"Corre por dentro do Gaseificado uma corrente de ar fétido. E, infelizmente para a Humanidade, o Gaseificado não consegue manter a boca fechada. Todos sabem que as palavras, como outros sons, são feitas de ar. Por isso, as palavras do Gaseificado cheiram mal. É um tolo com excesso de gás a incomodar quem preferia cumprir a vida longe de ódios, de violências gratuitas, de tiradas obscenas. Atrás do Gaseificado, com isqueiros acesos como se estivessem num concerto de Peter, Paul & Mary; os sabujos correm a disfarçar-lhe os odores. Debalde. O Gaseificado está podre por dentro, as suas ventosidades são sujas. Ele ignora-o: ri-se e multiplica-se em parvoeiras como se estivesse são. Essa ignorância toma-se deprimente.
O Gaseificado só ouve o que lhe dizem os sabujos e os sabujos só lhe dizem o que ele quer ouvir. Neste círculo vicioso permanente o tempo corre e o Gaseificado vai soltando cada vez mais ar e cada vez menos paIavras. Isto é, o Gaseificado esvazia-se. Está cada vez mais velho e cada vez mais murcho. Não vale a pena alertá-lo: ele não acredita. Julga-se eterno. Talvez surja alguém com uma piedade infinita que resolva engarrafá-lo...
P.S.:
«Os soldados sentavam-se ao redor da lenha.
Como falar-lhes? De repente eu disse:
camaradas a pátria somos nós. (...)
José quantos almudes lá na tua aldeia?
Na minha aldeia o meu patrão faz mil almudes.
José a pátria somos nós entendes?»
Manuel Alegre, A Praça da Canção.
Ignorante, mal-educado, intelectual de pacotilha que nada sabe sobre a obra dos poetas portugueses, um opinador de meia-tijela teima há anos que titular um livro de «A Pátria Fomos Nós» é uma exibição de fascismo. Enfim, não vale a pena perder tempo com gente que, como dizia Torga, não tem horizontes para além da borda do prato da sopa."
Afonso de Melo, in O Benfica
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