quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Chapecoense

"A vida marca o início do caminho para a morte. Mas, diante da certeza da morte, a nossa vida constrói-se na incerteza do seu momento.
Anteontem um avião despenhou-se. Transportava, entre os passageiros, jovens que haviam abraçado a vida de futebolistas. De um clube jovem, mediano, remediado: Chapecoense, da cidade de Chapecó no Estado sulista de Santa Catarina. Nesta última viagem para quase todos, os jogadores levavam o orgulho de finalistas e a esperança de poderem ser vencedores da Copa Sul-Americana (correspondente à nossa Liga Europa).
Na vertigem letal, tudo o que antes era alegria, ansiedade, ilusão, vida enfim, foi sumido pelo silêncio da morte. O destino - ou seja lá o que for - acabou com a vida sonhada de muitos e poupou alguns a este fatídico acidente. O guarda-redes Marcelo e outros atletas porque não foram convocados. O filho do treinador Caio Júnior agora falecido, perdeu o avião da morte por se ter esquecido do passaporte. A aeronave foi a mesma que, há dias transportara Messi e a selecção argentina. A fronteira entre ser e deixar de ser é mais pequena do que a passagem de um quase invisível grão de areia na âmbula da ampulheta. Um fio, um acaso, podem juntar-nos ou apartar-nos do local e tempo errados.
Nestas alturas, percebe-se quão relativo e estéril são o azedume, a discussão, o enviesamento, a culpa, a batota à volta do futebol. Percebe-se, mas logo se volta a esta dita normalidade.
Depois do Torino (1949), Manchester United (1958), Zâmbia (1993) e outras equipas dizimadas por desastres aéreos, foi a A. Chapecoense. Haja forças para o reerguer em preito da memória e em nome do futuro."

Bagão Félix, in A Bola

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