quarta-feira, 20 de julho de 2016

O enterro das lágrimas de Eusébio

"A vitória em França pôs ponto final a 50 anos de ses, quases, lágrimas, suspiros, brilharetes e vitórias morais. Com a geração capiteneada por Cristiano festejamos finalmente a sério.

Ainda o Europeu e este Julho do nosso contentamento desportivo. Não se sabe se Fernando Santos vai continuar na Selecção: há ofertas chorudas no horizonte e o engenheiro estará a pesar os prós e os contras de ficar e tentar dar seguimento à obra (sabendo que é muito difícil fazer igual...) ou partir sem correr risco de chamuscar a fabulosa folha de serviços (título europeu e 14 jogos oficiais sem derrota!). Se Fernando Santos for embora, o seu sucessor (quem? não é fácil, mas... André Villas Boas e Marco Silva estão inactivos) herda o fardo pesadíssimo de uma Selecção campeã que, em França, pôs ponto final a 50 anos de ses, quases, ais, lágrimas, suspiros, brilharetes e vitórias morais; uma Selecção que silenciou definitivamente o fadinho que este País anda a soluçar desde as lágrimas de Eusébio no Mundial de 1966. O fadinho dos azares. Das desculpas. Das atenuantes. Do que podia ter sido. Das vitórias morais. O fadinho dos ais, tantos ais: a meia-final que não devia ter sido no estádio de Wembley em 1966; o tíro cruel de Platini em 1984; a palhaçada de Saltillo em 1986; o chapéu de Poborsky em 1996; a mão de Abel Xavier em 2000; o soco de João Viera Pinto em 2002; a cabeça de Charisteas em 2004; o penalty de Ricardo Carvalho em 2006; o empurrão de Ballack em 2008; o fora-de-jogo de David Villa em 20010; o penalty na trave de Bruno Alves em 2012; a expulsão de Pepe em 2014.
É quase difícil imaginar o rescaldo de uma campanha da Selecção sem desculpas, sem atenuantes, sem ais. Neste aspecto, o engenheiro virou a narrativa do avesso. Chegou lá, disse ao que ia e ganhou. Ponto. E, ganhando, deu-nos cabo das carpideiras, das queixas e das lamúrias. Das lágrimas e dos suspiros. Deu-nos cabo da possibilidade de choramingarmos a preceito uma derrota imerecida, uma arbitragem suspeita, uma eliminação injusta. Pois se ele nem um jogo perdeu! Nada, zero. É evidente que podemos continuar a queixar-nos dos três penalties gamados, do penalty de Cristiano ao poste, da maneira como Payet arrumou o nosso capitão na final. Sim, mas que adianta isso? Ganhámos!
O engenheiro foi frontalmente contra o histórico e a essência da Selecção Nacional. Disse que ia para ganhar e ganhou. Ao descaradamento de ter sorte pelo seu lado, a sorte que nos virava sempre as costas - s-e-m-p-r-e ! -, o engenheiro juntou outros desplantes: ganhou sem a tradicional nota artística tão de agrado dos portugueses, competiu com cinismo italiano, sobriedade alemã, espírito de luta britânico e disciplina prussiana; e, como se não bastasse, ainda se deu ao luxo de ganhar a final à França em França sem precisar de Cristiano. Tudo isto, reconheça-se, faz uma confusão enorme. É uma história demasiado objectiva, demasiado simples, demasiado linear. Ganhámos! E todos os ses, quases, lágrimas, suspiros, brilharetes e vitórias morais são atirados para o caixote do lixo das inutilidades. Que sensação tão estranha. Não precisamos de arranjar desculpas, de encontrar culpados, apontar vilões.
Podemos viver sem isso? Saberemos viver sem isso? Conseguiremos adaptarmo-nos a esta nova situação de não termos nada que lamuriar, lamentar, desculpar? É que somos campeões, só podemos olhar para baixo, acima de nós não há nada! Como disse sem floreados um amigo meu das Beiras: «Em 1966 Eusébio chorou depois de levarmos na tromba da Inglaterra. Exactamente 50 anos depois, Cristiano chorou e depois demos na tromba à França.» Com a geração de Eusébio ganhámos zero (por muito que isso incomode o magriço António Simões) com as seguintes continuámos a chorar vitórias morais, algumas delas estupendas a carpir. Com a geração capiteneada por Cristiano festejamos finalmente uma vitória a sério. No dia 10 de Julho de 2016, no relvado do Stade de France, as lágrimas vencedoras de Cristiano enterraram para sempre as lágrimas de Eusébio. Sem mais. Nem ais. Já era tempo!
(...)"

André Pipa, in A Bola

PS: O Pipa não resistiu!!! Depois de concluir que a estratégia de Fernando Santos foi fundamental para conseguirmos a vitória no Europeu, teve mandar a boca ao Eusébio através do Simões, insinuando que foi a arte de capitanear do Cristiano que fez de Portugal Campeão!
Ronaldo foi importante no jogo com a Hungria (houve jogos onde foi mesmo medíocre...) em todos os outros a equipa e o treinador, levaram Portugal à vitória final... mas os fazedores de Mitos já começaram a reescrever a História...!!!

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