"Fala-se demais de casos de influências sobre as arbitragens, mas apresenta-se pouco material minimamente credível. Talvez seja bom recordar um relatório do inspector Casimiro Simões da Polícia Judiciária sobre a matéria em causa. Afinal, vem a propósito.
A teia de investigações montada pela Polícia Judiciária - durante aquele que ficou conhecido como Processo do Apito Dourado - em redor de algumas figuras menores do futebol português que trabalhavam afincadamente para controlar a arbitragem e para a dominar a seu bel-prazer alargou-se de um momento para o outro e viu enlaçarem-se nas rede tubarões de grande porte.
Pelas suas ligações a Gondomar e ao Gondomar Sport Clube, o major Valentim Loureiro foi o primeiro.
Agora cabia a vez ao presidente do FC Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa.
Escreve o inspector Casimiro Simões no seu relatório devastador que fez abanar todos os alicerces do futebol português: 'No passado dia 12/8/2003 realizou-se o jogo da Supertaça concernente à época de 2002/2003, opondo a equipa do Futebol Clube do Porto (vencedora do último campeonato da 1.ª Liga) e União Desportiva de Leiria (equipa finalista vencida da última Taça de Portugal). O vencedor da 1.ª Liga arrebatou o troféu, derrotando o seu adversário por 1-0.
Através da sessão 5659 (CD 18) do alvo 21179, ficamos a saber que o árbitro daquele jogo, Pedro Proença, foi nomeado por Pinto de Sousa a pedido do presidente do Futebol Clube do Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa'.
Os investigadores não terão deixado de sentir que entravam, finalmente, num mundo proibido. Aquilo que se murmurava há anos nos corredores da sociedade portuguesa parecia ter, finalmente, comprovação inequívoca.
Continuemos, pois, a estudar pormenorizadamente o relatório em causa. Escreve o inspector Simões: 'Este facto revela-se de grande gravidade e é também indiciador de que o presidente daquele clube de futebol poderá eventualmente exercer determinadas pressões para a escolha de árbitros que apitam outros jogos da sua equipa. Como este clube participa no campeonato da 1.ª Liga, o alvo dessas pressões ou influências será eventualmente o presidente da Comissão de Arbitragem da LPFP'.
Recorde-se que, por via de a sua organização ser da responsabilidade da Federação Portuguesa de Futebol, a escolha do árbitro para dirigir a Supertaça cabia ao Conselho de Arbitragem da FPF, presidido por Pinto de Sousa. Havia, por isso, que alargar o âmbito das investigações. Todo o edifício do futebol estava agora em causa. E atendendo aos factos entretanto apurados e à actuação dos suspeitos havia que espalhar o leque dos alvos a serem escutados. Seria esse o passo seguinte.
Lista de suspeitos
Como muitos dos nossos leitores estarão recordados dos velhos livros de detectives, havia uma lista de suspeitos que engrossava a olhos vistos. Neste processo não se procurava um criminoso, mas sim vários. E o inspector Casimiro Simões enunciava claramente os principais visados:
José Luís da Silva Oliveira, presidente do Gondomar Sport Clube - '(...) para além dos dois telemóveis já interceptados, desde há algum tempo que este suspeito faz uso de um terceiro telemóvel (...) e é através dele que faz muitas chamadas importantes';
Valentim dos Santos de Loureiro, presidente da Liga Portuguesa de Futebol Profissional - 'A investigação precisa de esclarecer que o major assume nas 'manobras' de José Oliveira, apurando se se limita a tomar conhecimento dos esforços de José Oliveira ou se, tal como afirma na sessão 10307 (CD 23) do alvo 20798 - afirmando que vai ter uma conversa com Pinto de Sousa -, também pratica actos susceptíveis de influenciar as nomeações e actuações dos árbitros';
Joaquim Manuel Moura Castro Neves, dirigente do Gondomar Sport Clube - 'É o homem 'de não' de José Oliveira no que diz respeito a entrega de prendas a árbitros';
Pedro Gonçalo Morais Sanhudo, árbitro da 2.ª categoria nacional - 'É amigo de José Oliveira e já afirmou ser capaz de beneficiar a equipa de Gondomar';
António Silva Henriques, vice-presidente do Conselho de Arbitragem da FPF, tem a seu cargo a nomeação dos observadores de 2.ª categoria - 'António Henriques já mostrou ser capaz de alterar as classificações de árbitros por motivos meramente arbitrários';
Francisco Fernando Tavares da Costa, vogal do Conselho de Arbitragem da FPF, elemento que tem a atribuição de nomear os árbitros para os jogos da II Divisão 'B' - 'A investigação tem urgência em apurar quais as eventuais pressões ou influências, esclarecendo qual o papel que Francisco Costa desempenha na execução dessas linhas de força';
Luís Manuel Blanco Rocha Guilherme, presidente da Comissão de Arbitragem da LPFP, órgão que nomeia árbitros para os jogos da 1.ª e 2.ª Ligas - 'Dos factos já descritos no item 2.3 da secção III, indicia-se a suspeita de que a Comissão de Arbitragem da LPFP estará alegadamente a ser alvo de determinadas pressões influências exteriores. A investigação tem urgência em apurar qual a verdadeira receptividade de Luís Guilherme às eventuais pressões ou influências':
Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto - 'Dos factos já descritos no item 2.4 da secção III, indicia-se que este dirigente desportivo exercerá eventualmente determinadas pressões para escolha dos árbitros que apitam jogos da sua equipa'.
Uma lista com pesos pesados, como se vê. À qual, o inspector Simões acrescentava uma figura meio obscura: 'Dos factos já descritos no item 1.2.2 da secção III, pode extrair-se a conclusão de que o clube Gondomar Sport Clube tem vindo a oferecer prendas aos árbitros que apitam os seus jogos. Essas prendas são fornecidas por um tal sr. Fernando. (...) Sendo necessário apurar mais dados sobre este individuo, ousa-se sugerir às autoridades judiciárias competentes que seja oficiada a respectiva operadora para que forneça aos presentes actos o(s) códigos(s) dos últimos três carregamentos do cartão com o número acima referido'.
Obtidas as devidas autorizações por parte do juiz do Tribunal de Gondomar, já não era uma rede que se apertava à volta destes suspeitos: era um verdadeiro torno.
E que nos faz, hoje em dia, ver as coisas através de uma perspectiva bem diferente do que aquela que se comenta a tostão nas pantalhas televisivas."
Afonso de Melo, in O Benfica
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