terça-feira, 23 de maio de 2017

É impossível não chorar contigo, Tiago!

"Os festejos, entre os abraços. Saltos aos pares, trios. Quartetos. Quintetos. O sprint para o lado dos adeptos, que descem apressados os degraus, já de braços esticados. Os gritos, os cânticos. A explosão das bancadas. Os passou-bem aos desconhecidos, de outras famílias da mesma tribo. Mercury a deixar sair a canção eterna.
O espumante, um banho antes do banho. A tarde a continuar tarde, a noite a aguentar-se dia. Até despejar-se tudo. Um ano inteiro acumulado, recalcado.
Depois, o silêncio.
Ou os braços caídos, os olhos no chão. Lágrimas. A cabeça por cima dos pulsos, assentes em cima dos joelhos. Todos sentados na relva. Caneleiras na mão. As palmadas de consolação no pescoço, nas costas, de adversários ou companheiros aparentemente mais resistentes à desilusão. Os olhos a secarem-se, aos poucos. A resignação. As bancadas a esvaziar, sem olharem para trás. Injustas. Tão injustas.
O banho, sem palavras. Os frames a passar à frente dos olhos. Os ses em forma de slide, para quem sabe o que são slides, a consciência a apertar o botão para passar-se ao seguinte. Conversas de circunstância, enquanto se esconde a decepção num caixote no quarto-dos-fundos da memória.
Por fim, o silêncio. Chegará também.
O verão. Desligar da corrente. A praia, longe. A paz naquelas águas a deixar ver o fundo, absorventes. Ao lado, os rivais, agora de novo amigos antes de voltarem a ser rivais.
Os jornais. As manchetes e os 300 caracteres na última página, a uma coluna. As cachas jornalísticas. E as não-notícias, no meio das simples notícias. O telefone a tocar. Decidir atender ou deixar tocar. A silly-season.
A oportunidade.
A dispensa.
Ainda, silêncio, mas um preenchido, que não é para todos. Porque pior é o silêncio no meio do vazio. No meio do nada. E esse, é só para quem diz adeus de vez, entre as lágrimas que teimosamente não param de cair.
Francesco Totti. Xabi Alonso. Philipp Lahm.
O adeus será, aparentemente, definitivo. Já não haverá um depois. Foi apagado o recomeçar, a possibilidade de fazer restart, fosse depois da festa ou da tristeza. As chuteiras ficaram presas na parede, não se conseguem de lá arrancar. É um vazio que não se torna a encher, e que precisa de uma metadona qualquer, um substituto do vício até que desapareça. Uma carreira de treinador. Ou empresário. Dirigente.
E há algo que nunca desaparece. A tentação que os persegue de tocar numa bola a saltar do outro lado da estrada, que se esconde debaixo do encolher dos ombros. De uma irritação na pele.
Não conheço Totti. Ou Alonso. Mesmo Lahm. Ou melhor, conheço a classe, o talento, a personalidade em campo. Vibrei com muitos golos-em-verso do italiano, inúmeros passes de atirador-furtivo do espanhol e centenas de cortes eficazes do alemão. Acompanhei Francesco e Philipp nos seus clubes de sempre, tal como Alonso, desde a Real Sociedad. De Anoeta até o Arena. Se conheço essa sua parte, reconheço o quanto o futebol de que gosto fica mais pobre. Agora que este se começa a ir embora, ainda a olhar para trás, também sinto o vazio.
A Tiago também o conheço há muito tempo. Desde que deu o primeiro pontapé televisionado. Também o conheci finalmente em Majadahonda, há sete anos. Entrevistei-o, conversámos depois enquanto caminhávamos a caminho dos carros. Sempre gentil. Prestável. Humilde.
Se daquele futebol simples, racional, sempre maduro era impossível não ser fã e não achar que fazia sentido em todos os campos e em todas as equipas, da pessoa só podia continuar a dizer bem. A sentir que todas as peças encaixavam. Tinha estado com um dos grandes.
Sei que ele sabe que podia ter sido ainda maior, e podia. Mesmo assim, que carreira fantástica! De uma grandeza ímpar, ao alcance de poucos. Acredito que tenha sido o fim, quando o Calderón até se foi com ele.
O tempo não perdoa nem a quem o merece. O adeus, mesmo que seja apenas ao Atleti, foi duro. Demasiado duro, e não deixou ninguém indiferente. Há gente assim, a quem ficamos a querer sempre bem, mesmo que nunca mais nos cruzemos.
É impossível não chorar contigo, Tiago!"

1 comentário:

  1. Na hora da saída,(à má fila...),O comportamento dele para com o BENFICA, nao foi própriamente um modelo de honestidade e franqueza. Nõ me esqueço disso.

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