"Nos seus tempos de Moçambique, Mário Coluna foi recordista de salto em altura, aprendiz de mecânico de automóveis e chegou a fugir de casa dos pais para trabalhar e jogar futebol em João Belo, no Ferroviário.
De Mário Coluna pode escrever-se tudo mais um par de botas, sobretudo se forem botas iguais às que ele usava em exibições extraordinárias pelos campos de futebol, literalmente por todo o mundo.
Depois há coisas que se recordam do grande capitão do Benfica e que já mergulharam no olvido de qualquer um de nós. Jovem, espigadote, não se limitava a querer dar nas vistas como jogador da bola e pensava naquilo que o futuro poderia dar-lhe ou negar-lhe. Por isso, procurou trabalho, recusando-se a viver das prebendas paternas. Aos 16 anos tornava-se aprendiz de mecânico de automóveis no Almofarixado da Fazenda, em Lourenço Marques. O primeiro ordenado? 1500 escudos por mês. Nada mau para um rapazinho da sua idade. E desenvolveu para o resto dos dias uma paixão por carros que era quase um vício.
Sobre Coluna podem desenrolar-se histórias infinitas. Era preciso um livro para contá-las e talvez já ande por aí na forja. O futebol podia ser a coisa mais importante da sua vida, mas não o preenchia por completo. Dedicou-se ao atletismo. Era um excelente corredor de 400 e 800 metros, mas atingiu o topo no salto em altura, tornando-se recordista da província de Moçambique com 1,835 metros, algo que ao tempo merecia ohs! de admiração.
Uma viagem à Maurícia
Um dia, a selecção de Lourenço Marques foi jogar à ilha Maurícia, e Coluna estava lá, como não podia deixar se ser. Deixá-lo contar: «Eu, que na minha terra já tivera umas 'paixões', tive na Maurícia o meu primeiro namoro a sério. Nada dizia de francês a não ser 'merci' ou bonjour', mas como arranhava de inglês, consegui fazer-me entender. Ela chamava-se Marie Claire e, no regresso a Lourenço Marques, trouxe a sua fotografia na minha carteira. Mais tarde tudo se malograria, e nunca mais soube o que era feito de Marie Claire».
Eram outros, os tempos de Mário Coluna em Moçambique. Fugiu da casa paterna para trabalhar e jogar no Ferroviário de João Belo. Uma necessidade de liberdade, de independência arrastava-o para longe. Mas não durou muito. O pai encontrou-lhe um emprego em Lourenço Marques, e Coluna voltou para jogar no Desportivo. Dividia os automóveis com a bola. Mas na bola pagavam-lhe um terço do que lhe pagavam na oficina: 500 escudos. Uma gratificação. Somava então 16 anos. Era um menino.
A pouco e pouco, no horizonte, surgiu-lhe a esperança da Metrópole. Lisboa e Tejo e tudo. O Benfica teria para ele um lugar único na história do futebol do mundo. Mário Coluna soube mais que merecê-lo. Tomou posse de um estatuto ímpar e tornou-se no grande «capitão» dos encarnados de todos os tempos. Muitos dos colegas tratavam-no por «Senhor Coluna». Não lhe faziam favor nenhum. Sempre foi isso mesmo: um senhor."
Afonso de Melo, in O Benfica
Daqueles que também merecia uma estátua nas imediações da Luz.
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