quarta-feira, 28 de setembro de 2016

O Chaves bom e o mau

"Em cada temporada desportiva, os clubes esperam pela visita da águia para receberem o 'abono de família anual'.

À Liga cabe regulamentar as competições e zelar pelo seu normal desenvolvimento e aos clubes compete a responsabilidade pela organização dos jogos em respeito com as regras aprovadas, de aí que não deve ficar sem censura a situação registada no estádio flaviense, no último sábado, que pôs em perigo a segurança dos espectadores devido a um estratagema inaceitável e que não deixou bem na fotografia o emblema anfitrião.
Admite-se que os mandantes do Desportivo de Chaves, afastado da Primeira Liga desde o ano de 1999, não se tenham apercebido de que, entretanto, as coisas mudaram muito, para melhor, com generalizado esforço no sentido de profissionalizar e modernizar o edifício organizativo do futebol português.
Sabe-se que é o Benfica que mais receitas gera para os clubes de pequena e média dimensão em cada deslocação que faz. Não estou a dar novidade alguma. Apenas a fazer eco de constantes e repetidas confissões de dirigentes desses mesmos clubes, os quais, em cada temporada desportiva, esperam pela visita de águia para receberem o abono de família anual, mais gratificante ainda se ela estiver pujante e a liderar a classificação, como sucede. Motivo por que os tais mandantes flavienses, não sei se por ignorância ou se por aproveitamento, ou um pouco das duas coisas, mas sem avaliar as consequências da medida, ousarem entrar em sentido proibido, adulterando a interpretação de uma generosidade regulamentar que autoriza o recurso a um ingresso para acompanhantes de sócios, pensada, julgo eu, para facilitar os mais necessitados dentro dos limites da razoabilidade, como sugerem as boas práticas numa sociedade civilizada.
Não foi a primeira vez que o Chaves e outros clubes se respaldaram nessa escapatória para aconchegarem o lado da receita, mas agora foi-se longe de mais  e a Direcção executiva da Liga, como é hábito e costume, não me parece em condições de virar a cara para o lado à espera que a tempestade passe.
Houve absurda especulação no valor dos ingressos mais caros. Houve desrespeito pelo bem-estar de quem os adquiriu. Houve um problema de segurança que só não assumiu dimensão mais abrangente devido à presença e intervenção da força da PSP. Houve relatos de cenas inadmissíveis em jogo de Liga profissional em que participou o campeão nacional do país que é o actual campeão da Europa. Houve bastante para impedir o doutor Proença de dizer que não sabe ou nada pode fazer. A ignorância e a incapacidade são más conselheiras. Juntas são o prenúncio da desordem...
Depois do escândalo no Salgueiros-Sporting, na última jornada do campeonato de 2000, em que, na ausência de impedimento legal, a Direcção do clube de Paranhos exigiu aos adeptos leoninos valores que chegaram a dezenas de milhares de escudos, a Liga percebeu que tinha de colocar um travão na selvajaria bilhética em nome da credibilização do negócio, com a divisão dos estádios por categorias e balizando as tabelas de preços para cada uma delas.
Dezasseis anos decorridos verifica-se, contudo, que há mentalidades entranhadas na classe dirigente que não se recomendam. Por isso, é preciso mais controlo e rigor.
Não se confunda, porém, o excelente trabalho que o treinador Jorge Simão está a fazer em Trás-os-Montes e o fantástico desempenho de todos os seus jogadores com o resto... Porque do jogo com o Benfica no passado sábado emergiram dois Chaves: o bom, que merece ser elogiado; o mau, que deve ser penalizado. Como escrevia Carlos Pinhão, ai que saudades dos tempos em que Emílio Macedo era a referência elogiada e respeitada do Desportivo...
(...)"

Fernando Guerra, in A Bola

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