quinta-feira, 31 de outubro de 2013

E Pinto da Costa fez as pazes com o Youtube

"O presidente do FC Porto disse que todos os dias revê o golo do Kelvin e que há dias em que vê seis vezes. Ainda bem. Graças ao golo do Kelvin o presidente do FC Porto fez as pazes com o Youtube.

OUVI, como tanta gente, as palavras autorizadas de Joseph Blatter pronunciadas na Oxford Union Society, entre gente fina, portanto, sobre a grande questão que divide o planeta do futebol: quem é o melhor jogador do mundo dos tempos presentes, Lionel Messi ou Cristiano Ronaldo?
Vi também, como tanta gente, o momento de humor do presidente da FIFA, imitando primeiro Messi a dançar e a jogar e, depois, Cristiano Ronaldo a marchar e a jogar.
A imitação do português é um extraordinário momento de espectáculo em qualquer palco do mundo. Da Broadway até ao defunto Parque Mayer, de um qualquer esconso de stand-up em Xangai até aos mil teatros e teatrinhos de Avenida Corrientes, em Buenos Aires, o público, rendido à fidelidade dos retratos, aplaudiria Sepp Blatter de pé por todo o mundo.
Interpretei as palavras de Blatter e a representação física de Blatter como uma demonstração inequívoca de que prefere o português ao argentino, enquanto personalidade. E que, por mais que tente, não se consegue decidir entre os dois, enquanto jogadores. Foi, por isso, com espanto que acabei por constatar que estou completamente isolada nesta opinião.
O momento histriónico de Joseph Blatter foi entendido, de uma maneira geral e muita gritada, como um insulto a Ronaldo e como a declaração de preferência declaradíssima pelo argentino.
O presidente da Federação Portuguesa de Futebol insurgiu-se. O presidente do Real Madrid exigiu um pedido de desculpas formais ao presidente da FIFA. As estações de televisão passaram e repassaram aquele minuto do suíço em Oxford e a conclusão foi sempre a mesma: Blatter fez pouco de Ronaldo e prefere Messi.
Continuo na minha. Blatter chamou a Messi «um bom rapaz» que é aquilo que, normalmente, se chama a qualquer desenxabido eficiente, sem ponta de graça mas com bom coração.
E pela representação que fez de Ronaldo, um G.I. Joe a ferver em adrenalina e sentido de missão, pareceu-me, francamente, que o presidente da FIFA nos quis dizer que preferia mil vezes sair uma noite com Cristiano Ronaldo do que tomar um pequeno-almoço com Lionel Messi.
E quem, no seu perfeito juízo, não o preferiria?
Toda a gente entendeu de modo diferente o que, para mim, não serve para colocar em causa a qualidade do stand-up de Joseph Blatter. É o que acontece por vezes em muitas salas de espectáculos. O texto é fácil, o público é que é deseducado. Então quando mete futebol, a deseducação é geral.
A boa notícia é que se tivermos o imenso azar de não nos qualificarmos para o Mundial do próximo verão, já temos mais uma desculpa: como se já não nos bastasse o malandro do Platini a manusear o sorteio para nos calhar a Suécia, ainda tivemos o palhaço do Blatter a achincalhar o nosso melhor jogador e capitão da Selecção Nacional. É com estas coisas que a malta se consola.
Espero que Cristiano Ronaldo, o artista, não seja como a malta toda. E como os artistas, regra geral, se compreendem, acredito que o artista português percebeu perfeitamente a mensagem que lhe foi dirigida pelo artista suíço. E, como gosto muito de show business, espero ver brevemente Cristiano Ronaldo festejar um golo imitando a imitação que dele fez Blatter.
Só para calar as más-línguas.
Devo dizer ainda, e sempre em defesa de Joseph Blatter, que concordei com ele também quando, na mesma ocasião, em Oxford, afirmou com grande clareza que Zlatan Ibraihmovic está perfeitamente ao nível quer de Messi quer de Ronaldo. É também essa a minha opinião.

TENHO visto muitos benfiquistas zangados - ah, aquelas coisas das rivalidades... - por no Museu do FC Porto existir um recanto todo dedicado ao golo do Kelvin, o golo que deu o título ao dono do museu na temporada passada.
Estão zangados pelo recanto em si - Espaço K, chama-se - e estão zangados porque o lance do golo é exibido ininterruptamente em ecrã gigante, desde que o feliz proscrito brasileiro pegou na bola até no momento em que Jorge Jesus se ajoelhou.
Basicamente é isto. Uma homenagem à grandeza do Benfica.
Vejam lá se no Museu do FC Porto existe algum recanto especial para aquele campeonato triunfalmente ganho ao Sporting com a mão do Ronny? Não. Claro está que não.

O Museu do FC Porto foi oficialmente inaugurado a 28 de Setembro mas só abriu portas ao público a 26 de Outubro festejando logo o seu 12.º aniversário. É muito mais antigo do que o Museu do Benfica.
Na cerimónia de abertura ao público, no fim de semana passado, o presidente do FC Porto disse que todos os dias revê o golo do Kelvin e que há dias em que o vê seis vezes.
Ainda bem.
Graças ao golo do Kelvin o presidente do FC Porto fez as pazes com o Youtube.

TAMBÉM gostei das pazes feitas entre Jorge Jesus e Manuel Machado, como ficou evidente no fim do último jogo no Estádio da Luz. Os dois treinadores cumprimentaram-se com grande cordialidade. E mais do que isso, trocaram sorrisos e palmadinhas. Isso mesmo, misters! Já cansava o vosso desamor que não enobreceu nenhum dos dois.
Para nós, benfiquistas, é um descanso. Agora quando já podemos usufruir tranquilamente do discurso de Manuel Machado sem termos que embirrar com ele, por solidariedade com o nosso treinador. O inverso pensarão, certamente, os adeptos do Nacional. No fundo, o que todos queremos é sossego e boa disposição.

QUANDO o assunto é hooliganismo, já devem calcular que a minha equipa preferida é só uma: a da polícia.
Há uma década, quando morreu um adepto do Sporting naquela triste final da Taça do Jamor, juntei sem hesitar o meu nome a um abaixo-assinado pedindo à direcção do Benfica, à época presidida por Manuel Damásio, por rever drasticamente o apoio prestado às claques.
E ainda há bem pouco tempo lamentei aqui que um adepto do meu clube tivesse despejado um singelo prato pela cabeça abaixo de um ex-atleta especialmente embirrante de um clube rival.
Na tarde de domingo, a equipa da polícia identificou 94 pessoas do grupo de negro vestido que provocou desacatos à porta do Estádio do Dragão. O que se passou no Porto não foi «um arrufo» como ouvi dizer logo no momento.
Disseram os jornais, nos dias seguintes, que este movimento nasceu em Inglaterra na década de 70 e que foi erradicado na década de 90. Em Portugal está a chegar. Dizem também os jornais que os três grandes clubes portugueses têm as suas falanges de casuals, embora aqui o verbo ter não faça qualquer espécie de sentido porque ninguém acredita que um clube, grande ou pequeno, queira ter uma coisa destas.
Temo que os 94 identificados pela PSP do Porto voltem a poder entrar em estádios de futebol, sozinhos ou em grupo, com a maior das naturalidades. É uma aberração quando as famílias, cautelosas, prudentes, deixam de ir à bola porque se recusam a partilhar bancadas com hooligans que nunca deixam de ir à bola.

FOI o Benfica menos desengraçado da época que se apresentou no domingo e venceu, tranquilamente, o Nacional. Matic, por exemplo, reapareceu a espaços depois de uma longa, longa ausência. O próprio jogo é amanhã com a Académica, em Coimbra. Veremos se as melhoras aparentes de domingo passado foram só aparentes, ou não."

Leonor Pinhão, in A Bola

Hoje, 31 de Outubro

"Hoje apetecia-me reflectir sobre o que vai mal. E pensar no que podemos e devemos fazer para melhorar. E procurar a essência para além do cansaço das circunstâncias. E assinalar os interesses e manobrismos que pervertem valores e princípios inalienáveis. E desmistificar a iconografia do (aparente ou efémero) sucesso que sacrifica a ética incondicional. E falar do que vai bem e vai mal no meu Benfica, sem que isso seja malquisto por quem não suporta a crítica. E recomendar prudência a sensatez a Blatter. E, estando a escrever, arrasar o famigerado Acordo Ortográfico que me consome consoante as consoantes. Mas hoje, 31 de Outubro, é o Dia Mundial da Poupança. Por isso, fico por aqui. Até para poupar os eventuais leitores. Em vez de palavras consumidas, o silêncio do espaço que resta nesta crónica. Melhor dito, os silêncios. Da alegria, do desgosto, da concordância, da discordância, da liberdade, da eloquência, da serenidade, do desespero, da esperança, da convicção, da ignorância, da verdade, da coragem, do medo. Da vida e do desporto."

Bagão Félix, in A Bola

Um presidente para a História

"Comemorámos, na passada semana, o décimo aniversário do nosso belo Estádio.
À sua construção não pode deixar de estar associado o nome de Luís Filipe Vieira - que dias depois tomou posse como presidente do Benfica, transformando-o de alto a baixo, e erguendo-o até a um grau compatível com o seu gloriosos passado. Terão faltado apenas mais um ou dois campeonatos de Futebol para que Vieira fosse hoje unanimemente considerado o melhor presidente de sempre deste Clube. Faltou, por exemplo, que em Maio passado um remate de um tipo de crista tivesse embatido no poste, em vez de entrar na baliza de Artur. Faltou que, na temporada anterior, um fiscal-de-linha pouco atento tivesse visto um fora-de-jogo de Maicon, no lance que decidiu o título.
Em suma, faltou sorte numas ocasiões, e verdade desportiva noutras, para alcançarmos os títulos que o trabalho realizado tanto justificava. São contingências, às quais não podemos também subtrair o facto de, ao longo desta década, termos enfrentado o mais forte rival de toda a nossa história. Em dez anos, o FC Porto conquistou três taças europeias, e nos últimos cem jogos do Campeonato registou apenas uma derrota. Tem sido um opositor feroz, que, além de uma inegável capacidade desportiva, numa hesitou em utilizar meios ilícitos para conseguir o que queria. É contra ele que nos temos batido, e, ainda assim, equilibrando os pratos de uma balança que em 2003 apresentava um claríssimo défice.
Campeonatos à parte, seria fastidioso enunciar toda a obra de Luís Filipe Vieira. Do Estádio ao Centro de Estágio, da Benfica TV ao Museu, dos títulos nacionais e europeus nas modalidades ao 6.º lugar no ranking da UEFA, do investimento na Formação ao incremento do número de sócios. Mas aquilo que, enquanto benfiquista, mais lhe agradeço, é ter-nos permitido voltar a acreditar no futuro. Em 2003, vencer era uma utopia. Hoje, ganhar ou perder depende de pequenos detalhes, e a nossa memória tem de ser suficientemente ampla para reconhecer a diferença."

Luís Fialho, in O Benfica