sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Afirma Pereira

"Afirma Pereira que pouco se importa com a venda de jogadores. Assegura Pereira - que conhece bem os caminhos escuros e as vielas que conduzem à Madalena - que o clube dos cimbalinos continuará a ganhar mesmo que lhe vendam a equipa toda ao desbarato, oferecendo como brinde desvalorizado produtos madeirenses.

Sabe Pereira que pelo menos os rapazinhos de cócoras não serão vendidos. Até porque ou já foram comprados ou nada valem. Está certo Pereira quando confia no trabalho dessa acocorada gente - afinal, em dois jogos já lhe ofereceram seis pontos.

Por isso, rejubila Pereira. Afirma Pereira que Jesus é egocêntrico. O que não dirá Pereira de Deus?

Afirmo eu que, com a ajuda de mais um Olegário, um Proença e Rui Silva (suspenso 20 meses por falsificação de relatório e rapidamente de volta às touradas, com direito a rabo e orelhas...), se fará de Pereira um novo Villas Boas, como se fez de Villas Boas um novo Mourinho.

Afirma Pereira muitas coisas, nenhuma delas reveladora de inteligência fora do vulgar. Está Pereira convicto de que mais uma vez tudo não passará de um passeio, da brincadeira do costume no quintal dos corruptos, com toda a gente de cócoras, sempre mais de cócoras a cada frase de D. Palhaço expelida a custo pelo seu cérebro caliginoso.

Se Pereira afirma, é porque sabe. Ou melhor: é porque o mandam afirmar. Estejam portanto atentos ao silêncio de Pereira. Por cada afirmação de Pereira, há um Pereira que se acanha. Por cada fanfarronada de Pereira, há um Pereira que baixa a cerviz. Estão ambos a cair de pôdre, e serão varridos para debaixo do tapete do nosso esquecimento. Até lá, retouçam na imunda pocilga em que alguns fizeram questão de transformar o futebol português para suprema glória e vaidade de um pobre palhaço triste que ainda julga ter graça."

Afonso de Melo, in O Benfica

Confiança? Sim. Euforia? Não!!!

"A eliminatória com o Twente era dos jogos mais ingratos que se poderia ter.

Ganhar apenas corresponde a uma obrigação realizada. Perder seria entrar em psicodrama antecipado e começar a lamber feridas, antes mesmo delas existirem.

Ganhar não deu título nenhum, mas perder seria o precoce antever que não se ganharia título nenhum durante toda a época.

Em suma, tínhamos muito a perder e pouco a ganhar contra o líder do campeonato holandês, campeão e vice-campeão nos últimos dois anos, do país que lidera o ranking mundial, a Holanda.

Quero fazer minhas as palavras daquele adepto que ontem, retratado em A BOLA, mostrava num cartaz «...só peço a Deus que não tire o Aimar».

Há jogadores do outro mundo, Aimar é um deles. Noventa minutos de sonho, de um sonho de jogador.

Um dia, desejo dizer aos meus netos... «mas eu vi Pablo Aimar jogar muitas vezes...»

Espero que a confiança tenha voltado, porque da euforia não precisamos.

A equipa esteve sempre equilibrada, o jogo sempre dominado, a intensidade e qualidade sempre presentes, e só o secular medo da tragédia não nos fazia ver que... temos Benfica.

Agora vamos suar os dias para ganhar ao Nacional, na Madeira.

O sorteio de ontem foi um justo prémio para o Benfica. Se outros méritos não houvesse, podemos jogar 4 dos 6 jogos em casa. Jogar na Suíça é bom para os largos milhares de portugueses que assim podem encher o estádio de Basileia. Não conheço a equipa romena, algures perdida no caminho da Moldávia, longe de Bucareste e perto do fim do mundo, mas onde as regras do futebol serão iguais e o Benfica terá outros pergaminhos. O Man. United será sempre um clássico para lembrar tantos outros. Um jogo de campeões Europeus agendado para dia 14 de Setembro, depois o caminho tem que ser ganhar a suíços e romenos."

Sílvio Cervan, in A Bola

O fabuloso Witsel

"1. Vive um passo à frente dos acontecimentos, capaz de surpreender pelo inesperado mas também de encantar pela perfeição. Porque domina os segredos do futebol como desporto coletivo e tem soluções individuais para quase tudo, Axel Witsel pertence ao grupo, cada vez mais restrito, daqueles que, somando muitíssimo à produção global, multiplicam o rendimento dos parceiros. Mesmo considerando que, pelo Benfica, ainda só desvendou uma pequena parte daquilo que sabe, já mostrou ser uma brisa de talento, competência, magia e sobriedade que varre o jogo do primeiro ao último minuto. Atendendo às opiniões de quem lidou com ele – quanto melhor o conhecem, maiores são os elogios – e à previsão do que evoluirá no contexto de uma boa equipa como aquela que Jorge Jesus está a construir, é quase nulo o risco da previsão ousada: estamos no prelúdio de um jogador que, em breve, atingirá nível mundial.
2. Senhor de conceito global do jogo, Witsel tem campo de ação extraordinário e uma particularidade interessante: raramente confirma as primeiras impressões que deixa. É alto mas possui articulação motora fantástica; é esguio mas guarda a bola como se fosse lutador de sumo; joga a um ou dois toques mas, quando é preciso, revela-se condutor perfeito a alta velocidade. O belga confirma a razão de César Luis Menotti, quando o velho mestre argentino afirma que “o parâmetro mais importante no futebol não é a dinâmica mas o conhecimento do jogo”, acrescentando os três valores que o identificam: ocupação do espaço, avaliação do tempo e antecipação do erro.
3. Espontâneo e imprevisível, Witsel cumpre regras e é desobediente; seduz pelo modo como segue a pauta e pela exaltação das invenções extraordinárias; por ser funcionário e espírito livre com dotes de artista; por ser competente e mago, que toca bombo mas também pode ser solista ou até dirigir a orquestra. É um jogador multifacetado, com vocação para ser o trapézio dos mais ousados; a partitura de apoio a quem só sabe tocar de ouvido; o mapa que orienta a ação dos mais imaginativos; o comandante silencioso (a autoridade é muito difícil de alcançar aos 22 anos) que inspira nas dificuldades e arrefece na euforia. Mais do que pensar duas ou três jogadas à frente, ele vê o jogo como cadeia de factos previsíveis para os quais é preciso ter resposta imediata. Põe a máquina a funcionar e ainda oferece a exceção da capacidade inventiva deslumbrante.
4. Witsel é o jogador dos novos tempos: talentoso, inteligente, versátil, intenso, forte, responsável e abrangente; que tem argumentos individuais incríveis mas conhece os benefícios de jogar com os outros; que dispõe de sentido tático notável mas revela arte para iluminar os caminhos que conduzem à baliza adversária. Apto para o excecional, o belga alimenta os hábitos quotidianos do funcionamento da equipa, razão pela qual funciona como garante de segurança e equilíbrio. É impressionante como, suportado em cálculo, não danifica o instinto; sendo um geómetra não abdica da liberdade para criar; valorizando a ordem impõe-se por imaginação e habilidade. Witsel é a súmula da evolução do médio-centro, aquele que mantém influência, brilho e eficácia jogando à esquerda e à direita; atrás, à frente, de trás para a frente e da frente para trás. Nem mais nem menos."


Rui Dias, in O Jogo

A uma só voz

"Um, mais drástico e impaciente do que nunca, exige a “demissão” de Vítor Pereira. O outro, bem menos bonacheirão e civilizado do que noutros tempos, vocifera pela “irradiação” de João Ferreira. De repente, os comentadores ao serviço do Sporting – que, por coincidência ou não, assumiram ou assumem papéis de relevo na estrutura diretiva do clube – sentem a necessidade de convergir para a linguagem oficial num ataque à arbitragem que, com maiores ou menores razões de suporte, é desajustado na forma e no tempo, parecendo destinado ao fracasso. Ambos estiveram ligados a sectores de oposição ao presidente eleito, Godinho Lopes, o homem que protagonizou um volte-face nas disponibilidades económicas imediatas do clube e uma inédita revolução do plantel, fatores que pareceram abrir portas a um reencontro da alma leonina, apoiada na chama ganhadora de Domingos Paciência e na experiência acumulada (de negócio, de bastidor, de afirmação) da dupla formada por Luís Duque e Carlos Freitas.
Em poucas semanas, o quadro mudou radicalmente. A gritaria em torno da arbitragem – independentemente da razão de queixa que assiste ao Sporting pelos disparates de Carlos Xistra na primeira jornada – parte de um erro: toma como precedente e como exemplo aquilo que o Benfica fez no ano passado. Mais avisado teria sido olhar para essa precipitação da direção encarnada como uma lição… a não repetir. Contas feitas, o Benfica nada ganhou com a posição de força assumida. Da mesma forma, fico com a ideia de que o Sporting só arranjou lenha para atiçar o fogo em que será o primeiro a queimar-se.
Não há cortina de fumo que impeça sócios e adeptos de ver o que realmente se passa. Tudo fica claro quando um antigo presidente do clube como o atual técnico vieram a público despedaçar o efeito da aplicação do “véu diáfano da fantasia”. Dias da Cunha pôs o dedo na ferida ao garantir que, se o tivesse comprado um Nolito, não estaria agora a “choramingar”. Já Domingos Paciência, apesar dos charters de jogadores que aterraram em Alvalade, continua a clamar por reforços. Acontece que uma equipa que faz uma primeira metade de jogo como a que rubricou em Aveiro, onde nem chegou à figura de corpo presente, tem alguma dificuldade em encaixar no papel de vítima.
Já agora: se há um – único? – dado saudável neste rugido do leão, ele é o ganharmos a certeza de que o Sporting tem uma voz. Depois do prolongado e ensurdecedor silêncio dos seus responsáveis ao longo das fases mais quentes do Apito Dourado, tinham sobrado algumas dúvidas. Resta saber se não é exatamente este atraso a causa do desajustamento e se os dirigentes atuais não vão precisar de terapia da fala."


A dobradiça

"Num documento pífio apresentado pelo presidente do Sporting escoltado por dois advogados, a arbitragem do futuro foi definida como a “charneira da atividade do futebol profissional”. A designação surpreendente acaba por constituir a única inovação da proposta, realmente pobre, genérica e reveladora das nulas competências dos autores nesta matéria.
Dizem-nos os dicionários da língua portuguesa que “charneira” significa um dispositivo de apoio à união entre duas coisas, como a ligação de uma correia a uma fivela ou, mais concretamente, de uma porta à sua armação, vulgo dobradiça. Em sentido metafórico o Houaiss coloca Portugal como charneira entre a Europa e África.
Com esforço, podemos concluir que o Sporting entende a arbitragem como a dobradiça que liga a “atividade” ao “futebol profissional” ou, em concreto, um clube ao título nacional. É rebuscado, para não dizer incompreensível, mas sublinha a relevância que os dirigentes deste clube insistem em atribuir à zona neutra deste jogo, porque uma das linhas da fuga para a frente continua a ser a “profissionalização” dos árbitros, um falso problema quando se sabe que os da elite vivem, atuam e auferem como profissionais.
A abordagem a um problema que o atormenta há tantos anos e de cuja solução parece cada vez mais longe reflete a insegurança gerada pelas dificuldades de alcançar resultados imediatos através de uma revolução técnica tão profunda, com a substituição de jogadores em bloco realizada num ambiente de euforia alienante. A charneira entre o Sporting e os sucessos desportivo e económico seria uma equipa competente e suas vitórias. E as dobradiças que poderiam abrir a janela da felicidade aos leões eram os golos de Wolfswinkel.
Apesar dos condicionalismos que rodeiam um ano de transição como este, fácil de projetar através dos exemplos do passado, os cândidos dirigentes do clube não conseguiram resistir à falácia de enfileirar com adversários mais poderosos, mas assim que a bola começou a rolar sucumbiram, com estrondo, às primeiras contrariedades. E revisitaram o pior das suas memórias, a mais improfícua das suas estratégias, a animosidade conflitual com a corporação mais antiga, fundada em princípios de clã e laços familiares que repelem sem piedade os ataques dos ingénuos.
Se já era bizarro admitir que um erro do árbitro João Ferreira na 3.ª jornada lhe tinha tirado um campeonato, preparemo-nos para o absurdo de, dentro de alguns anos, ouvir lembrar que o título de 2012 possa ter sido perdido porque Carlos Xistra invalidou um dos raros momentos da época em que Hélder Postiga conseguiu acertar com a baliza.
Xistra, Ferreira e todos os outros com “consciência pesada” em relação ao Sporting assumem-se, assim, como charneiras para o insucesso, rangendo estridentemente como dobradiças mal oleadas. E para isto não há solução: enquanto o Sporting considerar que a sustentabilidade e confiança do “negócio” depende dos árbitros e não da capacidade de escolher, preparar e enquadrar bons jogadores, serão mais as frustrações que as alegrias."


Seleção negativa

"O orgulho nacional é uma qualidade apreciável. Mal dos povos que não têm amor-próprio: estão condenados ao declínio e ao domínio por outros com uma vontade mais forte. Mas o orgulho nacional não deve impedir a crítica. Do mesmo modo que não devemos esconder a verdade aos amigos, não podemos dizer que tudo está bem quando o país comete erros.
E foi o que aconteceu no Campeonato do Mundo de Sub-20. Quase toda a gente elogiou a nossa Seleção, louvou o seu espírito competitivo, relevou a sua abnegação. Chegou a chamar-se-lhe “Seleção Coragem”.
Ora, coragem teria sido encarar os jogos de forma aberta, não enveredando por táticas superdefensivas. O jogo com a França, por exemplo, chegou a ser angustiante pelas aflições junto da nossa baliza. Em várias ocasiões só a sorte evitou a derrota.
Se as táticas superdefensivas são sempre condenáveis, contribuindo para matar o futebol, são-no ainda mais em equipas jovens. Porque prejudicam os jogadores, não contribuindo para o desenvolvimento integral das suas potencialidades. E incutem-lhes uma mentalidade mesquinha, onde a regra é não sofrer golos.
Que os jogadores já formados sejam levados, num e noutro jogo, a adotar essas táticas, ainda se admite. Mas em jogadores em formação é inadmissível incutir o espírito de que só o resultado interessa.
O futebol espetáculo é aquilo que faz a magia do futebol, que atrai espectadores aos estádios ou os prende aos televisores – e não as táticas “à italiana”, donde resultam jogos feios, monótonos e sem emoção.
Assim, apesar de a nossa Seleção ter chegado à final, merece nota negativa."