida, mais uma paragem. O campeonato só volta lá para o fim do mês, com a mudança da hora. Até lá, os joguinhos da selecção, agora sem Cristiano Ronaldo - que se dá ao luxo de escolher os jogos que faz ou não faz, com a compreensão carinhosa do seleccionador - e uma eliminatória da Taça de Portugal para depenar franguinhos. Espero que, no Benfica, tal tempo sirva para dar o andamento necessário ao regressado Jonas, colocar o Krovinovic na grelha de partida para os jogos, aprimorar o momento do genial João Félix e - bem importante - fazer regressar o capitão Jardel ao eixo da defesa. Já agora, o que é feito de Ferreyra? Magoado, esquecido, decepcionado? E Zivkovic, um jogador que sabe, como poucos, aliar capacidade com utilidade?
Contraluz
- Emoção: os jogos de voleibol entre Benfica e Sporting são sempre empolgantes. Assim sucedeu no último campeonato, que os leões venceram por uma unha negra e agora no começo desta temporada, na Supertaça, que o Benfica venceu com o último set a terminar 36-34! Grande propaganda a esta rica e bela modalidade.
- Curiosidade: O Feirense. Ao fim de sete jornadas, coincidem neste clube a circunstância de ser a melhor defesa (3 golos) e... o pior ataque (4 golos). O que tem de bom e de mau esta situação? Será um reflexo do nível (ou falta dele) do nosso campeonato?
- Mistério: Novamente o VAR, desta vez em Braga. Última jogada que daria um penálti ao Rio Ave, mas da qual saiu, apenas, a expulsão do treinador prejudicado. Vá lá, admite-se a dúvida do árbitro em tempo real, mas visto na televisão é falta para grande penalidade em qualquer parte do mundo e em qualquer jogo. Que terá dito o VAR? Muito gostaria de saber o que inventou, quer dizer, o que disse ter visto sem ninguém mais ver...
- Incoerência: Cristiano Ronaldo está no olho do furacão. Não faço juízos sobre um caso que pode ensombrar a vida do nosso grande atleta e espero que, para seu bem, a situação lhe possa ter um final favorável. Mas não deixo de assinalar, a incoerência de tanta gente do Me too & Cª que, perante todos os casos até agora publicitados, logo sentenciaram, sem apelo nem agravo, contra os alegados violadores e se puseram ao lado das alegadas vitímas, boas ou más filhas da sociedade. Agora, neste caso embaraçoso e por cá, especialistas do «protesto de género» apenas balbuciam que, afinal, a rapariga de Las Vegas até pode ser uma prostituta. E eu pergunto: as prostitutas podem ser violadas?"
Bagão Félix, in A Bola
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