"Depois do jogo das seis bolos no poste do Estádio da Luz, o Benfica viu-se derrotadoem Dortmund por 0-5. Um momento triste na história encarnada no qual a ausência de Eusébio pairou como um fantasma negro.
Pela primeira vez ouvia-se falar de um candidato alemão à vitória na Taça dos Campeões. Pudera! O Borussia de Dortmund, depois de ter sobrevivido no Estádio da Luz a um vendaval de futebol ofensivo que levou seis (!!!) bolas às traves e aos postes do seu guarda-redes Tilkowski, vingava-se agora em casa, goleando o Benfica por 5-0. Querem mais? Lajos Czeizler, o treinador dos encarnados, estava naturalmente triste: 'Os meus pupilos desapontaram-me, com exclusão de Coluna. O clima agreste prejudicou os portugueses, mas a verdade é que os alemães foram melhores. Nem pareciam os mesmos que actuaram em Lisboa...' Um desalento perfeitamente natural. Afinal nunca o Benfica sofrera uma derrota tão violenta na Europa.
A semana passada falámos aqui nestas suas páginas e para aqueles que vão tendo a infinita paciência de me ler, sobre o único confronto entre Benfica e Borussia de Dortmund na já tão longa história das taças europeias. Foi na época de 1963/64. Em casa, a águia foi imperial, sujeitando os alemães a uma provação terrível que só a fortuna impediu de se transformasse num cenário de devastação. Seis boas na madeira foram demais para um resultado tão curto - 2-1. A viagem à Alemanha seria, como é óbvio, complicada. Tornou-se complicadíssima. Sobretudo porque Eusébio, magoado, ficou de fora.
Veja-se como formaram as equipas:
Borussia Dortmund - Tilkowski; Burgsmuller e Redder; Kurrat,Geisler e Sturm; Wosab, Schmidt, Brungz, Konietza e Emmerich.
Benfica - Rita; Cavém e Cruz; Luciano, Humberto e Coluna; José Augusto, Santana, Yauca, Serafim e Simões.
A eliminatória decidiu-se em apenas quatro minutos: 34 - golo de Konietza; 35 - golo de Brungz; 37 - golo de Brungz. A vantagem germânica jamais seria contrariada. Os jornais chamaram-lhe mesmo 'O Baile Alemão'.
Um Dortmund à Benfica
Defendo e irei defender sempre que a história dos clubes é feita também das suas derrotas. E não há que ter medo de falar delas porque também servem para perceber a grandeza de que são feitos. A derrota de Dortmund, no dia 4 de Dezembro de 1963, foi um dos momentos mais negros da vida do Benfica, na Europa. Mas, tal como a vitória escassa das seis bolas ao poste, é um momento ímpar que deve ser recordado. É o que estou a fazer, com vossa licença.
Leiamos um jornal da época: 'Um espectador que conhecesse bem o sistema do Benfica e entrasse no Estádio Rote Erde (Terra Vermelha) pensaria que os jogadores de calção escuro eram os portugueses: a forma como se escalonavam no terreno, a ralé com que se batiam, a forma como lutavam e até a facilidade com que tratavam a bola, levariam esse espectador a pensar que aqueles é que eram os 'malabaristas da bola' do Benfica, como a imprensa várias vezes lhes chamara. A verdade é que o Benfica jogava com o seu habitual equipamento: calções brancos e camisola encarnada. Mas não era habitual ver-se dominado daquela maneira por uma turma que empregava precisamente as armas dos lisboetas - boa táctica, boa técnica individual, e garra, muita garra, querer e entusiasmo'.
Assim seria pelo tempo fora. Os portugueses sofriam e não conseguiam reagir. Coluna era imperial, mas insuficiente. A ausência do Pantera Negra pairava sobre o estádio como um fantasma. 'Os jogadores do Benfica acusaram nitidamente as dificuldades causadas pelo desgaste - desgaste motivado pela temperatura, desgaste derivado ao poder físico do adversário, desgaste por ter de acorrer sempre que necessário um reforço de ocasião'.
Uma eliminatória muito, muito equilibrada, viu-se estilhaçada pela realidade dos números. Em Lisboa, o Benfica falhou inacreditavelmente a goleada; em Dortmund, o Borussia não teve piedade.
Ficavam os antigos campeões da Europa pelo caminho; chagaria o Borussia de Dortmund à meia-final para cair aos pés do Inter de Mião (2-2 e 0-2) que viria a vencer essa edição da Taça dos Campeões Europeus. Agora, estamos à beira de um novo episódio deste confronto que a memória encarnada reteve. Mesmo que por más razões."
Afonso de Melo, in O Benfica
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