"1. No seu brilhante 'Football Total' (1975), o romeno Stefan Kovacs, que oleou uma das máquinas mais extraordinárias da história do jogo (o Ajax da primeira metade dos anos 70), expressa uma definição para treinador: "Numa época de eficácia e tecnologia, é aquele, que sabe tudo o que concerne ao seu domínio. E como o comandante de um barco ou de um avião a quem ninguém deve escapar. Os dirigentes sabem certas coisas, os jogadores outras, os médicos outras ainda mas o treinador deve saber tudo. (...) Se qualquer coisa lhe escapa, se não agarra um fenómeno de ordem fisiológica ou psicológica, está condenado, um dia ou outro, ao desaire. "Há 40 anos, um grande mestre do futebol reclamava para o treinador intervenção esmagadora no dia a dia. No caso do Benfica, a ideia serve para acentuar a diferença entre Rui Vitória e Jorge Jesus.
2. RV conquistou o Seixal porque tem cumprido os desígnios do diálogo e confirmado a imagem de homem que confia na competência de quem o rodeia. Todos os departamentos podem fazer agora o seu trabalho sem interferências de um comandante (JJ) que metia o nariz em tudo incluindo sectores para os quais não lhe era reconhecida competência. A máquina vive mais feliz: os médicos não são confrontados com os diagnósticos; os fisioterapeutas não têm de explicar decisões; a comunicação deixou de preocupar-se com o discurso; os nutricionistas e os cozinheiros não têm de dar satisfações pelas ementas... A organização tem agora um líder que a vê como auxílio para muitas decisões, em contra ponto com quem interferia em tudo, assente no empirismo que punha em causa a especificidade científica de cada parcela da vasta e complexa estrutura de apoio.
3. JJ desenvolveu cultura de exigência implacável, geradora de permanente tensão. RV prefere impor-se sugerindo o caminho aos jogadores, ao contrário do antecessor que traça a rota e acompanha ele próprio a expedição para manter alerta máximo constante. Todas as ideias e estilos são ganhadores e perdedores porque, mesmo em tempo de culto aos generais do banco, o futebol pertence mais aos pés dos jogadores do que à cabeça dos treinadores. Todas as verdades já conheceram a glória na centenária história do jogo, sinal de que o grande treinador pode ser mestre irascível (Menotti) ou de elegância máxima (Eriksson); não negociar princípios (Guardiola) ou adaptar-se e ser genial em qualquer contexto (Mourinho); ser discreto (Ancelotti) ou exuberante (Klopp); professor (Wenger) ou autodidacta (Cruyff).
4. O Benfica 2015/16 sugere ser mais sensível à pausa, perfeição e segurança do que à exaltação de um jogo frenético, intenso e explosivo. O processo está no início e só deve ser avaliado mais tarde - a força motriz de qualquer equipa é ditada pelos jogadores, pela relação com o treinador e pelo compromisso de todos com a causa coletiva. Mais do que receber a bênção da estrutura, RV tem de afugentar as dúvidas e convencer a plateia da Luz, definir o destino e conquistar a autoridade com saber e bom senso. O Ajax do futebol total, para manter o exemplo inicial, foi fundado por Rinus Michels, o marechal intratável com tiques de ditador; mas foi Stefan Kovacs, o sábio romeno, dialogante e bem formado, quem conduziu a equipa até muito próximo da perfeição. Prova de que também é possível atingir o belo e a eficácia sem recorrer a gritos e maus modos."
"O Benfica 2015/16 sugere ser mais sensível à pausa, perfeição e segurança".
ResponderEliminarSem dúvida nenhuma. 1 golo marcado nos últimos 4 jogos sugere perfeição. Levar 3 de uns mexicanos de segunda linha sugere segurança. E tudo junto sugere uma pausa na conquista de títulos. Está tudo muito bom.
A omissão das circunstâncias em q decorreu a pré-época sugere uma pausa nos seus comentários... até Domingo...
Eliminar«O processo está no início e só deve ser avaliado mais tarde». Nem mais. Que o Benfica de RV ainda não mostrou maravilhas, estamos todos de acordo. E teve tempo para as mostrar?
ResponderEliminarOutro aspeto a ter em consideração: as omeletas requerem ovos, e parece que faltam alguns ao plantel.