sexta-feira, 11 de março de 2016

Este Benfica

"Discutem-se os méritos de Rui Vitória e a forma como chegou a líder da Liga e aos quartos de final da Champions.

Diz o chamado princípio de Murphy que quando alguma coisa tem tudo para correr mal... corre ainda pior. Com Rui Vitória e com este Benfica é mais ou menos o contrário. Quando se pensa que será preciso que corra tudo muito bem para a equipa conseguir o que quer... a verdade é que corre ainda melhor.
Parece que Rui Vitória, nesta fase, transforma em ouro tudo em que toca. Tem um baralho de cartas com oito ases em vez de quatro. E a mão cheia de trunfos!
Fica sem Júlio César na baliza e o jovem Ederson não podia brilhar mais; não tem Luisão e Lisandro e o jovem Lindelof é um autêntico Lancelot - o mais famoso dos cavaleiros da Távola Redonda; perde ainda Jardel e, subitamente, Samaris vê-se obrigado a jogar como central e é só dos melhores em campo em São Petersburgo.
Cereja no topo do bolo: mete em jogo Jiménez e Talisca e faz jackpot. Impressionante!
Se alguém tivesse imaginado que tudo poderia correr bem ao Benfica na Rússia, o que aconteceu foi, repito, ainda melhor. Bem acima de qualquer que fosse a melhor das expectativas. Se não estiverem de acordo, perguntem-se: o que poderia ter corrido melhor? Nada. E poderia alguma coisa ter corrido melhor ao Benfica em Alvalade? Também não.
No campo do Zenit, Gaitán andou quase 90 minutos a sacrificar-se pura e simplesmente à tática defensiva sem conseguir construir rigorosamente nada que se visse e perto do fim, como num passe de mágica, fez um golo e fez a assistência para outro. Em cheio!
É justo reconhecer que o Benfica mereceu esta surpreendente qualificação. Mereceu porque foi a melhor equipa no conjunto dos dois jogos, mereceu porque foi a equipa que mais lutou, a que teve mais atitude, a que foi mais solidária, a que trabalhou mais e, ainda, a que mostrou estar em melhor condição física.
Tal como mostrou em Alvalade, no último sábado, o Benfica de São Petersburgo voltou a ser pragmático. Sempre disposto a sacrificar a exibição ao resultado. Um Benfica que joga pouco - no sentido espectacular e atacante do termo - mas que trabalha muito. Um Benfica, nesse sentido, à imagem, realmente, do treinador, um homem que parece, na verdade, talhado para gerir dificuldades. 

O que parece também é que os jogadores estão comprometidos com as circunstâncias, com o treinador e com os objectivos. Talvez tenham até a consciência que não podendo chegar lá pela qualidade global de jogo, podem chegar pela união, pelo trabalho, pela tal humildade que o treinador lhes transmite e pela qualidade e inspiração individual.
Como já aqui deixei escrito uma vez, talvez até Jorge Jesus tenha contribuído para essa união no auge daquela infeliz troca de palavras com Rui Vitória. Eu creio que contribuiu mesmo. Os jogadores podem ter sentido que estava na hora de arregaçar as mangas e a verdade é que de Janeiro para cá o Benfica veio sempre a subir até chegar, agora, à liderança da Liga e aos quartos de final da Champions, o que há uns meses poucos acreditariam ser possível.
Costuma dizer-se no futebol sobre aqueles a quem tudo parece correr mal que são... pés frios. Pode dizer-se tudo de Rui Vitória menos isso. Rui Vitória é, pelo contrário, um pé muito quente! Não temos o guarda-redes? Ficámos sem os centrais? Têm de jogar os miúdos? A este Benfica, como se vai vendo, nada disso preocupa. Se não há cão, caça-se com gato!
Parece ainda que os jogadores do Benfica estão também muito uns com os outros. Daí a referência ao espírito solidário. Acredito que este Benfica, líder do campeonato e quarto-finalista da Liga dos Campeões, tenha um balneário muito forte. Um Benfica que faz o que este tem feito, e sobretudo o que este fez, em poucos dias, de Alvalade a São Petersburgo, só pode mesmo ter um balneário forte. Que pode ter ficado ainda mais forte à medida que Rui Vitória foi sendo mais criticado. Tipo «quanto mais lhe batem mais a gente gosta dele». Rui Vitória, por seu lado, terá tido pelo menos o mérito de nunca perder o controlo emocional mesmo quando o cenário chegou à fase mais negra, ali a meio de dezembro, quando o Benfica esteve a sete pontos do Sporting.

Mais semana menos semana, por essa altura alvo de muitas críticas, Rui Vitória nem no Benfica foi publicamente defendido, como se muitos dos responsáveis encarnados estivessem à espera de ver se Rui Vitória ficaria ou não KO. A verdade é que não ficou. E no arranque do novo ano, deu murro na mesa, levantou a voz, recompôs-se e pareceu, por fim, unir os benfiquistas à sua volta.
Talvez até Deus, com todo o respeito, tenha acordado num daqueles dias e decidido proteger o tão atacado treinador do Benfica, prometendo fazer dele um herói no meio de tão agitada tempestade. Não sei avaliar que outros méritos (técnico-tácticos ou até de relacionamento com os jogadores) terá vindo a ter Rui Vitória. De fora, avaliamos apenas o que se observa, e o que observo é uma equipa que não joga grande futebol mas está iluminada por tudo lhe sair tão bem mesmo quando parece que vai acabar por sair-lhe mal.
Em São Petersburgo, depois do golo de Hulk, talvez mesmo só Rui Vitória e os jogadores acreditassem ser perfeitamente possível dar a volta ao adversário. Já de fora, acredito que a maioria se tenha interrogado: e como vai o Benfica atacar a agora a baliza russa?
Como por magia, Jiménez tirou da cartola o que raramente faz - um remate de longa distância - e Talisca deslumbrou-nos com um trabalho de ponta de lança e um fantástico golo... de pé direito. O pior pé.

Nos jogos de maior exigência, o Benfica de Rui Vitória é normalmente menos vertiginoso a atacar do que era; é agora mais lento a construir, troca mais a bola, está muito mais longe de fazer aquelas transições rápidas que marcaram o jogo da equipa nos últimos anos. Joga agora menos e joga sobretudo de forma bem menos espectacular. Tem um futebol menos intenso, menos elaborado, menos pensado e menos articulado. Mas não se deixa diminuir. Vai à luta com tudo o que tem e vai certamente discutir o título até ao fim, podendo até ser considerado, de momento, o mais candidato dos candidatos.

Em Alvalade, no último sábado, por exemplo, o que se viu foi realmente o Sporting a confirmar - na segunda parte - ser a equipa que melhor futebol joga em Portugal e o Benfica a confirmar como se disponibiliza colectivamente para o sacrifício e para o trabalho e ainda como Rui Vitória está verdadeiramente... com o pé quente. E ninguém o pode culpar por isso.
O treinador encarnado tem a equipa emocionalmente estabilizada, confiante e optimista, e parece mesmo imune à adversidade. Quando Hulk fez o golo em São Petersburgo a televisão mostrou um Rui Vitória que estava como se nada fosse. E talvez isso seja também um mérito.
Pode Vitória não conseguir ter na equipa uma influência técnico-táctica que a leve a um futebol colectivamente muito forte; mas a verdade é que parece também não lhe passar qualquer sentimento de fragilidade ou de desespero. Em linguagem simples, a equipa joga o que sabe e parece não se preocupar muito com o que não sabe. Não se sente inferiorizada por isso; pelo contrário, parece confiante e confortável. Talvez esse seja também outro mérito de Rui Vitória.
Acusou-o Jorge Jesus de ter posto o Benfica a jogar em Alvalade como uma equipa pequena, e devemos admitir que tenha soado, realmente, mal porque o que o Benfica fez já fizeram muitas equipas grandes quando precisaram, em primeiro lugar, de tentar não perder. Até com Mourinho. 
Lembro-me, aliás, de ouvir, por exemplo, o elegantíssimo, delicado e cordial Pellegrini (treinador do Manchester City) afirmar que «as minhas equipas jogarão sempre como equipas grandes» depois de um empate em Londres, com um Chelsea de Mourinho a jogar muito defensivo.
No fundo, o que Pellegrini disse foi o mesmo que Jesus. Disse-o foi de maneira diferente. E soou menos mal.
Por falar em soar mal, não me lembro de alguma vez ter ouvido um treinador português dizer o que disse André Villas Boas sobre o futuro na Liga dos Campeões de uma equipa portuguesa. Fica-lhe tão mal!..."

João Bonzinho, in A Bola

5 comentários:

  1. não é o melhor o futebol nem a melhor equipa, no entanto tem o melhor ataque e a segunda melhor defesa com uma diferença de golos de 49 o segundo melhor tem 34...para além disso tem o melhor marcador com grande vantagem e ainda o terceiro melhor...olha se fossem a melhor equipa com o melhor futebol onde já iriam???...

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  2. Respostas
    1. Caro José. Eu não diria lógica da batata. Eu diria lógica da dor de cotovelo.
      Alguns pontos:
      1 - As palavras que ele deixa relativamente à denominada equipa pequena demonstram que este artigo foi muito custoso escrever.
      2 - Então agora o Benfica não tem componente tática e joga mal.
      3 - Esse senhor esquece-se que o Benfica tem o melhor ataque da prova. Como é que ele diz que o Benfica só sabe jogar à defesa?
      Fico-me por aqui, que ainda teria muito para dizer.

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    2. Estranho como é que esta equipa sem componente táctica chega aos quartos de final da Champions.
      Faz lembrar aquele blog do lateral-esquerdo... pelos vistos acordaram agora e o Benfica afinal já tem treinador, enfim...

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