sábado, 19 de agosto de 2017

Previsão de uma vida de sucessos

"O Benfica recebe esta noite o Belenenses no Estádio da Luz e o desejo da multidão benfiquista será ver Filipe Augusto entrar em campo o mais cedo possível porque sempre que Rui Vitória lança Filipe Augusto é sinal de que a coisa se resolveu a bem. Na segunda-feira, em Chaves, o nosso Filipe Augusto só entrou aos 90+4 minutos porque o Benfica só conseguiu marcar aos 90+2 minutos e como o árbitro – que, no fim do jogo, até recebeu uma camisola oficial das águias por deferência com a grande penalidade sonegada – concedeu 6 minutos de tempo extra só conseguiram descansar os adeptos do Benfica entre os 90’+4 e os 90’+6. Foi, assim, curto o descanso que nos foi dado no jogo de Trás-os-Montes que nem sequer foi um ‘clássico’. Já o desta noite, sim, é um ‘clássico’ com tudo o que isso implica de imprevisibilidade. Corram, corram. Parece que o Fejsa se lesionou. Mas que grande novidade. Corre, corre, Filipe Augusto.
André Silva estreou-se na quinta-feira em San Siro e marcou dois belos golos deixando os adeptos AC Milan felizes com a categórica apresentação do avançado. Mais contente do que os adeptos do AC Milan – e trata-se de uma plateia exigente – ficou, no entanto, o próprio André Silva. Festejou as proezas com um sorriso largo que não engana. Ficou, assim, aprovada pelos ‘tiffosi’ locais a contratação do jogador português e, melhor ainda, ficou também explicado o sentido da misteriosa frase do director de comunicação do FC Porto – "o melhor ainda está para vir!" – que se referia, como agora se percebe, ao brilhante futuro profissional que inevitavelmente aguarda André Silva depois de ter trocado de patrão. Tomara sobre tantos outros funcionários do futebol português poder vaticinar-se uma vida de êxitos deste quilate a cada mudança de entidade patronal.
Menos de 24 horas depois do encosto ao árbitro de Camp Nou ficou Cristiano Ronaldo a saber que o seu gesto lhe valerá 5 jogos de suspensão. Apreciem como a justiça desportiva espanhola é tão mais célere do que a nossa em matéria de decisões. Esta semana, por cá, houve a decisão do caso do túnel de Alvalade 283 dias depois da rixa tabernal entre os presidentes do Sporting e do Arouca. E até já se pensava que os prazos para a condenação destas inclemências estariam a evoluir para uma aproximação aos ritmos dos patamares disciplinares europeus.
Foi, porém, enganosa a esperança. Enganosa e induzida pelo facto de o castigo a Slimani pela cotovelada em Samaris ter demorado 203 dias a ser conhecido e pelo facto seguinte, tão promissor: o castigo ao mesmo Samaris pelo ‘uppercut’ a Diego Ivo demorou ‘apenas’ 44 dias a ser pronunciado. Deu-se, assim, a entender aos optimistas que estava em curso o progresso. É que de 203 para 44 dias, enfim, é outra aceleração. Agora, com estes 283 dias, voltou tudo a andar para trás. Ou para a frente, como preferirem. Estas conclusões dependem sempre da perspectiva."

Há uma geração rasca no nosso futebol

"Há quem defenda a ideia drástica de erradicar esta gente que tanto usa e abusa de uma espécie de violência doméstica contra o futebol.

Excelente trabalho da redacção de A Bola, contando tudo, ou quase tudo, porque infelizmente, as câmaras que podiam captar o som do que disse o presidente do Sporting ao presidente do Arouca ficaram súbita e surpreendentemente sem som, daquele triste incidente no túnel de Alvalade.
O trabalho, apresentado com rigor ao longo de quatro páginas de abertura do jornal, constituem, por si só, uma das mais importantes e significativas constatações de facto sobre o que bem poderia ser dado como exemplo do lado mais negro de um certo tipo de geração rasca que afunda a credibilidade de dirigentes do futebol português.
O que se ouve nas gravações e que são imputadas ao presidente do Arouca é sintomático de uma atitude de desrespeito e de total desconsideração pelo adversário. O que se apura de actos no acórdão do Conselho de Disciplina, relativos ao presidente do Sporting, vão no mesmo sentido e acrescentam as maiores razões de inquietação. O que depois se pode ler na reacção de Bruno de Carvalho, através do seu famoso facebook, onde se revela uma grosseira e pouco corajosa insinuação que parece ter por alvo o presidente do Conselho de Disciplina é tão lamentável quando significativa da conta que o presidente de um dos três maiores clubes portugueses tem pelos órgãos disciplinares do futebol.
Toda a matéria em que o acórdão disciplinar navega é um charco pestilento, onde impera a ordinarice, a vulgaridade, a afronta.
Não importa avaliar a justiça da pena aplicada a cada um dos principais e tristes protagonistas, porque mais importante é a exposição pública do atraso cultural e civilizacional de quem tem obrigações e deveres públicos pelos cargos que desempenha na liderança de instituições que são seguidas por milhões de cidadãos, muitos deles jovens, em idade de formação e que entendem como exemplo para a vida a ideia de que as diferenças se resolvem pela violência, pela força, pela afronta, pela intolerância, ou pela primária manifestação de uma força animal.
Portanto, a questão essencial não de se saber se as penas aplicadas deveriam ser mais ou menos gravosas. A questão decisiva é a de saber como erradicar este tipo de acções do futebol e que, de facto, são socialmente perigosas. Isto, para evitar falar, pelo melindre que envolve, na visão drástica de quem entende que se devia começar por erradicar todo o tipo de gente que de forma persistente e continuada usa e abusa de uma espécie de violência doméstica contra o futebol português.
Haverá certamente quem defensa que a linguagem do desporto de competição, especialmente nos seus bastidores, é uma linguagem crua, desprovida de preocupações éticas e sociais. Mas não é a mesma coisa a linguagem de cabina, na reserva de uma sala entre um grupo fechado que tem os seus códigos particulares, e a linguagem em zona pública, em especial, preferida por dirigentes máximos de instituições às quais se consagra uma importância e responsabilidade sociais que levam a justificação de benefícios públicos e até certas honrarias de Estado.
Ser presidente, alto dirigente, ou protagonista com grande visibilidade pública num clube de futebol, em Portugal, é uma posição de privilégio. Nem toda a gente está mentalmente preparada para isso. Nem toda a gente percebe que a suposta importância nacional da função não é, de todo, correspondida na realidade. É por isso que dirigentes, jogadores, treinadores, depois de terem conhecido momentos de alta emoção e de verdadeira idolatria popular se deixam cair na mais profunda depressão quando passa o seu tempo e percebem como era efémera e vã essa suposta glória. É que o futebol é, apenas, uma representação da vida.
(...)"

Vítor Serpa, in A Bola

Vídeo-árbitro só quando dá jeito

"FC Porto joga com o novo sistema a seu bel-prazer.

Talvez por estar embrenhado na leitura dos emails controversos que todas as semanas dá a conhecer no canal televisivo do FC Porto, o director de comunicação azul-e-branco nem se terá apercebido de que no mesmo dia em que o clube punha em causa a verdade da classificação da Liga da temporada passada por ainda não estar oficializado o vídeo-árbitro, ele próprio colocava em questão o referido sistema para atacar a decisão de um golo anulado ao Sp. Braga no jogo contra o Benfica. Seria mais útil e eficaz para a credibilidade do clube um discurso uniforme. Os portistas agradecem, os adversários não teriam motivos, entregues de mão beijada, para escarnecerem.
Também é verdade que outra coisa não seria de esperar quando o ódio se sobrepõe à razão e à falta de senso. E se nas quatro épocas de vitória benfiquista o valor encarnado nunca foi reconhecido e tudo se deveu a "erros de arbitragem" e a "falcatruas", esta época não se poderia esperar outra posição, mesmo com o vídeo-árbitro a funcionar em pleno. E, agora, o debate é saber qual o peso da decisão, se o árbitro nas quatro linhas deve ter preponderância, ou se a palavra final deve caber àqueles que decidem com base nas imagens. E já se preparam mais câmaras e novos ângulos. Tudo bem, mas nem será isso a calar quem pretende arrecadar títulos virtuais."

O saudoso disco rígido

"Jesus nem precisa do disco rígido para saber o que aí vem se a coisa der para o torto.

Talvez por se ter festejado um tanto ou quanto a mais do que teria sido aceitável, à luz do bom senso, o facto de o Sporting ter partido para o sorteio da pré-eliminatória da Liga dos Campeões na condição de cabeça de série – o que, por um conjunto milagroso de circunstâncias, afastou conjuntos como o Liverpool ou o CSKA do caminho dos leões – acabou por ser recebido como decepcionante o empate sem golos com que veio a terminar o jogo de terça-feira, em Alvalade, com o Steaua Bucareste referente à 1.ª mão da tal pré-eliminatória que dará, ou não dará, acesso à ambicionada fase de grupos da prova maior da UEFA. Ambicionada, porém não "obrigatória" como tão bem explicou Jorge Jesus à imprensa. "Obrigatória entre as aspas", disse o treinador, que, mesmo tendo deixado o "disco rígido" do seu computador no Seixal, consegue, ainda assim, ser sempre o mais lúcido dos elementos do staff do futebol sportinguista.
Nesta premente questão europeia – premente porque a questão é dinheiro –, o discurso de Jesus é notoriamente oposto ao discurso do presidente. Bruno de Carvalho diz que é tempo de "o leão mostrar que é o rei da selva" e o treinador diz que só é "entre aspas" que o Sporting tem de se qualificar obrigatoriamente para a selvajaria da Liga dos Campeões, o presidente diz que "o nome" do Sporting não o desobriga de lutar por afastar os romenos e Jesus responde afirmando que os dois emblemas "são do mesmo nível"… Todas estas salutares divergências de opinião serão, normalmente, reduzidas a nada se o Sporting, como se espera, afastar o Steaua e entrar direitinho na Liga milionária.
E, dando razão a Jesus e ao seu optimismo racional, não há motivo para considerar que o 0-0 da 1.ª mão seja, de facto, um mau resultado. Não é, obviamente, um "score" que tenha resolvido a discussão a favor do Sporting – como muita gente inocente tinha como garantido – mas é um resultado mais do que aceitável e até promissor. O Sporting não marcou, é verdade, mas não sofreu nenhum golo, o que lhe dá enorme vantagem se marcar em Bucareste, o que a acontecer não será de todo uma proeza do outro mundo. A bipolaridade dos adeptos – de todos os adeptos de todos os emblemas – é bem mais difícil de contornar do que este nulo de terça-feira. Do triunfalismo perante os acasos que terão ditado um sorteio doce na Europa ao pessimismo destrutivo que passou a imperar consumada que foi a não-goleada prevista, vai um passo, enfim, um passinho de Podence que é, entre todos, o que terá o passo mais curto. Ora isto não é ciência exacta. É um jogo de bola. E Jesus nem precisa do saudoso disco rígido do velho computador do velho emprego para saber o que vem aí se a coisa der para o torto.

O tal Luís Miguel Afonso Fernandes
Eis como o Benfica se tornou num caso de Pizzi-dependência
Foi eleito o melhor jogador da última Liga e ninguém se atreveu a protestar essa eleição porque, de facto, Pizzi foi o melhor jogador da última Liga. Não tem, no entanto, lugar no "onze" de Fernando Santos porque abundarão na selecção nacional centrocampistas capazes de meter a bola à distância e de inventar soluções maravilhosas quando o jogo da equipa emperra. É também notícia pelo seu futebol avesso a picardias e, de tal forma avesso, que não há maneira de ver um cartão amarelo para desgosto e escândalo do comité de decência do nosso futebol onde se abrigam os mais decentes entre os moralizadores do reino. Tem um tique muito próprio que é o de franzir os olhos antes de meter a bola onde quer e uma esquisitice destas devia, no mínimo, ser investigada. No início da semana, em Trás-os-Montes, inventou o lance de que resultaria o golo do triunfo da sua equipa e festejou-o como se não houvesse amanhã. Tudo isto somado e eis como o Benfica se tornou Pizzidependente."

A RTP humilhou os atletas nacionais

"Como só equilibra as audiências com o futebol, a RTP ignorou os Mundiais de Atletismo, enquanto entrega séries e programas aos amigos.

"Foi humilhante" a "ausência da RTP nestes Mundiais", disse ao ‘Record’ o presidente da Federação Portuguesa de Atletismo. A RTP gasta os nossos milhões em transmissões de bola, mas justificou dizendo que o Mundial era muito caro. Têm uma lata.
Enquanto isso, faz séries fracas ou miseráveis para dar trabalho aos amigos do administrador e do director, insiste em programas sem um pingo de interesse público para pagar a preço de ouro apresentadores inapresentáveis. Funciona em circuito fechado.
O ‘Telejornal’ da RTP1 tem perdido sistematicamente audiência este ano, mais do que os concorrentes no período estival. Já chegou a ter menos de 400 mil espectadores. Não admira que António Costa pressione a Altice para manter a TVI na órbita do governo.
"Love" em baixo: o programa de quadrilhice da TVI, ‘Love on Top’, com concorrentes em biquíni ou de tronco nu, não tem nem um pouco da audiência que os antecessores atraíam desde o ‘Big Brother’. A última edição não chegou aos 250 mil espectadores.
Al Jazeera: a perseguição ao canal de informação baseado no Qatar alargou-se a Israel, que mandou encerrar a delegação no país. Israel untou-se assim às ditaduras do Médio Oriente, como a Arábia Saudita. Mais um ataque à liberdade de expressão.
As séries policiais são um grande êxito das TVs. Agora giram mais em volta da vida pessoal dos protagonistas. ‘Candice Renoir’ (RTP2, AXN) leva vantagem sobre as americanas porque as actrizes não são todas iguais depois do botox e operações à cara.

Tendências
Golpe:
Escutas reveladas pelo ‘Sol’ confirmam o plano global de Sócrates para controlar os media: através dos bancos que controlava (CGD, BCP), do governo, da PT e de empresários pelintras (Vasconcellos), queria dominar, além da RTP, a TVI, a SIC e o ‘Público’, fechar o ‘Sol’ e até despedir o director socratinista do ‘DN’. Era um crime de atentado contra o Estado de direito. Quase um golpe de Estado.

Dentaduras:
Em ritmo acelerado, grandes conglomerados da Internet como a Amazon, o Facebook e o Google lançam-se na compra de direitos de emissão de grandes provas desportivas e na produção de conteúdos televisivos. Este desvio dos conteúdos coloca várias questões, como esta: que conteúdos originais sobram para os generalistas? Concursinhos? Reality chanchadas? Oferta de dentaduras?"

Televisão & Olímpicos equívocos

"Inopinadamente, o Comité Olímpico de Portugal (COP), num comunicado assinado pela chefia, após os resultados obtidos por Nelson Évora e Inês Henriques no Campeonato do Mundo de Atletismo (2017), aproveitou para criticar o "progressivo afastamento do desporto, nas suas mais diversas modalidades, do espaço público televisivo". E, como se este problema não existisse há, pelo menos, vinte anos, a olímpica chefia, em vez de se dirigir à tutela do desporto, completamente a despropósito, pediu à RTP "esclarecimentos" e o "apuramento de responsabilidades".
É claro que “esclarecimentos” e “apuramento de responsabilidades” são de fundamental importância para se perceber o estado em que se encontra uma situação desportiva que permite ocorrências como a da não transmissão pela RTP dos campeonatos do Mundo de Atletismo (2107) onde atletas portugueses até ganharam duas medalhas. Todavia, não se pode aceitar que a questão seja resolvida com um simples “lavar de mãos” através de um pedido à RTP para identificar o responsável e dar as necessárias explicações, por alguém que não tem quaisquer competências sobre a RTP. Até porque, como se sabe, em Portugal, nunca ninguém é responsável por nada nem por coisa nenhuma. Por exemplo, os portugueses, ainda hoje, esperam pelo tradicional Relatório do Chefe da Missão Portuguesa aos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro (2016) de maneira a compreenderem como foi possível, com o maior dispêndio de recursos de sempre, acontecerem os mais medíocres resultados desportivos desde os Jogos Olímpicos de Barcelona (1992). Quer dizer, o que há de sobra no desporto nacional é falta esclarecimentos e apuramento de responsabilidades pelo que, o pedido de esclarecimento e apuramento de responsabilidade da chefia olímpica não passa, à boa portuguesa, de um esforçado exercício de inutilidade, tal como seria também um exercício de inutilidade se a RTP, em 2016, tivesse solicitado ao COP “esclarecimentos” e “apuramento de responsabilidades” relativamente aos fraquíssimos resultados dos portugueses nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro (2016) que a RTP, certamente com lágrimas nos olhos, teve de transmitir.
É bom que se entenda que virar os holofotes da indignação nacional para a RTP só serve para iludir o problema a fim de deixar as verdadeiras causas fora da discussão e, mais uma vez, como já vem acontecendo de há muitos anos a esta parte, acabar tudo por ficar na mesma. Por isso, é necessário ir à verdadeira origem do problema na medida em que a atitude da RTP é, tão só, uma das causas, não sendo sequer a mais importante, do estado lastimoso em que se encontra a organização político-administrativa do desporto nacional. Nesta conformidade, o “rasgar das vestes” do presidente do COP não se coaduna com a indiferença com que o problema tem sido tratado, em especial, durante os últimos cinco anos em que chefiou o COP.
A verdadeira causa pela situação caótica em que o desporto nacional se encontra, da qual resulta o caso RTP, tem a sua origem em 2004-2005 quando, no XV Governo Constitucional, à revelia da generalidade dos agentes desportivos, foi desencadeado um modelo de desenvolvimento do desporto estabelecido protocolarmente entre o COP e o IDP (Instituto do Desporto de Portugal) sob o beneplácito da Secretaria de Estado do Desporto e Juventude que, embora apresentando resultados cada vez mais medíocres no final de cada Ciclo Olímpico, por inércia política, foi sendo prorrogado pelos governos dos diferentes partidos que se foram sucedendo na governação do País. Tratou-se de um modelo de desenvolvimento ultra liberal de características darwinista que, se por um lado, desresponsabilizou o Estado das suas inalienáveis obrigações como, entre outras, a institucionalização de um Subsistema de Alto Rendimento de onde devem resultar as representações nacionais incluindo as Missões Olímpicas, por outro lado, atribuiu ao COP funções que, considerando a lei portuguesa e a Carta Olímpica, ultrapassam a sua vocação e estão muito para além das suas competências e capacidades. Em consequência, foi estabelecida uma desastrosa ruptura com o tradicional paradigma organizacional do Sistema Desportivo português que decorria da institucionalização da Lei 1/90 (Lei de Bases do Sistema Desportivo) aprovada na Assembleia da República por unanimidade dos partidos. A partir de então, na mais completa ausência da tutela estatal, o desporto nacional começou a funcionar em “roda livre” com prejuízos para os portugueses e o País, como agora se verificou, com a falta de comparência da RTP no Campeonato do Mundo de Atletismo (2017).
E agora, só por uma visão pouco ou nada informada, enviesada ou minimalista do fenómeno desportivo se pode, à pressa, atribuir responsabilidades à RTP e, até, subliminarmente, sugerir que a culpa é da Geringonça sem que, no quadro da história recente do desporto nacional, se faça um enquadramento objectivo da situação em causa. Porque, se a falha, em primeira instância, não deve ser atribuída à RTP, quanto à Geringonça, a única coisa que se pode dizer é que ainda não teve coragem para avançar com a prometida Nova Agenda para o Desporto de maneira a alterar este lastimoso estado de coisas.
O que aconteceu foi que, a partir de 2004-2005, as Políticas Públicas, em regime de exclusividade, foram direccionadas para uma lógica ultra liberal com o objectivo de, à custa da subtracção de competências às Federações Desportivas, desencadear um programa de preparação olímpica a fim de criar valor económico e político através da conquista de medalhas olímpicas. O problema é que, ao cabo de três Ciclos Olímpicos, os objectivos falharam completamente pelo que, hoje, o desporto, para além do futebol, como, recentemente, referiu Vítor Serpa, director do jornal “A Bola”, está a funcionar “pelas ruas da amargura”.
Ora, perante este cenário confrangedor, embora a RTP tenha por contrato com o Estado a obrigação de prestar um serviço público, é necessário definir concretamente em que termos é que o deve prestar. Porque, a RTP ao receber por contrato dinheiros públicos está obrigada a respeitar a utilidade dos investimentos que faz. E, para isso, ao contrário de muitas organizações desportivas que não são praticamente controladas e vivem através de processos eleitorais, do ponto de vista democrático, pelo menos duvidosos, a RTP é controlada por um Conselho Geral Independente que é um “órgão de supervisão e fiscalização interna do cumprimento das obrigações de serviço público de rádio e televisão previstas no contrato de concessão celebrado entre a sociedade e o Estado, cabendo-lhe escolher o conselho de administração e respectivo projecto estratégico para a sociedade, bem como definir as linhas orientadoras às quais o mesmo projecto se subordina”. Ora, a este respeito, temos de dizer que gostaríamos muito que, na última revisão dos Estatutos do COP, acontecida em 2016, numa abertura democrática e sadia à sociedade, tivesse sido institucionalizado um órgão semelhante, de modo a que o Movimento Olímpico em Portugal que vive à custa do dinheiro dos portugueses, deixasse de ser gerido em circuito fechado, ao estilo “magister dixit” e sem uma ampla participação efectiva da sociedade portuguesa. Aliás, não seria nada demais na medida em que, até muito recentemente, o COP abria-se à sociedade através da admissão por eleição de membros por cooptação provenientes de diversas origens da sociedade civil. Por exemplo, Francisco Nobre Guedes, uma das mais marcantes personalidades do Movimento Olímpico nacional, em 1957, foi eleito presidente do COP de pois de ter sido cooptado.
Por isso, depois de anos a fio a dormir, ainda mal acordado por dois resultados brilhantes de atletas portugueses num Campeonato do Mundo, reclamar na comunicação social pelo cumprimento de um serviço público que ninguém sabe qual é, revela uma lamentável falta de pensamento estratégico para o desporto nacional. E esta é uma das mais infelizes realidades de um desporto, nas ruas da amargura, a viver à custa das flores produzidas por alguns atletas e treinadores de eleição. Nesta conformidade, a lógica capitalista ultraliberal institucionalizada em 2003-2004, sustentada, em regime de exclusividade, na conquista de medalhas olímpicas, perante os paupérrimos resultados conseguidos nos sucessivos Jogos Olímpicos que se situaram abaixo dos da Coreia do Norte, fazer uma oportunista crítica à RTP, aos olhos da generalidade das pessoas minimamente informadas, não passou de uma medida de diversão. Porque, relativamente ao serviço público por parte da RTP:
(1º) Devido aos sucessivos falhanços olímpicos, do lado da sociedade, não existe suficiente mercado que o sustente;
(2º) Devido à desresponsabilização do Estado, do lado dos governos, não existe a mínima pressão política para o financiar.
Portanto, perante o ingénuo clamor nacional, se existem aspectos úteis que decorrem da ausência da RTP do Campeonato do Mundo de Atletismo (2017) um deles é, certamente, o da RTP ter explicado aos portugueses que, no regime de economia de mercado em que o País vive, ao qual o COP, em 2004-2005, assumiu ser um dos seus “activus”, é o interesse social ou o interesse político que, tal como no futebol, deve sustentar as transmissões de grandes eventos desportivos. Porque, só assim, é garantida a viabilidade económica do projecto através do pagamento directo das pessoas interessadas ou através do suporte financeiro do Estado porque, tal suporte está integrado nas Políticas Públicas em matéria de desporto. O problema é que, desde 2004-2005, o Sistema Desportivo nacional, entre o económico e o social, vive na maior das promiscuidades que lhe corroem a credibilidade sempre que, à pressa, os dirigentes pretendem justificar os desaires de uma situação por eles próprios criada e alimentada.
É claro que a RTP devia ter transmitido o Campeonato do Mundo de Atletismo, contudo, a responsabilidade não é dela por não o ter feito. A responsabilidade é de quem assumiu funções para as quais não tinha nem tem capacidades nem competências e, irresponsavelmente, libertou o Estado de responsabilidades que, no quadro político, económico e social do País, só a ele competem. Em consequência, ao cabo de mais de doze anos de erros, enganos e contradições, parafraseando Oscar Wilde, temos de admitir que os deuses do Olimpo, em 2004-2005, atenderam às preces dos dirigentes porque os queriam castigar. Em conformidade, deram-lhes a alegria das competências e do dinheiro para conquistarem as medalhas olímpicas que, depois, como os deuses já sabiam, os dirigentes não foram capazes de alcançar. E esta é uma das imagens míticas que melhor caracteriza a situação actual do desporto português.
É tempo do governo mudar o rumo aos acontecimentos de modo a, com a máxima urgência, assumir a iniciativa política que ainda lhe resta, a fim de pôr cobro ao regime de funcionamento em roda livre em que o Sistema Desportivo se encontra a viver. Infelizmente, o governo Já não vai a tempo de salvar a Missão Portuguesa aos Jogos Olímpicos de Tóquio (2020) mas ainda vai a tempo de começar a melhorar o Nível Desportivo do País de modo a que possam surgir resultados consolidados na sociedade civil a partir de 2024. Caso contrário, o desporto nacional, para além dos esporádicos resultados desportivos de um ou outro atleta de excepção, vai continuar no mais confrangedor estado de desorientação em que se encontra."

Atletismo via rádio

"O atletismo é uma modalidade televisiva por excelência? É com toda a certeza. O Mundial é uma competição importante? Não há qualquer dúvida. Seria relevante o canal público ter assegurado os direitos de transmissão televisiva? Claro que sim. Podem dizer que estas perguntas e respostas são relativamente fáceis. Mas, na verdade, nada disto se passou durante o mundial. Valeu-nos as intervenções diárias e em directo da Antena 1. Atletismo via rádio ainda é uma tradição.
Os portugueses ficaram privados de ver em directo o salto de Nelson Évora e três dias depois a medalha de ouro e o recorde do mundo de Inês Henriques nos 50 km marcha. Como diz o povo: Acham isto normal? O que está em causa é a ligeireza com que a RTP abordou a questão. Só quando foi pressionada pelas declarações de Jorge Vieira, presidente da Federação Portuguesa de Atletismo (FPA), que considerou "humilhante" a ausência da RTP na transmissão dos campeonatos, é que a estação pública acordou para a realidade. Certamente não estava à espera do telefonema de conforto do Ministro da Educação para com o líder da FPA. Só nessa altura sentiu necessidade de emitir um comunicado, defendendo-se dos custos serem incomportáveis.
Ao certo não se sabe quais os valores que estão em causa. Fala-se que a federação internacional (IAAF) terá pedido cerca de 500 mil euros pelo pacote-base dos mundiais até 2030, números que, entretanto, não foram desmentidos. Ainda não sei o que a RTP vai fazer com os mundiais de canoagem e judo, mas tenho para comigo que o melhor era pedir junto da IAAF os valores certos..."


PS: Independentemente de tudo o resto, não se deve ignorar que a Eurosport, faz parte do grupo Eurovisão, do qual a RTP é um dos parceiros...!!! Se calhar, se a Eurosport tivesse disponível no TDT o 'problema' ficaria resolvido...!!! Mas colocar mais canais no TDT é outra 'novela'!!!

Sabor redobrado em Chaves

"Adeptos do Sporting não têm razão para estar deprimidos com o empate frente ao Steaua, pois o resultado foi bem melhor que a exibição.

O Sporting beneficiou de um salvífico penalty para não perder pontos, em casa, frente ao Setúbal, o FC Porto arriscou em Tondela ter um dissabor nos minutos finais que lhe poderia ter custado dois pontos, e, por fim, o Benfica desperdiçou oportunidades durante 90 minutos, para ir descobrir a luz do túnel da vitória já no tempo de compensação, dando mais sabor aos três pontos da difícil deslocação a Chaves.
Será isto o anunciar de um campeonato onde se vão perder muitos pontos? Não creio. Penso mesmo que qualquer um dos três maiores emblemas irá perder poucos pontos, não me surpreendia se pela primeira vez na história do nosso futebol houvesse três equipas perto ou acima dos 80 pontos nas contas finais. Isto dito redobra o sabor dos três pontos de Trás-os-Montes. O Chaves tem valor e não será fácil lá vencer, mas sobretudo porque o Benfica não merecia perder pontos num jogo em que foi quase sempre superior. Como a justiça em futebol é muito relativa, vencer nesta face é determinante. O Benfica cumpriu em Chaves e tem de cumprir já amanhã, em casa, frente ao Belenenses. Tem de ser encarada com igual seriedade e ambição reforçada a batalha de amanhã, contra uma equipa moralizada pela sua vitória e historicamente difícil. Seria muito bom chegar sem mácula (e um título) à paragem do final do mês.
Os adeptos leoninos deprimiram com o resultado frente ao Steaua, mas não têm razão para isso, pois o resultado é positivo e bem melhor que a exibição. Estou convicto de que o Sporting estará na próxima fase da Champions, até pelas limitações do seu adversário, com a mesma certeza de que se não jogar mais será bombo da festa na fase de grupos.
Faltam 13 dias para o fecho do mercado. São intermináveis para adeptos e treinadores. Os adeptos não manipulados, quase sempre porque querem, acreditam nas suas verdades da forma que lhes é apresentada pelos seus ministros de informação porque gostam. Como nos ensinava um grande escritor inglês, quando insistimos em ver pelos olhos de outros estamos sempre mais perto da mentira que da verdade. Também no futebol cada um escolhe os seus Mohammed Al-Sahaf, na esperança de que no fim, os seus Iraques vão mesmo ganhar a guerra.
Por mim, basta-me, por agora, ganhar amanhã ao Belenenses e ver chegar mais um bom guarda redes."

Sílvio Cervan, in A Bola