quinta-feira, 19 de junho de 2014

Tanta gente conhecida

"O país ficou indignado com a exibição perante Merkl. Exigia-se aos jogadores que vingassem as atrocidades económicas que nos são impostas. Meus amigos, fossem mas é votar!

DE quatro em quatro anos acontece a mesma coisa. Há Mundial de futebol. E o que é isso exactamente? Trata-se, no fundo, de uma questão muito simples. Um Mundial, propriamente dito, é a oportunidade de ver e de rever gente conhecida usando fardas diferentes das fardas que usam ou que usavam quando nos conhecemos noutras paragens e noutros momentos mais ou menos distantes, quer as paragens quer os momentos.
Excepção feita, naturalmente, aos árbitros que, de um modo geral, mais risquinha, menos risquinha, usam sempre as mesmas fardas. Comecemos então pelos árbitros deste Mundial, nomeadamente os que actuaram nos primeiros dias da grande competição e que somaram um conjunto de decisões disparatadas, daquelas que ou indignam ou fazem rir conforme os interesses em causa.
Assim, perante a monumentalidade da concorrência, não admira que Pedro Proença seja considerado o melhor árbitro do mundo. Tenho dito.

VAMOS lá então ao árbitro japonês que apitou o jogo inaugural e que ofereceu ao Brasil uma abébia, uma grande penalidade de origem manhosa. Não mais do que isso, apenas manhosa. O Rakitic não gostou. 
Pudera, sendo croata não se esperaria outra coisa. Confesso: a primeira vez que olhei com atenção para o Rakitic terá sido em Maio na final da Liga Europa usava ele a farda do Sevilha. O Rakitic, excelente jogador independentemente da farda, no fim do Brasil-Croácia disse que era triste começar uma prova desta envergadura mundial com um erro grosseiro do árbitro. Pois é, Rakitic, imagina então o que é chegar à final de uma prova de envergadura europeia e levar com uma mão cheia de erros grosseiros do árbitro. Uma chatice.

ALIÁS, pode-se até acrescentar que o árbitro (alemão) da final da Liga Europa demorou um mês certinho a tomar a sua única decisão acertada anti-Benfica. Foi ele quem expulsou, e muito bem o expulsou, o nosso Maxi Pereira, ainda que fardado de azul celeste, nos instantes finais do Uruguai-Costa Rica. Quanto ao Uruguai, com muita pena o digo, a continuar assim, vai falhar a final deste Mundial contra o Brasil no Maracanã, anseio maior de todos os amantes do futebol-literatura.
Adiante.

O primeiro golo deste Mundial foi brasileiro mas marcado na própria baliza por Marcelo, aquele tipo que o nosso Fábio Coentrão sentou no banco do Real Madrid na última final da Liga dos Campeões. Como me atrevi a proferir este comentário em voz alta ao pé de um amigo portista logo tive de ouvi-lo a contra-argumentar com isenção: «Sim, mas o Real Madrid só começou a jogar à bola e só deu a volta ao resultado quando o Fábio Coentrão saiu para entrar o Marcelo.»
Felizmente os acontecimentos imediatos deram-me oportunidade de o calar, e também com isenção porque, a bem da contra-contra-argumentação, o Brasil só conseguiu dar a volta ao resultado quando Hulk saiu para dar lugar a Bernard. E agora, amigo? Seguiu-se logo forte verborreia em desprimor de Scolari. «Se o Hulk ainda fosse jogador do FC Porto o Scolari nunca o teria convocado!», entre outros desabafos do mesmo jaez.
Quanto ao nosso Fábio Coentrão, pois também já saiu deste Mundial bem mais cedo do que o previsto, tal como lhe aconteceu na dita final da Liga dos Campeões, em Lisboa. Veremos se sem Coentrão, a nossa selecção melhora tal como melhorou o Real Madrid.
A verdade é que sem Hulk no segundo jogo, a selecção brasileira não melhorou nada que se visse.

NESTE Mundial, no que diz respeito a treinadores, também há, está visto, muita gente nossa velha conhecida. Fernando Santos, por exemplo.
E, quanto ao engenheiro, vejam-se as coisas pelo lado positivo.
Assistindo ao desmoronar grego perante a Colômbia que sorte a de Fernando Santos por não ter de levar também com Falcao em campo a ajudar à festa. Imagine-se o score que poderia ter sido atingido no Grécia-Colômbia se Falcao, que conhecemos com a farda do FC Porto, estivesse de boa saúde e tivesse embarcado com os seus companheiros para o Brasil.

NOS primeiros dias do Mundial o treinador que mais brilhou também é português, chama-se José Mourinho e estreou-se na profissão de treinador envergando a farda do Benfica. Não há presença mais lúcida do que a dos ausentes e o colapso de Iker Casillas no jogo com a Holanda passou mais um atestado de omnisciência ao nosso compatriota treinador do Chelsea.
Até Diego Armando Maradona veio a lume incensar o nome de Mourinho, a quem chamou de «amigo», por ter antecipado a reforma de Casillas o que lhe valeu a incompreensão da imprensa espanhola e a subsequente saída de Madrid.
Mourinho, como treinador, já ganhou tudo o que havia para ganhar em vários países. Títulos é com ele. Mas o título de «amigo» de Maradona, conferido por Diós, o próprio Diós, é um dos maiores, senão o maior, da sua brilhante carreira. Eu, pelo menos, vejo assim as coisas.
Instado pela imprensa de todo o mundo, Mourinho aguentou-se bem nos comentários sobre Casillas primando pela benevolência. Já nos comentários sobre Pepe, que também foi seu jogador, Mourinho não se aguentou nada bem. Antes pelo contrário. Pepe, que prima por deixar estigmas nos adversários em campo, é ele próprio vítima de um estigma não menos doloroso, ainda que ideológico, este: quando joga bem é português, quando disparata é estrangeiro.

A Argentina começou o Mundial a ganhar e gente conhecida temos por lá muita. Marcos Rojo, por exemplo, que afirmou gostar da ideia de se encontrar com Portugal lá mais para a frente e que «seria lindo marcar um golo a Rui Patrício», seu colega de equipa no Sporting. Não seria uma estreia, há que assinalar. 
Rojo já marcou um golo a Rui Patrício num derby lisboeta, metendo a bola na sua própria baliza e roubando, assim, aquele que seria um hat-trick de Óscar Cardozo em Alvalade. Foi «lindo»? Depende dos gostos, obviamente.
Quanto a Patrício, está fora nos próximos dois jogos, modo optimista de sugerir que, pelo menos, ainda haverá um terceiro jogo para Portugal no Brasil. Vem aí o Beto para a baliza, dizem os jornais. Uma boa notícia se pensarmos em penaltis e se o árbitro for o alemão que apitou em Turim.

COMO se está a falar de guarda-redes é imperioso registar o nome daquele que melhor me impressionou até ao momento: o mexicano Ochoa. Atrevo-me mesmo a sugerir ao Valência, ao Real e ao Atlético de Madrid que deitem os olhos para este talento sul-americano e que deixem o nosso Oblak em paz.
A iminência de o Benfica vender Oblak é a notícia mais triste desta primeira semana de Mundial. Sim, porque há vida real para além da Copa que é coisa efémera. E que vida a nossa esta de podermos ficar sem o fabuloso Oblak de um momento para o outro.
A exibição de Portugal no jogo com a Alemanha, comparando-a com as ocorrências gerais do evento, só consegue chegar ao patamar das transmissões televisivas dos jogos deste Mundial. Uma pobreza confrangedora em ambos os casos.
O país ficou indignado com a exibição da equipa nacional no seu jogo de estreia, para mais na presença da chanceler Merkl. Exigia-se patrioticamente aos nossos jogadores que nos vingassem das atrocidades económicas que nos são impostas pela Alemanha. Meus amigos, fossem mas é votar!

EM termos de equipamentos, a farda que assenta melhor é a do Uruguai.
Em termos de terceira idade, quem dá cartas de olhos fechados é o Pilro.
Em termos de anedotas brasileiras sobre portugueses, o que se verifica é que demos um fortíssimo contributo para o renovamento do em si já vasto reportório."

Leonor Pinhão, in A Bola

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