"Luis Buñuel foi um cineasta espanhol que deixou marca na história do cinema moderno como um mestre do surrealismo. «Um dos seus objectivos foi produzir uma arte que, segundo o movimento, estava a ser destruída pelo racionalismo», pode ler-se na descrição dos fundamentos desta filosofia artística. O que se passa no Sporting é surreal mas está à beira de ultrapassar todos os limites.
Bruno de Carvalho anunciou com pouca pompa mas com toda a circunstância que não se demitia. Nem ele nem o restante Conselho Directivo. O presidente dos leões tem legitimidade estatutária para o fazer, uma vez que o órgão ainda tem quórum e, para todos os efeitos, as eleições no clube foram há menos de um ano. No entanto - e aqui há muitos no entanto - os outros dois órgãos sociais, Conselho Fiscal e Mesa da Assembleia Geral, já se demitiram; o Conselho Directivo também já sofreu baixas, não tem relação com o plantel profissional nem com o treinador; a sua base de apoio mediática caiu toda, e três apoiantes de sempre - José Eduardo, Eduardo Barroso e Daniel Sampaio - já o exortaram a sair; já disse que vai processar o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues; criticou o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e o governo, liderado por António Costa; viu o clube ser implicado num escândalo de alegada corrupção e tem uma largíssima franja de adeptos contra si.
Mas há algumas questões que me ousa a deixar: quando olha para o lado, que é que Bruno de Carvalho vê a seu lado? Até quando vai insistir na tese da cabala para o demitir? Qual será a reacção do plantel à sua presença no Estádio Nacional? Se uma boa fatia do plantel rescindir alegando falta de condições de segurança e psicológicas para representar o clube, quem será responsabilizado por esse dano? Eu, confesso, não consigo encontrar respostas para estas questões. Nem eu nem talvez Luis Buñuel, se ainda fosse vivo. Porque até o surrealismo tem um limite."
Hugo Forte, in A Bola
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