domingo, 6 de novembro de 2016

Uma vista alegre

"Em cada um dos clássicos a arbitragem sempre é abordada. Da nomeação à decisão... contra a nossa paixão.

1. Hoje num esgotado Estádio do Dragão disputa-se mais um dos clássicos do futebol português. Fiz muitas viagens, na altura bem longas, entre Viseu e o Porto ou, mais tarde, entre Lisboa e a cidade Invicta para, sempre com a vista alegre, presenciar clássicos do futebol português. Era um entre milhares de benfiquistas que acompanhavam, com fervor, a equipa do seu coração. E da sua permanente paixão. Depois, quando com dedicação e prazer dei aulas na Lusíada do Porto, e já não era um cidadão desconhecido, partilhava a alegria dos jogos com os meus alunos e alunas. Sentindo o que era o adversário e, por vezes, poucas, pressentindo, sempre, a hospitalidade, mesmo que renhida, das gentes do Porto. E de Gondomar e de Matosinhos, de Rio Tinto e da Foz, de Campanhã às Fontainhas. E recordo, em cada um destes clássicos, e com uma saudade imensa, o Doutor Pôncio Monteiro, um Amigo que Deus levou cedo demais. E quando vejo, por instantes, nas imagens de televisão, a Dona Isabel, sua dedicada Esposa na tribuna do Dragão, percebo bem, na linha de George Sand, que «a recordação é o perfume da alma»! Como o reconhecimento! O que sei é que nesses tempos singulares da vivência da docência no Porto - como o Francisco ou a Mónica lembrarão bem - por vezes almoçava ou jantava divinalmente no Aleixo, e ainda com o sabor único dos filetes de polvo e da pescada, chegava à zona das Antas para buscar, no meu íntimo uma alegria! Assim vibrei no anterior, e bonito, Estádio das Antas em muitos jogos entre o Futebol Clube do Porto e o Benfica. Recordo, ainda com muita dor, e com arbitragem de António Garrido, os quatro golos de Lemos no final de Janeiro de 1971! Como lembro, com imenso prazer, em finais de Abril de 1001 - em rigor dia 28 - em que, com arbitragem de Carlos Valente, o César Brito substitui o Pacheco e em quatro minutos marca dois golos e embala a equipa do Benfica, a quatro jornadas do fim, para a conquista do campeonato com dois pontos de vantagem em relação ao Futebol Clube do Porto. É o celebre jogo em que a equipa - de Neno a Veloso, de Paulo Madeira a Valdo, de Vítor Paneira a Valdo, de Rui Águas a Thern, entre outros - se equipa no túnel de acesso em razão do cheiro a bagaço que inundava o balneário. Não esqueço, igualmente, os cinco a zero que já no Dragão, e com Jorge Jesus - e com arbitragem de Pedro Proença - sofri no arranque de Novembro de 2010 nem a sorridente vitória arrancada em Fevereiro de 1975 por três a zero com golos de Vítor Martins, de Moinhos e de Toni! Recordas Toni? Que alegria!

2. Saí, assim, das Antas e do Dragão algumas vezes com a vista bem alegre. Sorridente. Por vezes inchado. Outras bem encolhido.
(...)

3. Em cada um destes clássicos a arbitragem sempre é abordada. Desde a nomeação à decisão... contra a nossa paixão. Por vezes há maledicência. Em outras pouca prudência. Também instantes de imaginação e certos momentos de falta de moderação. O inequívoco é que, em regra, estes clássicos são arbitrados, e bem, pelos principais árbitros do momento. Mais experientes e mais reconhecidos. No princípio da década de 90 do século passado os dois árbitros que mais apitaram este clássico foram Fortunado Azevedo e Veiga Trigo. O encontro dos golos de César Brito foi arbitrado, para registo, por Carlos Valente. E só nos anos 93 e 94, por recordação, apita por duas vezes este clássico o Carlos Calheiros. A partir da segunda metade da primeira década deste século estes clássicos entre Porto e Benfica, com poucas excepções, foram arbitrados por três árbitros: Pedro Proença, Jorge Sousa e Artur Soares Dias. O que significa que há permanência na designação. Não há renovação que, por vezes, parece que não é desejada. Assume-se a reputação. Rejeita-se a revolução. Ganha a experiência. Diminui-se, e bem, a oposição. E onde há moderação há menos oposição. Na repetição dos árbitros designados. Como aconteceu hoje, e uma vez mais, com Artur Soares Dias. Um árbitro conhecido e reconhecido.

4. (...)"

Fernando Seara, in A Bola

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