sexta-feira, 12 de junho de 2015

Apagados

"Há uma diferença óbvia entre a legalidade e a ética. Não é à toa que existem códigos de conduta para muitas profissões, por vezes de cumprimento obrigatório.
Treinadores e jogadores de futebol têm o direito legal de mudar directamente para um clube rival. Mas se me perguntam se isso é saudável, respondo categoricamente que não.
Embora estejamos perante um universo altamente volátil e mercantilizado, por onde rodam muitos milhões de euros, entendo que os agentes de uma indústria que desperta tão intensas paixões jamais devem perder de vista um facto muito simples: são essas paixões que lhes sustentam o estatuto e lhes permitem vidas milionárias. Respeitar os adeptos que os idolatram não é um favor, nem um acto de altruísmo. É uma exigência.
Paulo Sousa, Pacheco ou Rui Águas (Figo, lá fora), ignoraram essa exigência no passado. Nenhum deles mereceria ver aberta a porta por onde um dia fugiu. Mais do que um clube, trataram mal o próprio futebol - subvertendo a sua natureza enquanto fenómeno identitário de agregação e de emoções. Perante a lei, fizeram aquilo a que achavam ter direito. Não podem é esperar, depois, qualquer tipo de compreensão, carinho, admiração ou respeito por parte daqueles que choram com as derrotas, que não dormem na véspera dos grandes jogos, e que, directa ou indirectamente, pagam do seu bolso (muitas vezes com grande sacrifício) todo o futebol.
O agora treinador do Sporting entendeu seguir este caminho, quando podia deixar o seu nome escrito a ouro na nossa história. Apagou-se a si próprio nas fotografias. Não as da loja, mas, sobretudo, as da nossa memória."

Luís Fialho, in O Benfica

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